Rudá, deus do amor

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Jardim Zen, GO

Bóris e Malu seguiam Tatamanha, mãe do fogo e deusa das faíscas e labaredas, e Angra, deusa do fogo, ambas mulheres que eram inteiramente feitas de fogo, mas antes que chegassem ao seu local de treinamento, Rudá as deteve:

— Preciso falar com a garota. Podem seguir com o rapaz.

— O que você....— começou Malu, mas os outros foram sem ela.

Bóris virou pra trás, viu a expressão nervosa dela, mas não desobedeceria os deuses. Assim que se afastaram, ela reclamou, Malu estava de braços cruzados, zangada. O "deus do amor" era a última coisa que queria ver.

— Você não tem ninguém pra incomodar?

— Tenha respeito, garota. Eu sou um deus.

— Eu sou ateia, não ligo pra deuses. O que você quer comigo?

— Eu sinto o que você sente no seu coração. Estou aqui pra ajudar.

— Eu preferia estar aprendendo a controlar o fogo.

— Seu fogo não pode ser controlado enquanto vier de raiva e ódio. Eu estou aqui pra lhe falar de amor.

— Me poupe. — ela revirou os olhos

— Eu sou o deus romântico dos apaixonados, mas o amor é mais do que isso. O amor é fogo, força e coragem. 

— Hum.

— Viu aquelas duas garotas? Sara e Carol? A força delas está no amor que tem uma pela outra, que supera barreiras, dá confiança. Beto tira forças do amor de sua família, ele tem um pai e mais nove irmãos que torcem por ele. Iago tem amor às canções, à sua voz, e aos seus pais adotivos que lhe apóiam. Manoel tem amor à sua avó e à essa terra que quer tanto proteger. Todos eles, de formas únicas e verdadeiras, tiram a força do amor. Enquanto seu coração só tiver ódio, não controlará o fogo e só trará destruição.

— E como espera que eu "ame" algo ou alguém? — gritou furiosa — Disse que pode ver meu coração, então sabe o que passei! Sabe que nunca tive amor! Que minha mãe é uma drogada e meu pai um abusador! Sabe que todos me odiavam por eu ter nascido! Na escola até os professores me evitavam! Eu nasci pelo ódio e é tudo o que conheço!

— Exatamente por isso preciso lhe falar de amor. Essa raiva não é só sobre seu genitor. No fundo, você mesma se odeia, se culpa por ter nascido. Sabe que se sua mãe abortasse nunca a deixariam em paz, seria chamada de "assassina". Sabe que se denunciasse o padre seria uma "mentirosa". Mas nada disso é sua culpa, Malu. Precisa se perdoar. O único culpado aqui foi o homem que de santo não tem nada. 

— Ele ainda está lá fora! Eu preciso me vingar dele!

— Matá-lo não te fará se sentir melhor. A raiva corrompe, destrói.

— Então você espera que eu não faça nada?

— Não foi o que eu disse. Ele cometeu uma barbaridade, pagará por isso, mas não pelas suas mãos. Você não se tornará uma assassina, um erro não consertará o outro. O que sua mãe dirá quando souber?

— Capaz de comemorar a morte do infeliz.

— Bem, essa parte sim, mas e quando souber que foi pelas suas mãos? Como se sentirá quando a filha tiver se tornado uma assassina?

Malu respirou fundo. 

— Eu entendo o que diz, mas não vou mudar de ideia. A justiça é lenta, até ele ser excomungado e preso, outras mulheres já terão sofrido. O que ele fez não pode ser esquecido enquanto eu viver.

Os Guardiões de TupãOnde histórias criam vida. Descubra agora