ღ CAPÍTULO 41 ღ

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Dante

O FAMOSO SORRISO DE ORELHA A ORELHA. Ao afastar daquela simples árvore não deixei apenas uma garota para trás, deixei a garota que roubou o meu coração desde o primeiro olhar. Deixei Beatriz Cline, a garota dona de uma linda pele bronzeada e olhos castanhos hipnotizantes e instigantes, que dizia não acreditar no amor, mesmo que seu coração sempre gritasse o contrário.

Mas, apesar de deixá-la ali, eu tinha a certeza de que poderia voltar e ser recebido novamente, pois seu coração já havia me dado a resposta de que eu tanto almejei durante essas semanas e não seria eu a ir contra as vontades dele, principalmente depois desta noite.

Cline não mandou nenhuma mensagem dizendo que iria à festa, quando Peter me ligou avisando que ela estava junto com ele na bagunça daquela casa e procurando por mim, me arrependi de ter decidido buscar o meu violão naquele momento. No entanto, encontrá-la sentada embaixo da árvore que foi o cenário dos nossos raros encontros, foi o mesmo que encontrar um lindo anjo perdido iluminado pelas estrelas. O vestido branco salpicado pelos pontos de luz que ultrapassavam a folhagem juntamente com o brilho de seus olhos, foi a visão que acabou com todo o meu tormento e me deu a certeza de que eu agi certo. O rosto sereno dela transmitia o quanto ela estava a se sentir livre, as palavras que saíram de sua boca apenas me provaram a veracidade que a dominava.

"Quando a boca não consegue dizer o que o coração sente o melhor é deixar a boca sentir o que o coração diz."

E foi com o final de uma frase de Shakespeare que tomei os seus lábios em um beijo profundo.

Fui capaz de sentir cada nota dessa melodia se organizar na partitura da nossa vida, com cada pausa e cada som agudo ou grave sendo os passos corretos para nos envolverem no momento que nos cercava.

Eu jamais havia deixado de possuir sentimentos por ela, tudo o que fiz foi por ela, a verdadeira heroína da pequena Adelaide, que assim como tantas outras meninas e garotas, viram a sua infância se aprofundar em sons desafinados e densos por causa das garras de um verme. Não houve promessas, eu precisava apenas pedir novamente algo a ela, mas Cline foi mais ágil do que eu esperava e fez o seu pedido antes que eu pudesse lhe fazer o meu.

Dos mesmos lábios que antes eu havia desfrutado por uma segunda vez, a palavra surgiu.

Cante.

Meu coração sorriu ao ouvi-la e porquê que não através de uma música novamente? As duas pontas foram conectadas e eu não hesitei em puxar o violão que acabara de ser consertado para o meu colo.

A música desta vez não seria capaz de superar o poder da clássica que escolhi naquele outro dia, sequer saberia se Cline iria a conhecer. No entanto, tudo o que importava que a música trouxesse não era se ela fora um sucesso nos anos em que foi lançada e tampouco se houve algum filme em que ela foi utilizada de forma tão notável quanto sendo cantada pelo próprio Coringa. Não era nada disso, era a letra com todas as suas palavras que diziam exatamente parte de tudo o que eu gostaria de dizer a ela.

Não era a permissão para amá-la, mas sim um pedido mútuo para nos machucarmos o quanto quisermos se isto significasse amar incondicionalmente.

Afinal, o que seria o amor sem tudo isso?

O que seria esse sentimento se o mesmo fosse preenchido apenas com notas graves?

Ou apenas com notas agudas?

O que seria das pessoas se o amor não existisse?

Não seríamos nada mais do que violões sem cordas e baterias sem baquetas. Seríamos apenas instrumentos sem alguém para nos tocar.

Quando o momento nos envolveu na brisa da noite que avançava, nos colocando um de frente para o outro, onde quase pude ter seus lábios presos nos meus uma outra vez e que inevitavelmente disse que a verdade que senti desde a primeira vez que meus olhos foram inundados pela sua visão e emoldurados pelo seu jeito de ser, Cline depositou sua mão em meu peito, nos trazendo para a vida real.

Foi doloroso acabar com o clima que nos rodeava, mas compreensível ao saber dos motivos que a levaram a tomar tais atitudes. Na vida você poderá conhecer muitas pessoas, e nessas mesmas pessoas você irá encontrar algo que as façam seguir adiante. Eu preciso ter a música em minha vida, Cline precisa das palavras na dela.

Pedaços de uma folha de caderno qualquer preenchidas com grandes desejos. Já fiz esse ritual muitas vezes durante as viradas de ano junto com os amigos, mas não sabia que era necessário queimá-los, ainda mais sob o olhar das estrelas, para que se fossem realizados. E agradeço por não o ter completado, pois então minha vida não seria a mesma que vivo agora. Aceitei o seu pedido. Jamais poderia negar algo a ela.

No entanto, eu teria que ir buscar Alicia em um aniversário. Minha mãe foi direta ao dizer que não me custaria em nada. Cline entendeu que eu deveria ir antes mesmo do que eu. E eu fui, o importante era saber que eu não só voltaria logo, como também a encontraria mais tarde em sua casa para realizar o seu desejo.

Caminhei rápido para fora do parque deixando a garota que amo para trás, me esperando sob a proteção de uma grande árvore. A casa da amiga de minha irmã era apenas cinco quadras dali. Perto. Menos de uma hora e eu estaria de volta. Já na esquina da casa da aniversariante, meu celular tocou novamente. Meu pai havia decidido buscá-la com o carro por já estar tarde.

Arrumei a mochila do violão nas costas e corri um largo trecho pela calçada afim recuperar o tempo perdido. As pessoas que ainda se encontravam na rua me olhavam e como sempre fiz, apenas ignorei.

Parei para tomar folego faltando apenas uma quadra de distância. Já estava sentindo o calor me dominar por baixo da jaqueta de couro. Continuei o trajeto com passos rápidos, a música da festa ganhando volume conforme eu avançava, alguns carros alheios aos meus pensamentos passando em alta velocidade pela rua, como se a mesma fosse o palco para alguma corrida.

Imaginei Cline, o anjo de vestido branco perdido no parque, a garota que não deve culpa por ter tido o significado do amor em sua vida destruído como o próprio pai fora capaz de fazer para a filha.

Me encontrei finalmente próximo à casa de Taylor e ao olhar em direção do outro lado da rua. Vi que estava sendo observado por alguém. Meus olhos a enxergam. Linda, com os cabelos castanhos soltos e os olhos brilhando com a luz dos postes da rua, estava ela. Cline sorria ao me olhar. E eu tenho certeza que também já sorria para ela.

Suas pernas se movem, ela avança pela rua somente para me encontrar como em uma cena de filme. Foi neste momento que a lembrança do que acabara de passar por mim de vultos completamente alheios a minha presença e não por mera culpa da bebida ingerida inundou a minha mente.

Não...

Antes que eu pudesse correr para ela, seu rosto foi encoberto pela luz branca do farol de um carro. Meu corpo estremeceu ao ver o que iria transcorrer bem em minha frente. Senti minhas pernas adquirirem um peso surreal.

Isso de novo não...

O barulho dos pneus derrapando pelo asfalto foi tudo o que eu ouvi, nada mais estava presente em minha vista além dos olhos castanhos de Cline repletos de um medo dominante, a mesma face que em um mísero segundo atrás continha o mais lindo dos sorrisos.

Por algum motivo ou por puro sadismo do destino, somente para evidenciar o quanto nada seria capaz de impedir o que se seguiria, minha voz ainda conseguiu escapar pela secura de minha garganta em um grito desesperado.

- NÃO!!

AMORES ETERNOS - A História de Dante e BeatrizOnde histórias criam vida. Descubra agora