Beatriz
DANTE SABE DIZER A VERDADE. Pelas poucas horas em que convivi com ele, após anos sem nem ao menos saber se ele possuía uma irmã, posso dizer que parte da minha percepção sobre como ele é mudou um tanto considerável.
Sei o que ele quis dizer sobre não acreditar em tudo o que dizem. Ele dizia sobre o que falam dele, sobre como ele se relaciona com boa parte das mulheres de Leawood.
Sei que ele gostaria de me dizer que não somos somente isso. Não somos somente a parte ruim de nossas ações. Somos o ruim, mas também, somos a boa. E é nisto, que devemos nos agarrar.
Porém as pessoas enxergam apenas o ruim em nós e se não houver força por parte da pessoa, ela auto se destrói...
E eu estou confusa diante essa maré repentina que me puxou para o fundo do mar. Estou a reviver o passado que tanto me assombra. Não quero sofrer novamente. Não irei ceder a isto. Está é a minha única certeza.
Agradeci mentalmente a chegada dos meninos e de Alicia àquela hora, mesmo odiando ao ver que era devido a um machucado no topo de dedo do pé da irmã de Dante que tropeçou enquanto brincavam de pega-pega pelo parquinho repleto de brinquedos.
Está evidente que não me despedi, sequer perguntei a garota ou a Dante se precisavam de ajuda ou qualquer outra coisa. Minha meta foi chegar o mais rápido possível até o carro, mesmo tendo quase seguido Alicia, tropeçando muitas vezes no percurso. Dei sorte em chegar inteira ao carro, mas foram-se necessários uns bons cinco minutos tentando controlar a respiração antes de dirigir de volta para casa. Os meninos acreditaram na desculpa do sangue, apesar de questionarem o fato óbvio de que isso nunca me aconteceu antes quando eram eles que se machucavam.
Nada. Absolutamente nada, funcionou no dia de hoje.
O que me leva a estar aqui. Estirada em cima da cama olhando para o teto, esperando que haja alguma resposta nas hélices de madeira do ventilador que rodopiam nessa noite abafada.
Será que estou a esperar novamente uma resposta ou sinal de alguma entidade divina?
Será que ao menos acreditaria em algo?
— Dormir não está sendo uma opção viável para essa noite, Beatriz. — Digo a mim bufando.
Tateio o colchão até encontrar o aparelho e o acendo. Meus dedos digitam rapidamente a mensagem e já se encarregam de apertar o botão para enviar.
Bea: Preciso de ajuda... Sem sono.
Alguns segundos depois já sinto o celular vibrar em minhas mãos. Não é novidade ela não estar dormindo.
Sam: Está morrendo? Se quiser posso ir até a sua casa agilizar o processo...
Sam: É só me falar, aspirante a escritora. Sabe que guardo segredos.
Sorrio ao ler a mensagem.
Apesar da brincadeira, ela está certa.
Samantha é a única pessoa que conhece todos os meus segredos e jamais, por mais graves que eles sejam, ela os contou a alguém. Assim como eu, por mais loucos que sejam, contei os dela para qualquer outra pessoa.
Olha que engraçado, a vida é realmente incrível!
Quando crianças, desejamos crescer e quando este desejo se realiza, tudo o que resta são crianças assustadas dentro de cascas de adultos.
Bea: Lembra de quando lhe contei sobre tudo o que já passei? De como me senti?
Digito.
Sam: "Com um pressentimento ruim adornando o seu corpo, como se estivesse prestes a implodir e causar uma destruição em massa daqueles que ama sem sequer fazer nada. Completamente perdida, sem rumo, desejando o fim de tudo."?
Sam: *Salvei a mensagem, você escreve muito bem quando não consegue lidar com as emoções mais simples.
Outro bip.
Sam: Isso tem algo a ver com um certo trabalho que precisa ser feito com um certo alguém inesperado? Dica: Esse alguém se chama Dante...
Droga! Sam às vezes é direta de mais!
Bea: Talvez... Estou sentindo algo estranho dentro de mim.
Sam: Algo que te impede de dormir e faz com que você impeça sua amiga também?
Bea: Elementar, minha cara Manson!
Sam: Na mosca, Cline!
Sam: Tenho uma ideia do que fazer. Topa?
Okay, aquilo não poderia ser um bom sinal, porém já me encontro tão desnorteada quanto Sam.
Uma dupla perfeita de malucas.
Bea: Preciso me assustar com isso? Ou já posso encomendar o caixão?
Sam: HAHA! Certamente será de matar!
Sam: Domingo, no parque. Até lá a gente conversa.
Bea: Vamos matar alguém?
Bea: Certo. Boa noite, bruxa má.
Me despeço de minha amiga com um velho apelido já mumificado. Levo a mão a boca ao bocejar. Talvez essa conversa esteja me deixando com sono. Perfeito.
Sam: Carambola! Ainda se lembra desse vexame?
Sam: Boa noite, aspirante a escritora.
Bea: JAMAIS esquecerei. ;)
Apago o celular e me encontro sorrindo sonolenta.
Sozinha, em plena madrugada e sorrindo em meio a escuridão. Nada macabro.
Sam apresentou aquela peça quando estávamos na sétima série. Lembro de tudo naquele dia. Ela ficou uma fera quando a professora lhe disse que ela havia se encaixado perfeitamente nas características da bruxa má da história da Branca de Neve. É claro que cai na gargalhada, ri até sentir minha barriga doer. Após isto, Sam entrou no personagem e fez sua atuação ser merecida de um Oscar. Parte dela adorou ter interpretado o papel. Super a cara dela mesmo.
Agradeço aos céus por eu ter interpretado a Bela, apesar de Sam afirmar veementemente que eu nascera para ser a Fera. Lembro revirando os olhos.
A história em si até pode ter feito um pouco, ou talvez muito sucesso, onde todos amam e tudo mais. Porém, é como se mostrasse que o amor pode mudar uma pessoa, que no caso, Bela transformou a Fera por amor. Acredito que se o que viveram fosse realmente amor, não haveria a necessidade de mudança, não haveria a necessidade de Fera mudar por Bela. Ela o aceitaria apesar de tudo e vice-versa. O que não aconteceu no conto.
Sinto o celular vibrar ao meu lado e já o capturo sorrindo. Sam deve ter perdido o sono por minha causa. Posso ver a mensagem repleta de xingamentos e emojis enraivecidos me esperando no aplicativo de mensagens.
Meu coração é o primeiro a sentir o baque ao notar de quem é a mensagem.
Dante: Não sabia que era dessas que ficam até a madrugada acordada. Isso me surpreende de tão estranho... Nos encontramos amanhã às nove para discutir sobre o trabalho. Tenha bons sonhos, Cline.
Há uma leve brincadeira em sua última frase e ele sabe disso. A essa hora ele já deve saber que não vou conseguir mais pregar os olhos por causa de sua mensagem e imagino o sorriso glorioso que estampa o seu rosto.
— Droga! — Exclamo para o breu sentindo todo meu sono recém adquirido se dissipar nas trevas.
Obrigada por tudo, Dante Hawthorne!
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AMORES ETERNOS - A História de Dante e Beatriz
Romance"Nota mental: O amor nos faz sofrer. O amor nos faz cair. O amor não existe para mim." Beatriz Cline não acredita no amor. Mas, e você? Você acredita no amor? Beatriz Cline não acredita no amor. Os motivos que a levaram banir esse sentimento de sua...