Beatriz
— TOC TOC — Ouço a voz já familiar chegar em meus ouvidos. Uma voz que eu não esperava e nem queria ouvir nesse momento. — Posso entrar?
— Claro, mãe — Digo vendo a porta se abrir lentamente como ela sempre abriu desde que eu era pequena. Me sento na cama. — Não sabia que estava em casa, aconteceu alguma coisa? — Engulo minha vontade de desabar ali em sua presença, sabendo que correrá para me socorrer como se eu fosse uma criança que acaba de se machucar. Parte de mim, gostaria de deixar isso acontecer.
— Resolvi dar uma passadinha por aqui e aproveitar para almoçar — Sinto o colchão afundar quando se senta ao meu lado na cama. — Está tudo bem? Subiu correndo as escadas, nem chegou a me ver na sala.
Inspiro.
Expiro.
Quero contar, mas não cometerei dois equívocos em um único dia.
NOTA MENTAL: Mãe. A única que é capaz de saber precisamente se seu filho está realmente bem. Mães deveriam ser eternas.
— Sim, está tudo bem sim. Queria apenas tomar um banho rápido para tirar toda a sujeira — Céus! Sou péssima em encontrar mentiras! — Vai ficar mais tempo? — Pergunto na esperança de assassinar qualquer pergunta que queira nascer.
— Já tenho que voltar, só estava esperando você chegar para ver se estava tudo bem por aqui — Diz me avaliando, assinto para perenizar a frágil mentira que acabei de dizer. — Bom, até mais tarde então. O almoço ainda está quente, se quiser ele é todo seu.
— Obrigada, não estava nenhum pouco a fim de fazer algo para eu comer.
— Vou ter que ficar até mais tarde no trabalho. Tudo bem pra você ir buscar os meninos na aula de natação? Terei que cobrir o plantão da Xiu. — Explica se referindo a colega enfermeira.
— Sim, mamãe. Até mais! — Falo antes dela acenar e fechar a porta do quarto.
Ouço seus passos descendo a escada apressada. Devo ter lhe atrasado com essa pequenina conversa desnecessária. Somente me sinto mais relaxada quando enfim escuto os pneus do Ford Crown Victoria 1997 de minha mãe derraparem pelo asfalto, algo difícil de ser ver visto que ela o trata como uma verdadeira relíquia.
Não sei o que eu seria sem tudo isso.
Minha família. Minha vida. São tudo o que eu não abriria mão nem se me oferecessem um Pulitzer de algum dos meus livros. E olha que a tentação é grande.
Eles são simplesmente tudo o que tenho.
Ou melhor dizendo...
Tudo o que me sobrou.
Foram muitas as noites na qual eu não conseguia sequer pregar os olhos, destinada a passar horas sem dormir somente debaixo do edredom observando o teto do meu quarto e ouvindo a triste melodia do choro abafado de minha mãe chorando no quarto ao lado. O ruído causado por muitas lágrimas e soluços constantes me impediam de cair no sono.
E o pior de tudo isso, o que realmente trazia desgraça para dentro do meu peito, não era ouvi-la chorar durante horas a fio, mas sim, o que não contei para que essas horas se transformassem em uma vida inteira de angústia.
Eu era apenas uma criança, jamais deveria ter lidado com tanto peso sobre os meus ombros.
Como ele pode fazer isso conosco?
Como ele pode fazer aquilo comigo?
Simples.
Ele dizia que a amava.
Dizia que me amava.
E talvez naquele tempo, esse sentimento ainda existisse em seu ser. Talvez ele ainda não tivesse sido corrompido e incinerado pelo álcool que corria por suas veias.
Ele era o meu pai, porém isso não o impediu de fazer o que fez, de se mostrar o monstro que era para mim e o canalha que se escondia em seu corpo para minha mãe e logo depois ir embora para sempre.
Se foi doloroso para mim?
Era como se cada parte interna de meu corpo entrasse em colapso.
Uma estrela chegando ao fim de sua vida ao eclodir em milhares de pedacinhos.
Por um tempo fiquei vagando pelo espaço sem direção. Sem saber o que fazer ou dizer. E o que decidi após esse tempo, foi não contar nada.
Vê-la chorar depois de descobrir a verdade sobre o cara que amava causava uma dor muito mais lancinante em mim. Não era fácil para ela. Eu via refletido em seus olhos a dor causada por ele, mesmo que a mesma tentasse manter tudo para o lado de dentro e se mostrar forte para criar a filha e os gêmeos que se encontravam a caminho.
O pior era ver que ela acreditava em AMOR.
Acreditava na existência do sentimento por trás dessa palavra.
Acreditava que isto existia entre ela e aquele homem repulsivo, até que ele lhe mostrou a verdadeira face disso tudo.
Eu não contei nada a minha mãe, a mulher que me criou e que era casada com ele, por saber o que seria melhor para nós, principalmente para ela.
Um coração partido é fácil de se curar comparado a uma mente deturpada.
AMOR...
Como é incrível ver que você não passa de uma palavra fútil e mal interpretada.
— Mas... porque estou me sentindo assim, Thor? — Pergunto para cachorro embolado em minha cama, rezando secretamente para que ele me dê um sinal, ou responda me dando um conselho para o que eu deva fazer agora.
Encaro seus olhos cara-velãs, uma mistura de caramelo e avelã, esperando o que eu sei que é impossível.
Seu olhar segue para o criado mudo ao lado da minha cama e o vejo erguer levemente as orelhas e inclinar a cabeça. Um gesto típico dos cachorros e que os deixam ainda mais fofos.
Por um momento penso que ele entendeu cada palavra dita e até mesmo as não ditas.
Sigo o seu olhar e encontro meu celular vibrando enlouquecidamente.
Em seu visor, o nome causador de minha ruína preenche toda a tela.
DANTE.
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AMORES ETERNOS - A História de Dante e Beatriz
Romance"Nota mental: O amor nos faz sofrer. O amor nos faz cair. O amor não existe para mim." Beatriz Cline não acredita no amor. Mas, e você? Você acredita no amor? Beatriz Cline não acredita no amor. Os motivos que a levaram banir esse sentimento de sua...