ღ CAPÍTULO 43 ღ

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Beatriz


      ACIDENTES. De acordo com o dicionário sua definição nada mais é do que qualquer acontecimento inesperado que seja desagradável ou infeliz, que envolva dano, perda, sofrimento ou até mesmo a tão temível morte. Observando agora todo o significado desta palavra de origem latim e tentando de forma ordinária dar algum sentido no que estou a sentir, percebo que o que causa mais medo nesta palavra e consequentemente neste evento, não é de forma alguma o que ele nos tira, seja ele um mero dano ou a morte, não é exatamente a perda da vida que nos aterroriza tanto, mas sim, a simples parte do inesperado, do acontecer sem que esperamos.

      Algo que sempre encontro presente nos livros de romance é o casal que não consegue traçar as suas histórias juntas pois são interrompidos por algum empecilho maior, em sua maioria, por alguma doença em fase terminal. Muitos dos personagens optam por esconder essa verdade, tentar encobrir a mera realidade de que estão falecendo, vendo a sua própria vida murchar e perder a tão vivaz cor da alma sem jamais revelar isto para a pessoa amada.

      Seria está a maneira que encontram para poupar a dor que o outro irá sentir?

      Seria este um prol em benefício de ambos?

      Ou apenas para uma das partes?

      A verdade é que esconder, omitir ou poupar não trazem benefícios para ninguém.

     Quando optei por não contar a minha mãe o que me foi tirado, apenas adiei o dia de nosso sofrimento, não o seu tamanho. Poderia até dizer, que dei chances a ele para que crescesse e adquirisse força. Carreguei ele praticamente sozinha durante anos, pensando que assim conseguiria apagar ele de minha história, quando a verdade esmurrava o meu coração o tempo todo, com lembranças de que o amor só traz consigo o sofrimento.

      Enquanto que no mesmo gume desta faca, permiti que a minha mãe sofresse por não ter desconfiado que algo pudesse ter acontecido comigo e por ter derramado lágrimas por um verdadeiro monstro.

      Ter tentado encobrir está minha cicatriz trouxe apenas uma avalanche de desgraças.

     Desperdicei a chance de ter amado mais!!

      Sem Dante, eu jamais teria sentido a presença deste sentimento novamente e jamais teria libertado Ady do mesmo monstro que me aprisionou. A verdade, por mais dolorosa que seja, é vital para uma boa vida e está é uma verdade, que só encontramos quando se é tarde demais.

      No momento em que se decide não revelar a alguém que você ama que está doente, que está morrendo e deixando está vida, você acaba por tomar a pior decisão de sua existência. Ao negar isto ao outro, estará apenas se auto impedindo de viver o que lhe resta e privando o outro de aproveitar da melhor maneira possível este mesmo tempo que resta para você. O mesmo se aplica quando querendo poupar a dor, optamos por não contar a alguém que ela está morrendo por alguma doença, automaticamente a impedindo de realizar os seus últimos desejos.

      De acordo com o dicionário, a palavra doença é usada para definir um conjunto de sintomas que afetam um ser vivo, modificando o seu estado normal de saúde. Em outras palavras, recebemos sinais de que estamos padecendo, estes que na maior parte das vezes, somente percebemos quando a situação já se tornou irreversível.

      Tudo o que nos resta nesta infeliz situação, é fazer valer a pena. Enquanto ainda houver uma faísca pungente de esperança, fazer o possível e impossível para viver uma vida da qual irá se lembrar...

     A doença é como um alerta que nos dá a chance de começar a viver.

      De corrigir os erros...

      De nos despedir de quem nos acompanhou durante a vida...

      De criar suas últimas lembranças...

      E o mais importante, de amar enquanto o seu coração ainda pulsar.

      Em resumo, eu digo que a doença nos agracia com o tempo. Por mais curto que seja, você ainda possui aquela única chance de realizar o que sempre adiou. E quem mais eu poderia citar aqui senão Shakespeare? O ensinamento deixado por ele para nós foi simplesmente de que quanto menos tempo temos, mais coisas conseguimos fazer. O desespero e o medo nos instigam a realizar as mais improváveis loucuras. E no fim, nos resta apenas agradecer a eles por nos proporcionar essa dose de loucura insana.

      Sempre ouvi dizerem que quando perdemos alguém sem esperar é melhor do que vê-la todos os dias indo embora aos poucos. Compreendo que dor alguma deve ser comparada, só que quando somos confrontados pelo destino e ele nos abandona nesta situação, você acaba por constatar que ver quem você ama morrer aos poucos dói, mas não tanto quanto a dor de não poder sequer se despedir.

      Vendo Dante agora, tão desesperado quanto eu me encontro, no entanto se esforçando e crendo que tudo ficará bem, eu desejaria ter um pouco mais de tempo. Tempo para abraçar bem forte a minha mãe e os meus irmãos. Tempo para me afundar nos pelos negros e macios de Thor. Tempo para dar uma última risada com as loucuras de Sam e Cathy. Tempo para conhecer a garotinha de tranças nos cabelos que enfrentou o mesmo ser atroz que eu.

      E por fim, tempo para agradecer ao cara que está de joelhos ao meu lado neste instante por tudo o que me proporcionou. O seu inusitado beijo dentro daquela sala de aula, a sua tendência desvairada por clichês, por permitir-me respirar novamente ao revelar a minha cicatriz, até todos os outros momentos que por ironia do acaso ele esteve presente, mas também, principalmente, por me mostrar o real significado do amor.

      Dante me amou desde o primeiro momento, enquanto que eu, fui tolamente humana. Não por não dar voz aos meus desejos mais cruéis, mas por puramente, não os viver a tempo.

      Ouço ao longe as sirenes de uma ambulância que se aproxima. A dor em meu peito aumenta conforme o meu coração dispara sucessivamente. Dante envolve o meu rosto com as suas mãos e após me encarar pelo o que parece ser uma vida inteira, deposita um leve beijo aos meus lábios. O meu primeiro beijo em que não fecho os olhos, apenas por almejar gravar o máximo de detalhes de todo o seu rosto. Quando se afasta, com as feições iluminadas pelas luzes vermelhas, os seus malditos olhos azuis é tudo o que preenche a minha visão.

      Há algo que grita em meus ouvidos dizendo que a minha história se encerra aqui. É como se alguém a escrevesse por mim, depositando um ponto final precoce no dia de hoje.

      O dia em que finalmente aceitei amar.

      E o dia em que descobri que jamais poderei continuar a escrever os meus caminhos.

      Não irei conseguir finalizar a minha própria história.

      Meu tempo agora se encontra próximo ao fim, a dor me diz isso enquanto ainda tento em vão, respirar. Sei que se for para ficarmos juntos, o destino há de nos unir novamente. Mas ele já deixou claro, que não nos quer juntos. Sinto que poderia tentar entender isso, mas só se ao menos, eu já tivesse dito que o amava.

      Isso foi antes que tudo se tornasse escuro...

      Espero com todo o meu pobre coração que o tão admirável William Shakespeare esteja certo e que para aqueles que se amam, o tempo seja mesmo...

      Eterno. 

AMORES ETERNOS - A História de Dante e BeatrizOnde histórias criam vida. Descubra agora