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Bruno

Após amanhecer e eu e Melissa termos um ótimo "bom dia" embaixo do chuveiro, deixei ela na sua casa.

Continuei dirigindo até chegar na casa dos meus pais, iria contar hoje sobre minha mudança em algumas semanas.

Antes mesmo de abrir a porta de casa, escuto gritos que reconheço ser do Lucas.

O que está acontecendo?

Ao entrar, vejo minha família em volta da mesa de café da manhã, porém Lucas e meu pai estão de pé discutindo.

_ É UM VAGABUNDO SIM! - nosso pai grita na direção do meu irmão e vejo que minha mãe está chorando.

_ O quê houve? - pergunto e acho que só agora perceberam minha presença.

_ Seu irmão que não quer fazer nada da vida.

_ Eu já disse pro senhor esperar, vou encontrar algo em que sou bom.

Nosso pai ri sem humor e vejo que Lucas está se controlando para não dizer algo que possa acabar desrespeitando-o.

_ Algo em que é bom? Acha que vive num conto de fadas, porra! - ele bate na mesa, assustando nossa mãe. _ O mundo não vai esperar você se decidir qual é a sua "paixão ". - faz aspas com as mãos.

Me aproximo da nossa mãe, tentando tirá-la da mesa.

_ O mundo ou o senhor? Respeito sua opinião, mas é a minha vida!

_ Vida essa que você me deve! Eu te sustentei durante todos esses anos, não você, EU! - ele se aproxima do Lucas, que não move um músculo.

_ Quer jogar na minha cara? Ótimo! Mas a única pessoa que eu devo nessa merda de vida, é a minha mãe.

Nosso pai caminha até minha mãe e a levanta bruscamente, segurando seu braço com força. Tento intervir, porém minha mãe nega com a cabeça.

Depois de algumas situações como essa, consegui diferenciar os olhares que minha mãe direcionava para mim. E o de agora era "Por favor, não piore as coisas."

_ Ela? A mulher que nunca mexeu um músculo sequer pra trazer dinheiro pra essa casa? - vejo Lucas ficar assustado com a atitude do nosso pai, ele nunca presenciou esses momentos.

Eu o tirava da sala antes.

_ Sim! Ela me criou, ela me educou e me deu amor. Você? Você não passa de um cara qualquer que libera o dinheiro.

Quando vejo que a cena se repetirá novamente, me coloco na frente do Lucas, impedindo que o homem na minha frente lhe dê um tapa.

_ Nele não. - tento cobrir o corpo do meu irmão com o meu.

_ Saí da frente Bruno, você não fez nada hoje.

_ Nenhum deles fizeram. - olho para minha mãe encolhida na cadeira. _ O senhor disse que ia parar.

_ Parar? Do quê você tá falando? - Lucas questiona.

_ Não é nada querido. Sobe lá pra cima, por favor? - minha mãe se levanta e vem na nossa direção, porém é parada pelo marido.

_ Já falei pra parar com essas baboseiras Lúcia! É por isso que esse garoto tá assim, falta de levar uma surra.

_ Já não basta bater em um, você queria bater nos dois? - questiona chorando e tento não lembrar dos roxos em volta dos meus olhos ou da ardência pelo meu corpo.

_ Você batia no meu irmão? - Lucas ignora meus protestos e aponta um dedo na cara dele. _ Seu desgraçado!

O seguro quando ele ameaça ir pra cima do nosso pai.

_ Me chamou de quê? - ele retira o cinto da calça e aponta para Lucas.

_ NÃO! Jorge, para por favor. - minha mãe entra na sua frente, desesperada.

_ CALA A BOCA! Esse moleque vai aprender uma lição hoje.

Suas últimas palavras circulam na minha mente. Ele sempre dizia isso.

Tento segurá-lo, porém ele vem com tudo pra cima de nós. Sob seus protestos, protejo o corpo do Lucas com o meu, sentindo minhas costas arderem a cada palavra dita.

"VOCÊ.ME.DEVE.RESPEITO."

"MERECE.UMA.LIÇÃO."

Vejo minha mãe ser empurrada com força, ao tentar tirar o cinto da sua mão. E tento reunir forças para levantar.

_ Lucas, preciso que ligue para a polícia. Consegue fazer isso? - sussurro para que somente ele escute e ele confirma com a cabeça.

Dou espaço para que Lucas corra e me levanto, impedindo que o couro do cinto me acerte novamente. Seguro seus braços e observo sua fúria ir embora.

Os cinco minutos já devem ter passado. Sempre durava cinco minutos.

Ele se senta na cadeira e retiro o objeto da sua mão, indo até aonde minha mãe está.

_ Você tá bem mãe? - devagar, a coloco sentada no chão.

Verifico se não está machucada e observo Lucas no telefone, do outro lado da sala.

_ Tô sim. - sorri fraco. _ O quê seu irmão está fazendo?

_ Pedi pra ele ligar. - ela nega com a cabeça. _ Eu disse que não permitiria mais mãe.

Meu pai me deu essas "lições" até os dezesseis anos, idade em que consegui diferenciar suas atitudes de um pai "preocupado" com a educação do filho, para um pai "controlador" das escolhas do filho.

As que ocorreram na adolescência, na maioria das vezes, era pra ele não bater no Lucas. Eu não me importava de apanhar no lugar dele e nem de esconder os motivos pelos quais eu parecia um "brigão".

Porém, na primeira vez que o vi encostando na minha mãe, ameacei ligar para a polícia. Fui impedido pela minha mãe, é claro, que confirmou essa ter sido a primeira vez.

Depois de me formar e trabalhar em diferentes casos, eu descobri.

Aquela não tinha sido a primeira vez.

Como também descobri que em muitos desses casos, a vítima precisa querer ajuda.

E minha mãe não queria.

Mas ele tocou no meu irmão hoje, então eu iria obrigá-la a querer.

Quem eu amava? Onde histórias criam vida. Descubra agora