Fernando
Minha vida parece ter dado um reset e voltado para a época em que eu não conseguia me comunicar com ninguém.
Estou vivendo ela no automático há meses e não sei o que fazer para mudar isso, eu só penso em trabalhar e trabalhar.
Minha mãe diz que eu ficaria melhor se voltasse para casa, mas me sinto sufocado com suas perguntas constantes sobre quando vou dar um rumo para minha vida e parar de desperdiçar o futuro brilhante que tenho pela frente. Me tornar cientista sempre foi meu sonho desde pequeno, mas de uns tempos para cá parece ter perdido seu grande significado para mim.
Decidi seguir com as aulas particulares e há cinco meses me tornei professor regular da faculdade.
Estou bem assim.
Mas ainda não parece ser o suficiente para me manter vivo.
Sinto que preciso de algo para me inspirar, me ajudar a voltar a caminhar novamente, a correr atrás do que realmente quero.
Estaciono meu carro em uma das vagas reservadas para os funcionários da faculdade e pego meu material em cima do banco de trás. Hoje o dia estava bastante quente e agradeço por não ter esquecido minha garrafa de água em casa.
Cumprimento alguns alunos durante o caminho até a entrada do prédio e me assusto com o barulho de uma moto atrás de mim. Vejo alguns garotos ficarem admirados e nem todos parecem achar perigoso alguém andar numa moto desse tamanho.
Entro na sala dos professores e encho minha caneca de café para tomar enquanto as impressões da matéria de hoje ficam prontas.
Meus colegas de trabalho vão chegando e se acomodando na sala, logo Letícia vem me cumprimentar com um abraço.
_ Bom dia! Preparado para hoje?
_ Diz como se estivéssemos indo para uma batalha.
_ E não é? Ser professor é a batalha mais difícil de qualquer ser humano. - dou risada do seu exagero e lhe ofereço um pouco de café.
Letícia é professora há 8 anos de português e sempre parece estar sem paciência para as reclamações dos alunos, porém é bastante elogiada entre os profissionais da área pelo seu método bastante eficaz de ensino.
_ Toma um café para melhorar o seu dia.
_ Uh, obrigada. Mas nem pense em mudar de assunto, quero saber sobre suas férias. - respiro fundo me sentando no sofá e ela me acompanha. _ Fez sexo com alguém? Homem? Mulher? Ménage? - pergunta direta e quase me engasgo.
Nos conhecemos há poucos meses, porém ela diz ter ido com a minha cara desde o primeiro dia e que somos os únicos que salvam dentro desta sala.
_ Não vamos falar sobre isso.
_ E por que não? Somos dois adultos na casa dos 30 anos já, é normal falar abertamente sobre.
_ Tenho medo de perguntar e ouvir histórias tão pervertidas como você.
_ Você absorveria bastante conhecimento. - sorri de lado parecendo se lembrar de algo e nego com a cabeça rindo.
_ Espero que encontre um parceiro que corresponda os seus desejos.
_ Ou eu posso ter sete. - dá de ombros e a olho indignado.
_ Meu Deus, Letícia.
_ Vive la vida, chico. (Viva a vida, garoto.)
_ Seguirei seus conselhos algum dia. Mas me conte você, como foi as suas férias?
_ Eu viajei para o México e, por Deus, que lugar quente e maravilhoso. Fui com algumas amigas e você não vai acreditar!
_ O que? - pergunto curioso e tentando corresponder à sua animação enquanto falava.
_ Dormi com o nosso tradutor. - diz rindo e acabo fazendo o mesmo.
Letícia definitivamente não liga para nada além da sua felicidade. Ela parece nunca se arrepender das coisas que faz e acho isso admirável nela.
_ Ah, eu também nadei pelada, fiquei bêbada por dois dias seguidos, quase beijei minha amiga e perdi meu passaporte.
_ Ok, muita informação. Perdeu seu passaporte?
_ Sim, mas um turista achou e me devolveu.
_ Menos mal né, sua doida.
_ Eu com uma garrafa de vodka não respondo por mim, fazer o que? - dá de ombros e ouvimos o sinal do início das aulas tocar. _ E lá vamos nós novamente.
_ Boa sorte com a sua turma hoje.
_ Para você também, soube que entrou novos alunos para o curso. - diz pegando sua bolsa e arrumo as folhas que imprimi dentro da pasta.
_ Sim, gosto de saber que mais pessoas se interessam pela área.
_ Os fanáticos pelos elementos químicos.
Nos despedimos ao virar em corredores opostos e quando chego na minha sala toda a turma do terceiro semestre já está sentada em seus lugares. Deixo meu material na mesa e começo a distribuir as folhas para cada um.
_ Bom dia, sou o professor Fernando e lhes ensinarei a matéria de bioquímica durante esse semestre. - falo ao me posicionar na frente da minha mesa, tendo a atenção de todos.
Do jeito que estão me olhando consigo presumir que minha fama de professor rigoroso tenha se espalhado.
Tento sempre tirar as dúvidas dos alunos tanto dentro quanto fora da sala de aula, não ligo se conversam entre si pelas minhas costas já que é impossível alguém se manter calado por duas horas seguidas.
Deixo passar várias coisas.
Mas minha maneira de avaliar, dar notas, de falar, meus gestos e feições, fazem com que uma imagem totalmente distorcida recaia sobre mim. E tive que me acostumar com isso.
Porque dá muito mais trabalho mostrar para os outros quem eu sou realmente.
A aula segue normalmente e peço que eles respondam um questionário antes de saírem da sala, perguntas necessárias para que eu saiba por onde devo começar a partir do que aprenderam no ano anterior.
_ Obrigado. - agradeço o último aluno e procuro meu outro arquivo no computador que contém a matéria dos alunos do primeiro semestre.
Ainda faltam quinze minutos para começar a próxima aula, então decido sair para buscar mais café. Acabo esbarrando na mesa e isso faz com que as folhas caiam no chão, o vento do ventilador as esparramando pelo local.
_ Merda. - praguejo baixinho e me agacho para recolhê-las.
Vou juntando uma a uma e quando percebo já estou quase na porta da sala, faltando apenas duas. Estico minha mão para alcançá-la, porém alguém é mais rápido que eu.
Penso em agradecer enquanto arrumo todas elas num mesmo monte, mas sua voz faz com que meu corpo todo fique paralisado e eu fico sem saber o que dizer.
_ Eu ia te procurar mais tarde, mas parece que o destino gosta mesmo de mim. - ergo meu rosto para vê-lo e confirmo que é mesmo ele. Ficamos frente a frente quando ele se abaixa para ficar na minha altura e o olho sem acreditar. _ Senti a sua falta, meu futuro namorado.
Meu cérebro parece voltar a funcionar ao ouvir sua última palavra.
_ Pietro. - pronuncio seu nome e ele sorri.
O mesmo sorriso desde que tinha sete anos de idade.
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Quem eu amava?
Romance" Serei seu amor, levando o tempo que for. " Melissa sempre foi apaixonada por Lucas, o garoto que ficava com todas as garotas da escola e é um libertino nato. Mas a declaração do melhor amigo pode confundir sua mente e talvez bagunçar seu coração...