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Ivan abriu os olhos e encontrou o médico o observando com uma expressão de curiosidade:

— Walter!? Onde está a Guynive? — questionou olhando para o leito vazio.

— Mal acorda já e pergunta pela amada. Bom dia pra você também!

— Bom dia! — respondeu se sentando.

— Ela já saiu. Foi tomar café — disse o médico olhando intrigado para Ivan.

— Como sabe que ela foi tomar café?

— Eu mesmo dei a requisição. Afinal já passou da hora.

A resposta fez o cabo voltar a sua situação:

— Está... tudo bem?

O médico corrigiu sua postura, mas permaneceu com a mão no queixo.

— Essa pergunta não é minha?

Ivan sorriu do bom humor de seu amigo:

— O que que há?

— Nada...

— Menos mal.

— ... Aparentemente.

— O que quer dizer?

— Se lembra da sua "queda" de ontem?

— Sim. Me senti péssimo. Mesmo com o remédio, foi difícil dormir...

Walter lhe entregou um pequeno espelho:

— Veja você mesmo.

Os olhos de Ivan procuravam marcas em seu reflexo.

— Mas ontem eu sentia os ferimentos. Eu os toquei — afirmou o cabo.

As manchas de sangue e ferimentos de sua boca e nariz, deram lugar a leves inchaços.

— Eu vi os seus machucados, tratei deles — confirmou o médico.

Ivan tocou as costelas e não sentia a dor que tanto o incomodou antes de dormir.

— Impressionante, Walter! Impressionante.

— Você acredita em milagres, Ivan?

— Sim, claro! Só nunca imaginei que eu receberia um. Nem sei o que dizer.

— Alguém tem que saber. Então vamos lá: deite-se e repouse. Vou deixá-lo em observação.

— Mas eu tenho muitas coisas para fazer na base...

— Eu também tenho e uma delas é garantir que você se recupere de forma plena. Faremos alguns exames e, estando tudo bem, te libero à tarde, ok?!

Walter sempre foi muito profissional.

— Ela estava bem quando saiu daqui?

— Preocupado com a garota? — a pergunta de Walter acanhou Ivan. — Estava sim. Até breve.

O médico retornou para suas funções e Ivan para a cama. Permaneceu algum tempo olhando o leito bagunçado onde Guynive passou a noite. Ele se ergueu e caminhou até lá, no simples intuito de arrumá-lo.

"Grande. Grande bagunça isso sim."

Puxou o lençol e, próximo da cabeceira, encontrou a peça caída: um pequeno canivete multifuncional. Talhado em seu cabo a letra "G".

— Guynive — sussurrou.

Colocou o objeto no bolso e após a organização deitou-se na cama, caindo em um sono povoado por sonhos de paz e tranqüilidade, bem diferente da realidade que o aguardava.

Duas horas antes do almoço um enfermeiro o despertou e assim realizou os exames. Antes do meio-dia, com resultados satisfatórios, Walter o liberou:

— Mas volte ao final da tarde para uma breve avaliação — avisou o médico enquanto assinava a liberação.

— Volto. Até breve.

E saiu apressado com um único objetivo: encontrá-la. O que naquele horário não seria difícil de fazer, e seguiu a passos rápidos para o refeitório. Encontrou-a com Dina do lado de fora do edifício. Guynive se empenhava em mostrar normalidade, mas não gostou nem um pouco de vê-lo ali.

O cabo se aproximou cumprimentando:

— Bom tarde, Dina. Tudo bem?

— Senhor! Sim, senhor! — e prestou continência.

— Descansar — lhe sorriu e olhou para a loira alta que o encarou irritadiça. — E você, Guynive?

— Eu o que?

A voz da garota saiu prensada entre os dentes e as veias de seu pescoço se alteraram, junto com um semblante tenso e agressivo.

— Está tudo bem? — indagou o cabo.

Ela hesitou alguns segundos até responder em baixa voz:

— O que isso lhe importa?

— Estou te perguntando, não? — Ivan manteve a serenidade.

— Veio me importunar como os seus amiguinhos? Não sabe o que fiz com eles? — e, ameaçadora, Guynive se aproximou de Ivan. — Não sabe o que posso fazer com você?

Naquela pouca distância Ivan olhava para cima para manter contato olho no olho. Ela era 14 centímetros mais alta que ele. Então calmo e firme lhe respondeu:

— Acha que todos aqui são seus inimigos? Conviver com pessoas diferentes é um problema para você? — Guynive manteve um desconsertado silêncio, se sentindo surpresa com a assertividade. — Se não está disposta a colaborar e a morrer por qualquer um deles é melhor que vá embora. E se é isso o que você realmente quer, me responda agora, pois posso preparar a sua transferência imediatamente.

A ideia era sedutora para Guynive, porém contrária à sua missão, da qual não escaparia. Queria responder, contudo não sabia o que dizer.

— Enquanto estiver por aqui, tente se adaptar. Se achar muito difícil posso te colocar em serviços burocráticos ou numa área de vigilância. O que escolher é só me procurar e considerar feito.

Guynive sabia que aquelas não eram reais ameaças e sim possibilidades, pois sentia um tom agregador na voz do cabo. As palavras e a postura do rapaz lhe aplacaram a ira.

Ivan já tinha dado alguns passos quando parou e se virou para ela:

— A propósito, imagino que isso seja seu — tirou o canivete do bolso e lhe lançou, com a garota o pegando no ar. — Tenha um bom dia.

Então acariciou o precioso objeto, colocando-o no bolso:

"Minha ira foi tamanha que não percebi a sua ausência?" — se questionava.

Ao olhar para Dina, a mesma segurava o riso. O que irritou Guynive:

— O que que foi agora?

— Eu não sei o que aconteceu entre vocês, mas ele te pegou de jeito, heim?!

— Do que você está falando?

Ela realmente não entendia.

O dia transcorreu no mesmo ritmo dos anteriores, mas com outros pensamentos incomodando Guynive.

O fim de tarde se aproximava quando Ivan foi interceptado pelo mensageiro que lhe entregou uma correspondência e saiu. No pedaço de papel a mensagem foi clara:

"RETORNO PARA A AMÉRICA DENTRO DE UMA SEMANA, PARA RESPONDER PERANTE A JUSTIÇA, A UMA AÇÃO IMPETRADA PELA SENHORA ZETTA."

Sabia que, assim que tivesse chance, deveria executar o seu plano.


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Guynive - O Começo do FimOnde histórias criam vida. Descubra agora