59. Clubinho dos Mortos

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        Crystal sabia que não tinha chance no momento que levantou a varinha. Também sabia que não poderia correr de Bellatrix rápido o suficiente, não com a perna machucada — e não queria correr. Não se surpreendeu quando o jorro de luz verde a atingiu no peito mais rápido do que pôde pensar em um feitiço: sabia que estava morta antes mesmo da outra bruxa se posicionar.

        Tudo escureceu como se apenas tivesse fechado os olhos. A última coisa que sentiu foi a superfície sob a qual seu corpo provavelmente havia caído. Não sentiu a dor da queda, assim como não sentiu a dor da morte.

        O tempo parecia não existir mais e, ao mesmo tempo, parecia se estender demais. O silêncio era seu único companheiro. Ainda sentia que estava deitada, mas a superfície era muito mais macia do que deveria. Os dedos, reagindo antes de seus olhos, tatearam lençóis de linho e trouxeram uma estranha familiaridade à Crystal. Talvez, se ela ainda tinha tato e aqueles lençóis realmente existissem, então seus olhos deveriam responder também. E, no momento seguinte, tomou prova disso ao abri-los e encarar um teto abobadado.

        Conhecia aquele teto. Olhou ao redor e as cortinas ao redor de sua cama estavam puxadas para o lado, dando-lhe vista para confirmar o que achava: estava na enfermaria de Hogwarts. Aquela, porém, era muito mais clara e extremamente limpa. Madame Pomfrey talvez gostasse daquilo se visse.

        Crystal se sentou para observar melhor e notou que estava nua e que não havia nenhuma cicatriz das que tinha adquirido nos últimos anos em seu corpo. Se sentiu um pouco exposta e desejou que tivesse roupas. Mal acabara de formular o pensamento quando apareceram vestes a uma pequena distância, similares às roupas de Sirius que normalmente usava para dormir. Saltou da cama e vestiu-se rapidamente, notando como eram macias, limpas e quentes.

        Sentiu-se aconchegada e em paz.

        Decidiu sair da enfermaria quando notou que nada aconteceria ali. As grandes portas abriram sozinhas e ela agradeceu por isso. Crystal seguiu para a direita e nem mesmo seus pés descalços sobre o piso de pedra do castelo lhe incomodavam — o chão parecia estranhamente morno e a mantinha confortável. Não deveria se chocar com aquilo, não quando o corredor em que estava parecia infinito. Sequer parecia Hogwarts sem os vários corredores e escadarias.

        Aquilo não importava, de qualquer jeito, pois ela estava morta.

        Crystal seguiu pelo que pareceram horas e segundos ao mesmo tempo, uma vez que a noção do tempo não lhe parecia importante mais, até parar em frente à outra grande porta que conhecia bem: a do Salão Principal. De lá, ouviu murmúrios e quis averiguar. E novamente as portas se abriram sozinhas, o barulho ecoando no grande salão à sua frente e nos corredores infinitos que estava.

        Os murmúrios pararam e, se o coração de Crystal também teria se estivesse viva: na mesa da Grifinória, os sorridentes James, Lily e Alice a encaravam.

        — Ora, ora, olha só quem acordou! — exclamou James.

        — Quieto, James. — ralhou Lily.

        Crystal não moveu um músculo, apenas os encarou. James parecia um pouco mais velho do que se lembrava, mas não muito — o mesmo se aplicava à Lily ao seu lado — e Alice estava bem mais nova do que da última vez que a vira. Todos estavam em torno dos 20 anos — talvez ela também estivesse — e todos bem.

        Alice se levantou e, com um sorriso, abriu os braços para a amiga. Aquela não era vazia como sua Consciência: tinha um brilho nos olhos que a falsa Alice nunca teria, um sorriso sincero que a aquecia por dentro.

        Então Crystal correu, rindo feito uma criança e sentindo o peito doer, talvez pela primeira vez, de felicidade.

        — Eu não... Vocês... Não acredito que... — murmurou, as palavras ecoando pelo Salão Principal. Não sabia o que dizer ou por onde começar.

𝗠𝗨𝗧𝗔𝗧𝗜𝗦 𝗠𝗨𝗧𝗔𝗡𝗗𝗜𝗦,	𝒔𝒊𝒓𝒊𝒖𝒔 𝒃𝒍𝒂𝒄𝒌Onde histórias criam vida. Descubra agora