VOCÊ SEMPRE TEM RAZÃO

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A Madah estava mais calma e mesmo depois do estresse, conseguimos preparar a surpresa que planejamos para o Art. Era reconfortante ver a alegria do nosso guri. Seus olhinhos brilhavam para todas as suas comidas favoritas que a Madalena comprou cuidadosamente.

Ele separou um lugar à mesa para cada um dos seus bonecos do homem aranha e um para a irmã, dizendo "Esse lugar aqui na nossa família é da minha irmãzinha".

Confesso que não tinha pensado muito sobre o futuro. Sobre como seria quando ela nascesse. O que falaríamos pro Arthur? Eu evitava falar no assunto, porque na verdade eu morria de ciúmes. Das duas. Eu passava noites assombrado, com medo de que o Luca se aproximasse da Madah, que ela deixasse ele tocar a sua barriga ou sentir a bebê mexer e até mesmo que chamasse ele para ir ao médico com ela.

Ao mesmo tempo eu me sentia uma fraude por estar querendo ocupar esse lugar. Eu poderia me iludir o quanto eu quisesse enquanto ela estava grávida, mas depois, com a bebê, eu seria obrigado a ceder espaço para ele e só de pensar nisso eu passava mal de raiva.

Eu percebia que a Madah também ocultava informações de mim, talvez porque eu me mostrava desinteressado. Eu não sabia exatamente quando a bebê ia nascer, ela não me chamou pra nenhuma ultra e nem me mostrou nenhum item do enxoval.

Claro que não era uma obrigação dela, mas eu queria participar, queria muito. Só que era como se algo tão importante não estivesse acontecendo entre nós. Nessas semanas que estamos juntos mencionei a bebê talvez uma, no máximo duas vezes. Eu percebia que essa indiferença deixava nós dois tristes, mas ao mesmo tempo não sabíamos como lidar com estes sentimentos.

O que me restava era observá-la de longe, falando com a bebê durante o banho ou ver, às escondidas, as roupinhas que ela trazia e deixava em uma parte separada do guarda-roupa. Quando estávamos juntos eu sempre acariciava a barriga dela com a ponta dos dedos, torcendo para que a bebê se mexesse. Quase sempre eu dava sorte e ficava feliz, mas mantínhamos o silêncio sobre o assunto.

O Art me despertou dos meus devaneios e pelo visto não era só eu que estava voando.

- Pai, quando a minha irmãzinha vai sair da barriga da mamãe?

- Ainda falta bastante tempo, filho. - Não queria que ele ficasse muito ansioso. A barriga dela ainda estava pequena, devia estar de uns 4 meses. - Né Madah?

- Oi? - Ela perguntou distraída.

- A bebê, ainda falta bastante tempo, não é? - Ela se assustou com a pergunta.

- Por que tá perguntando? - Ela perguntou séria e eu estranhei, ficou claro que ela se incomodou com minha constatação. Será que ela estava me achando invasivo?

- Não sou eu quem está perguntando. É o Art. - Eu me coloquei na defensiva.

- Ah sim. Falta um pouquinho ainda, filho. - Ela respondeu o Art com ternura, acariciando os seus cabelos.

- Eu queria que ela nascesse no meu aniversário. - Ele disse um pouco triste.

- Ah filho, mas ela não pode nascer hoje. Ela tá muito pequena pra nascer. Ano que vem ela vai estar aqui com a gente, tá bom? - Ela respondeu.

- Jura juradinho? - Ele conseguiu arrancar um sorriso dela.

- Juro juradinho. - Ela jurou beijando os dois dedos em cruz.

Terminamos o café em silêncio. O Art logo pediu para ir pro quarto brincar com o novo jogo de videogame que tinha ganhado de presente. Ela estava pensativa, talvez triste. Era tão difícil pra mim "ler" a Madalena agora. Quebrei o silêncio.

- Ei, desculpa por agora pouco. - Coloquei uma mão sobre a dela.

- O que? - Ela estava muito distraída, senti um aperto no peito, um medo.

- Por ficar questionando sobre a bebê. - Ela acariciou minha mão devagar, girando a aliança no meu dedo. Acho que foi a primeira vez que viu que eu havia colocado de novo.

- Ei amor, não se preocupa com isso. Não é culpa sua. Eu errei e estou tendo que lidar com os meus erros.

- Não fala assim, por favor...

Fomos interrompidos pelo toque do telefone dela. Era o Luca. Ela me olhou com uma expressão questionadora. Parecia pedir permissão ou talvez privacidade para atender. Eu fiquei olhando fixamente pra ela.

- Não vou atender. - Ela disse por fim.

- Atende, não se sinta obrigada a recusar por mim. - Eu a tranquilizei.

- Não é isso. Eu e Luca não estamos em um bom momento, nós brigamos. Foi sério.

- Eu não sabia. - Não era certo, mas senti um alívio. A dor no peito se dissipou. - Atende. Eu vou dar uma olhada no Art. Eu segurei a mão dela como um sinal de que estava tudo bem.

Estes vão ficar entre os 10 minutos mais longos da minha vida.

- Papai, tem que fazer assim ó. Deixa eu te mostrar. - Arthur chamou minha atenção para o joguinho, mas eu não estava conseguindo ficar parado ali.

- Filho, o papai já volta, tá bom? Aí tu me ensina tudo.

Levantei e fui em direção a sala.

"Luca, o que você fez, eu não sei se consigo perdoar..." - Ela estava chorando de novo. Fiquei preocupado e com raiva. O que ele tinha feito com ela? - "Eu vou passar o telefone pro Art, tá bom?"

Nos encontramos no corredor. O olhar dela no meu. Fui sentar no sofá da sala. Depois de finalizar a ligação com o Art ela sentou do meu lado, descansou a cabeça no meu peito, continuava chorando.

- O que ele fez, de tão grave? - Eu perguntei, enquanto acariciava os cabelos dela. Ela não disse nada. - Se você se sentir à vontade para falar, eu sou todo ouvidos. Quero te lembrar que mesmo que eu brinque, falando que você é minha namorada, que estejamos há dois estados de distância, você é minha mulher e eu sou teu marido. Nós podemos dividir tudo um com o outro.

- Eu sei amor e eu te amo por isso. - Ela acariciou minha barba e me deu um selinho. - Mas esquece agora, não importa. - Ficamos ali por uns momentos, eu imaginando o que o Luca poderia ter feito. A Madah parecia adorar ele agora. Não seria algo fútil que faria ela deixar de falar com ele.

- Ele não te forçou, né? - Eu fiquei furioso de imaginar essa possibilidade. Ela pareceu não entender o que eu estava dizendo. Completei.- Eu mato ele.

- Não, se acalma Filipe. Não foi nada disso. - Limpou as lágrimas e eu fiquei olhando pra ela, desconfiado. Tentando entender se ela estava mentindo.

- Eu não tô preparada pra falar sobre, tá bem? Quando eu estiver, tu vai ser o primeiro a saber.

- Se ele te... - Eu não queria pronunciar aquela palavra. - Eu quero saber agora.

- Eu juro que não é isso, tá tudo bem Filipe. - Ela disse firme.

- Promete que não é?

- Uhum. Prometo - Ela afirmou com a cabeça. - Vamos dar uma volta? Esquecer o que aconteceu até agora? Não quero que o nosso pequeno lembre de hoje como um dia ruim.

- Você sempre tem razão! - Eu sorri e abracei ela ainda mais forte.

TEMPO, TEMPO, TEMPOOnde histórias criam vida. Descubra agora