Com a iminência do fim de semana, mais turistas começaram a chegar no Vale dos Vinhedos. Com isso eu e o Filipe sempre tínhamos uma agenda lotada de eventos para cumprir na Bentô. Os dias eram agitados por aqui: as manhãs começavam com o café da manhã sob as parreiras de uva (chamado merendim), seguido por um tour guiado pelos vinhedos e do almoço especial na nossa trattoria. Depois os visitantes poderiam aproveitar as atrações do centro histórico, jantar nas cantinas e retornar a noite para a colheita noturna das uvas e para conhecer a cave. Era o ponto alto do passeio. A iluminação de gambiarras davam um charme especial à noite na vinícola e o mais importante: a visita por completo era regada a muito vinho.
No intervalo entre o almoço e a colheita noturna o Filipe ministrava um curso de vinhos e harmonizações e a minha sogra ensinava técnicas para preparação de queijos. Mesmo contando com ajuda, no fim do dia estávamos exaustos, mas compensava, principalmente para o meu marido. Ele ficava todo orgulhoso, com sentimento de dever cumprido. Quando transformamos a vinícola em um ponto turístico, com eventos, gastronomia e receptividade, aí sim começamos a prosperar nos negócios.
Minhas tarefas nesses dias eram: organizar as reservas para o tour e para as aulas, administrar os pagamentos, decorar as mesas com flores, louças, talheres e xícaras para o café da manhã, modéstia a parte eu era muito boa nisso, e às vezes, quando o movimento estava alto, eu ajudava no atendimento da lojinha ou na trattoria.
Minha sogra cuidava da comida, era o que ela fazia melhor, tudo artesanal, fresquinho, do campo.
Mateus, marido da Gi, garantia que a estrutura da Bentô estava em ordem: banheiros, acesso, temperatura dos vinhos e da cave, contratação de transporte para os turistas, além de dar orientações para as pessoas que contratávamos somente na época de colheita.
Já meu marido era o anfitrião, o centro das atenções. Ele recebia os turistas, fazia o tour com eles, contava a história da região, oferecia a degustação de vinhos e eu via nos olhos dele a felicidade em estar ali fazendo aquele trabalho. Ficava em estado de imersão, quase como se estivesse hipnotizado. Às vezes eu sentia um pouco de inveja dele, tão realizado profissionalmente, tão feliz.
Esqueci de mencionar o Luca. Adivinha o que este fazia? Essa é fácil. Nada. Só vagava pela vinícola, bebendo e arrastando asa para toda e qualquer turista abaixo dos 100 anos de idade. E o pior que tinha algo nele, nesse jeito de guri de apartamento, que encantava as pessoas e por isso eu estava sozinha na missão de odiá-lo.
Eu sempre deixava o Art com a babá, porque ficávamos atolados e tinham muitas pessoas entrando e saindo da vinícola. Eu precisava que alguém desse atenção ao guri o tempo todo. Como ele estava com febre no dia anterior, não tinha ido ao colégio, resolvemos deixá-lo com babá e tudo na casa da Giovanna. Lá ele ficaria seguro, eu mais tranquila, porque a Gi era médica e tenho certeza que ela me ligaria ao menor sinal de alerta.
O Filipe foi levá-lo bem cedinho e eu fiquei na vinícola arrumando as coisas para o café da manhã e para começar a receber os turistas. O café era às 9h30 e tínhamos vaga para 30 pessoas diariamente. Já estava tudo pronto e como o horário estava próximo resolvi conferir as reservas. Minha sogra havia anotado por causa da minha ausência no dia anterior. Passei o olho pela lista, estava escrito: Clara Albuquerque Maia. Procurei pelo pai dela na lista. Talvez ele tenha feito questão de vir nos prestigiar. Senhor Augusto? Augusto? Augusto? Nada! Não tinha base aquele aprochego todo com o Filipe. O que mais ela precisava pra enxergar que ele tinha uma família, uma mulher?
Meu sangue ferveu. Fiquei imaginando se o Filipe dava alguma liberdade para ela. O que eles fizeram nos dias em que almoçaram juntos? E o cabelo molhado do Filipe na inauguração da festa? Ele estava com ela? Ela foi com ele até o hospital. Estavam próximos. Eram próximos. Se conheceram no Rio de Janeiro, sem mim. Eu devia ter ido junto. O que eu ia fazer? Será que ele teria coragem de trair? Minha cabeça estava rodando. Rodando. Zonza.
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TEMPO, TEMPO, TEMPO
Roman d'amourAté quando vale a pena lutar por um amor? O quanto vale a pena deixar os sonhos de lado por um casamento? Por um homem? O quanto se pode errar e voltar atrás? O quanto o amor é capaz de perdoar? O quanto os erros nos fazem perfeitos? O quanto os e...