NÃO EXISTE LEVEZA O SUFICIENTE

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Tenho pequenas lembranças do que aconteceu depois daquele abraço. Não conseguia me acalmar. Celular quebrado nas mãos. Fiquei desesperada tentando ligá-lo. Sem sucesso. O Filipe falava comigo, tentando criar uma conexão entre nós, mas era impossível. Eu estava fora de mim. A sensação é de que eu iria morrer.

Falta de ar. Dor de cabeça forte. Luzes brancas. Enfermeiros e médicos no quarto. Me sedaram. Crise de pânico, o Filipe me contou depois. Minha pressão foi a 16 por 10. Não existia leveza capaz de lidar com tantas pancadas da vida.

Na manhã seguinte tive alta. O Hugo foi o médico que me liberou, pelo visto a notícia de que eu estava no hospital tinha se espalhado.

- Madah! Não posso te prender aqui pra sempre. - Ele começou a me dar recomendações. - Fisicamente tu está bem. Pressão estabilizada. Mas precisa procurar uma terapeuta e um psiquiatra. - O Filipe estava imóvel ao meu lado.

- Não quero tomar remédio, eu tô amamentando. - Eu disse um pouco sem paciência e me arrependi. - Mas obrigada por ter cuidado de mim, Hugo.

- Tudo bem, mas existem alternativas. Talvez tu não consiga lidar com tudo o que está acontecendo sozinha. E se precisar de um amigo, eu tô aqui. Conta comigo!

- Ela vai procurar. Pode deixar. - Filipe apertou minha mão. - Deixa comigo! Obrigado Hugo.

Filipe me deixou na recepção do hospital e foi buscar o carro. Ouvi uma mulher gritar.

- Ei piranha! Tu mesma. Madalena Bellini. - Olhei pra ela. Era uma mulher de meia idade. Eu a conhecia de vista, mas não sabia o nome. Respirei fundo. Eu não tinha condições físicas e emocionais de revidar e nem queria. - Tu vai pagar, piranha! Bah, enganou o Filipe, guri tão bom. Conheço a família. Esconder uma filha dele? Se é que essa menina é dele. Eu duvido. - Travei. Como ela sabia disso? Mesmo que ela conhecesse a família, não era próxima. Todos ali presentes ficaram me olhando. Entrei correndo no carro, aos prantos. Expliquei pro Filipe.

- Amor, calma. Quer voltar pro hospital? Tem certeza que está bem pra ir pra casa? - Ele quis ter certeza de que eu não ia ter outro ataque de pânico.

- Tenho. Não quero voltar. Quero me enfiar em um buraco onde só tenha os meus filhos.

- E eu? - Eu dei um meio sorriso pela pergunta boba dele. Não respondi.

- Falando sério... Como será que descobriram isso? - Eu perguntei incrédula. - Não quero acusar assim sem provas Filipe, mas era uma mulher da idade da sua mãe.

- Olha, eu vou confirmar isso, mas de qualquer forma, eu tomei uma decisão. - Ele falou sério.

- Qual? - Eu perguntei assustada.

- Eu vou pedir que a minha mãe e a Giovanna se mudem da vinícola. Eu compro uma casa pra mamãe, apartamento, o que ela quiser. Não quero mais ninguém lá dentro. Eu não aguento mais viver nesse inferno e nem precisamos. Nós compramos a vinícola depois que o meu pai morreu, paguei todas as dívidas. - Ele suspirou. Era um assunto delicado, a partilha da vinícola. Ia falir, nós nos endividamos e compramos por um valor alto. Era dele, nossa, mas a Dona Telma sempre se achou dona também e nós deixamos. - Eu nunca imaginei pedir pra minha mãe sair da casa que morou a vida toda, mas essa situação com o Arthur na piscina foi o ápice.

- Até a Gi? - Aquela conversa estava tomando um rumo que eu não esperava.

- Sim, até a Gi. Ela é médica, mora lá por causa do Mateus, quer mais é morar perto do centro. Chega de todo mundo interferindo na nossa vida. - Ele se aproximou e enxugou minhas lágrimas. - Eu queria poder absorver a tua dor. - Ele disse triste e me beijou. Eu correspondi, sem saber muito bem o que aquilo significava.

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