AGORA NÃO TEM MAIS JEITO

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A casa parecia maior sem ele. A cozinha era grande demais. A sala, uma imensidão. Até o quarto das crianças estava muito longe na minha concepção. Eu tinha medo da solidão daquela casa.

Acomodei o Art na minha cama. Mesmo que ele já estivesse dormindo tranquilamente na sua própria, a carência era minha. Depois de muito rolar de um lado pro outro, deixei os dois pequenos dormindo e desci. Talvez eu pudesse ver tv e me distrair.

Ao invés disso, fiquei na sala, no escuro. De repente alguém abriu a porta. Levei um susto.

- Madah! Que susto que tu me deu! - Era o Filipe. Ele tinha a aparência cansada e realmente tinha levado um susto e tanto.

- Estava te esperando, mas não sabia se você viria. - Eu disse triste. Ele sentou do meu lado.

- Eu também não sabia se viria.

- Que bom que você veio, amor. Eu não quero ficar sozinha nessa casa. - Eu disse chorosa. - Eu queria tanto me explicar.

- Eu não tô pronto, Madalena. Por favor. - Eu fiquei com um aperto no coração.

- Você quer assinar aqueles papéis? - Perguntei e me arrependi no mesmo instante.

- Papéis? - Ele perguntou sem entender.

- Sim, da separação.

- Eu não sei. - Ele foi honesto demais e senti um aperto no peito.

- Você disse que nunca ia desistir de nós dois, da nossa família. - Eu relembrei.

- Achei que podia confiar em você. - Ele concluiu triste.

- Se acha que não pode, por que veio aqui então? - Eu perguntei magoada.

- Parecia errado ir embora de casa. Não quero que eles acordem amanhã e não me vejam aqui. E também tenho um outro assunto pra falar contigo.

- Fala. - Eu pedi.

- Tô escolhendo as palavras. - Fui ficando nervosa.

- Não precisa, eu sou forte. - Eu não sou. Fui tomada por todo o pessimismo do mundo. Fiquei imaginando barbaridades, mas fiquei firme.

- Lembra hoje de manhã quando a gente transou na cozinha?

- Como esquecer. - Eu disse mais pra mim mesma do que pra ele. Depois lembrei que estávamos brigados. - O que tem?

- Minha mãe disse que veio aqui, porque o Igor tinha visto nós dois juntos.

- Sim, que ele viu a gente transando. - Eu completei revirando os olhos. - Francamente né Filipe? Espero que você tome alguma providência.

- Não foi ele. O rapaz levou a culpa.

- Quem foi então? - Perguntei incrédula.

- Foi a Clara. - Eu perdi a calma.

- Foi você Filipe, você que trouxe essa mulher pra nossa vida! - Eu me exaltei. - Eu te falei que ela era sonsa e que tudo o que ela queria era acabar com o nosso casamento. Agora isso? Ela vai se meter na nossa cama também? O que ela estava fazendo aqui na vinícola?

- EU NÃO SEI. - Ele gritou e me calei. - Desculpa. Não queria gritar. Aconteceu muita coisa hoje.

- Tu mandou ela embora como me prometeu?

- Mandei. - Ele respondeu frustrado. - Mas minha mãe tem recebido a Clara na casa dela. Não tenho o que fazer.

- Sempre sua mãe né Filipe? Sempre ela. Minha paciência já se esgotou. - Eu me levantei.

- Como assim? - Ele perguntou incrédulo.

- Eu vou falar com a sua mãe.

- Espera, Madah. Senta aqui. - Ele segurou minha mão.

- Chega! Não defende ela Filipe, sua mãe precisa ouvir umas verdades.

- Bah, me ouve, por favor. Preciso te contar tudo.

- Filipe, tu tá me deixando angustiada. - Eu sentei de novo.

- Ela fez umas fotos, uns vídeos. Está tudo na internet. Nós dois transando ali na cozinha.

- O QUE? ELA QUEM? - Eu gritei.

- A Clara, mas agora não tem mais jeito. Ela te marcou em tudo. Fiz denúncia por crimes digitais. O celular está apreendido.

Meu rosto foi ficando cada vez mais quente. Subi as escadas correndo. O Filipe atrás de mim.

- Madah, vem aqui. O que tu tá fazendo? - Ele perguntou baixinho pra não acordar as crianças.

Essa mulher estava me provocando há muito tempo, mas ela ia ter o que merecia. Ia. Ela não ia acabar com a minha carreira e ficar impune. Já me bastava ela dar em cima do meu marido descaradamente.

Me tranquei no closet, vesti uma roupa e peguei minha bolsa. Eu não queria ser impedida. Saí em um ímpeto e passei apressadamente por ele, que ficou sem entender nada.

- Não tenta me impedir. Não tenta. - Eu pedi nervosa.

Cheguei na porta de casa e fiz a pergunta certa.

- Aonde ela tá? - Ele me pareceu confuso. - Me fala. Aonde ela está hospedada?

- Madah, não vai. Não vale a pena. Eu já fiz a denuncia. Está tarde. E a neném? - Ele pediu preocupado.

- Filipe, me fala ou eu vou descobrir sozinha. É no hotel, não é? No Gonçalves? - Ele não respondeu, mas a resposta estava no seu silêncio.

TEMPO, TEMPO, TEMPOOnde histórias criam vida. Descubra agora