Capítulo 18

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• Maiara •

Quando encerrei a ligação, desmoronei por completo, caindo em minha cama em um choro compulsivo e intenso. Sentia como se meu peito estivesse sendo rasgado de dentro para fora. Aquela tinha sido a coisa mais difícil que eu já tinha precisado fazer na vida.

Usar a desculpa do ex-namorado foi a única coisa na qual eu conseguira pensar. E mentir daquele jeito para Fernando já tinha sido tão difícil por mensagens de texto... Mas ele conseguiu tornar tudo ainda pior quando me fez dizer a ele, com palavras, que não o amava.

Escutei um barulho vindo do andar de baixo e imaginei que minha mãe tivesse derrubado alguma coisa na cozinha. Eu não queria que ela me visse chorando daquele jeito, mas me preocupei e, por isso, saí do quarto, levando em mãos o celular dela, que era por onde eu tinha conversado com Fernando.

Maiara: Mãe? — chamei, parando no alto das escadas. — Está tudo bem aí?

Nenhuma resposta. E isso me preocupou ainda mais.

Maiara: Mãe? — repeti, descendo os degraus de forma apressada.

Como ela novamente não respondeu, passei a correr. Quando cheguei à cozinha, encontrei-a caída no chão, desmaiada.

***

A sensação em meu peito era a de que o meu mundo tinha começado a desabar sobre a minha cabeça no dia anterior, quando Filomena Zorzanello me procurou para fazer aquelas ameaças.

A partir daquele ponto, era como se eu seguisse em uma queda livre e aparentemente interminável. Quando encontrei minha mãe desmaiada na cozinha, tentei me convencer de que não deveria ser nada demais. Talvez uma queda de pressão, que era algo que ela sentia rotineiramente.

Contudo, quando abaixei ao seu lado e toquei seu rosto, percebi que ela estava ardendo em febre. Consegui pensar rápido e pedir ajuda aos vizinhos, que nos levaram até um hospital.

Agora, já fazia horas que ela tinha sido levada para o atendimento. E eu estava ali, em meio a uma sala de espera lotada de pessoas, sentindo-me completamente sozinha e desesperada.

Fiquei caminhando de um lado para o outro durante a maior parte do tempo, até que, sentindo-me exausta, deixei-me cair sentada em uma cadeira vaga. Fechei meus olhos, tentando mentalizar uma oração, ainda que eu nunca tivesse sido uma pessoa religiosa.

Então, lembrei-me de algo que minha mãe sempre costumava me dizer. Ela, que tinha frequentado a igreja durante muitos anos de sua juventude, me contava ter aprendido que a música era uma das formas mais bonitas de fazer suas palavras chegarem a Deus.

Abri minha bolsa – que eu só tinha lembrado de pegar antes de seguir para o hospital porque o vizinho que nos levou me alertou que eu precisaria estar com algum documento – e peguei meu celular, que estava desligado desde a noite anterior. Liguei-o e pluguei os fones, levando-os ao ouvido.

Abri uma playlist que eu tinha nomeado de 'Momentos com a mamãe', porque era uma seleção de algumas das músicas favoritas dela que gostávamos de ouvir e cantar juntas.

A primeira canção logo fez a dor em minha garganta aumentar ainda mais. Amávamos a clássica I say a little prayer, e aquela versão, da Dionne Warwick, era a preferida da minha mãe.

Meus lábios se moveram e sussurrei o início da música, enquanto a ouvia em meus fones.

Maiara: The moment I wake up, before I put on my make-up... I say a little prayer for you... While combing my hair, now... And wondering what dress to wear, now... I say a little prayer for you... (No momento que eu acordo, antes de colocar a maquiagem... Eu faço uma pequena oração para você... Enquanto eu penteio meu cabelo, agora. E enquanto fico pensando em que vestido colocar, eu faço uma pequena oração para você).

Concentrei todos os meus pensamentos e meu coração no desejo de que minha mãe melhorasse. E segui mentalizando isso, até avistar um médico vir em minha direção.

Levantei-me, aflita por notícias.

Médico: Maiara Carla Pereira? — ele perguntou.

Assenti, logo devolvendo outra pergunta:

Maiara: Como está a minha mãe?

Médico: Tivemos que levá-la para a UTI. Além do quadro de falência renal, ela está com uma infecção grave. Há quantos dias ela vinha apresentando febre?

Movimentei a cabeça em negativa, sem saber como responder.

Maiara: Eu desconfiei que ela estivesse febril há alguns dias, mas ela negou. Mas voltei a abraçá-la nos dias seguintes... Eu a abraço todos os dias... E eu nunca notei que...

Médico: Ela devia estar fazendo uso de antitérmicos para baixar a febre. Mas, pelo estágio da infecção, devia ter procurado um hospital antes.

Maiara: Ela vai ficar bem? — fui direta na pergunta que mais me importava.

Ele fez uma pausa, como se não tivesse boas notícias para contar.

Médico: Quantos anos você tem?

Maiara: Dezessete.

Médico: Vocês têm algum familiar? Algum adulto?

Maiara: Não... Minha mãe não tem irmãos... meus avós já são mortos...

Médico: Eu vou precisar que você tenha algum responsável, Maiara. Alguém maior de idade que possa tomar as decisões por você.

Maiara: Eu... Tenho o meu pai...

Médico: Pode entrar em contato com ele? Aliás, melhor: passe o contato dele na recepção, deixe que algum funcionário entre em contato e lhe explique o ocorrido, acho que você não deve estar em condições para isso.

Movimentei a cabeça em concordância, embora soubesse que meu pai provavelmente não ficaria nada feliz em ser colocado naquela situação.

Maiara: Por favor, doutor, pode ao menos me dizer se minha mãe vai ficar bem? Meu pai mora em Goiânia. Mesmo que venha imediatamente, levará um tempo para chegar aqui.

Médico: Quando ele chegar, passarei a ele um quadro mais detalhado. Tudo o que posso te adiantar é que... Eu sinto muito, mas é melhor que você esteja preparada para o pior.

Ele disse aquelas palavras como se fosse apenas uma coisa cotidiana – como, de fato, para ele deveria ser. Daí ele se virou e foi embora, como se não tivesse acabado de me dizer que eu estava a um passo irreversível de perder a minha mãe.

De perder absolutamente tudo o que eu tinha.

Deixei-me cair novamente sentada na cadeira.

Alguma música seguia a tocar em meus fones de ouvido, mas sequer seria capaz de reconhecê-la.

Os sons não faziam sentido.

Nada o meu redor fazia.

O fruto do nosso amorOnde histórias criam vida. Descubra agora