Capítulo 45

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Fernando

Bettina: Daí, o médico falou que eu ajudei a salvar a sua vida, papai! — Nina contou, orgulhosa, sentada ao meu lado na cama do hospital.

Eu tinha passado por uma cirurgia para a retirada das balas e recebido uma transfusão de sangue. Sentia-me fisicamente fraco, mas bem, e quis ver Maiara e Nina logo que acordei.

Precisava saber se elas estavam bem. Se tudo havia terminado bem. Maiara tinha ficado desesperada, mas fez o possível para tentar se mostrar forte por Nina. Depois de todo o ocorrido, ela precisou ir à delegacia, mas logo depois foi para casa, onde deu um banho em Nina e trocou suas roupas sujas de sangue. Depois foi com ela para o hospital e aguardou por algumas horas até que eu pudesse receber visitas.

Fernando: Claro que ajudou — concordei. — Eu podia ter perdido mais sangue se você não tivesse estancado o sangramento da minha perna.

Eu sabia que, no fim das contas, talvez aquilo não tivesse feito tanta diferença assim, tendo em vista que eu já havia perdido bastante sangue no momento em que fui baleado pela segunda vez. Mas Nina se sentia orgulhosa por isso, e era esta recordação que eu queria que ela guardasse daquele dia tão trágico. Maiara estava de pé ao lado dela, mas pouco tinha falado desde que elas entraram ali. Neste momento, ela enfim disse algo.

Maiara: Coraçãozinho, a tia Roze está logo ali no corredor. Por que não pede a ela para te levar até a máquina de snacks para pegar um chocolate? Diga a ela que depois eu pago.

Bettina: Posso pegar batatinhas também, mamãe?

Maiara: Claro, meu amor.

Vibrando, Nina saiu do quarto, deixando-nos a sós. Maiara se debruçou sobre mim, depositando um beijo aflito em meus lábios e desabando no choro que manteve preso durante todo aquele tempo.

Maiara: Eu tive tanto medo de perder você... — ela confessou.

Fernando: Não perdeu, amor. Eu estou bem.

Maiara: Não está. A sua perna... o seu ombro...

Eu estava com o braço esquerdo imobilizado junto ao corpo, e sabia que isso talvez a preocupasse, especialmente pela minha profissão.

Fernando: Vou me recuperar. O tiro no ombro foi de raspão, não atingiu nenhum nervo ou músculo que possa limitar meus movimentos. Logo voltarei a operar normalmente. Na perna, talvez eu precise passar por algumas sessões de fisioterapia, mas muito em breve ficarei bem, sem qualquer sequela. E, o que mais importa: estou vivo, amor.

Maiara: Podia não estar. O que você fez foi...

Fernando: Eu sempre vou proteger vocês duas, Maiara. Sempre. E eu também fiquei apavorado com o que poderia ter acontecido a vocês.

Maiara: Bem... eu quase fui para a Inglaterra.

Fernando: Você o quê?

Maiara: Depois eu te conto com mais calma.

Eu não estava muito certo se iria gostar daquela história, então achei que seria realmente melhor deixar para saber mais a respeito dela em outro momento.

Fernando: Como você está? — perguntei.

Maiara: Agora que você está bem e que Nina está a salvo, nada mais me importa.

Fernando: A Nina está calma. Achei que ficaria apavorada com tudo o que viu.

Maiara: Bem... Eu contei para ela sobre o quanto ela foi corajosa, disse que o que vivemos foi uma grande aventura, e... Eu estava apavorada enquanto você passava pela cirurgia, amor, mas tentei não demonstrar isso para a Nina. Acho que... Enfim eu entendi...

Fernando: O quê?

Maiara: A minha mãe. Depois que ela morreu, eu senti muita raiva por saber que ela vinha há dias tendo febre e, provavelmente, se sentindo muito mal, e não me contou nada a respeito. Ela seguia sorrindo todos os dias e me dizendo que estava bem. E agora, que eu também sou mãe, eu posso enfim entender por que ela agiu assim.

Fernando: Ela só queria proteger você.

Maiara: Sim. Agora eu sei.

Fernando: Você se tornou uma mãe tão maravilhosa quanto a sua era para você.

Maiara: E você não é como a sua mãe, amor. Sabe disso, não é?

Respirei fundo, pensando em todas as coisas que minha mãe tinha feito. Sentia ódio dela, sabia que jamais poderia perdoá-la por aquilo. Mas, ao mesmo tempo, era impossível deixar de sentir uma profunda tristeza.

Fernando: Espero que ela pegue um bom tempo de prisão... — desabafei.

Maiara: Ela será indiciada por sequestro, porte ilegal de arma, ameaça e tentativa de assassinato. Mesmo com ótimos advogados, não acredito que ela consiga escapar de ter alguma pena.

Fernando: E o... capanga dela?

Maiara: Também foi preso e vai responder por praticamente os mesmos crimes. Eu não podia imaginar que João fosse capaz de algo assim, mas... Eu estava certa em nunca ter confiado nele.

Fernando: Que apodreça na cadeia. Mas... não quero mais falar sobre nenhum dos dois, amor. Eu só quero que a gente agora, enfim, possa recomeçar.

Ela segurou a minha mão junto às suas.

Maiara: Você ainda se lembra de como tudo começou?

Fernando: Como eu poderia esquecer? Eu indo buscar um pouco de solidão e encontrando outra alma solitária... e linda... cantando Nina Simone com a voz mais doce do mundo.

Ela sorriu e me surpreendeu começando a cantar baixinho os versos de outra canção da nossa cantora favorita.

Maiara: Be my husband, man, I be your wife... Be my husband, man, I be your wife... Be my husband, man, I be your wife... ("Seja meu marido, homem, e eu serei sua mulher. Seja meu marido, homem, e eu serei sua mulher. Seja meu marido, homem, e eu serei sua mulher")

Sorri, encantado com sua voz e com a possível mensagem na música.

Fernando: Posso entender isso como um pedido de casamento? — perguntei.

Sorrindo, ela apenas completou o verso:

Maiara: Loving all of you the rest of your life yeah... ("Amarei tudo em você pelo resto da sua vida, yeah")

Fernando: É tudo o que eu mais quero na vida... Poder te ouvir cantar todos os dias.

Ela voltou a se inclinar sobre mim, em mais um beijo.

E eu tive ainda mais certeza de que tudo ficaria bem.

O fruto do nosso amorOnde histórias criam vida. Descubra agora