• Maiara •
Um...
Dois...
Três...
Sei lá quantos dias se passaram.
Sentia como se não tivesse controle sequer pelo meu próprio corpo, que apenas se movia, respondia perguntas e efetuava tarefas simples de forma completamente automática.
Sentia como se minha alma flutuasse ao meu redor, observando os acontecimentos como uma mera expectadora, não como se eu fizesse parte deles.
O óbito da minha mãe foi decretado às dezessete e onze daquele mesmo dia em que ela foi para o hospital. Poucas horas depois do meu pai ter chegado, acompanhado por um garoto da minha idade, que demorei a reconhecer como sendo Eduardo, o enteado dele.
Meu pai – a quem eu costumava chamar apenas de Marco – vinha realmente cuidando de tudo desde então. Sabia que deveria me sentir grata por ter um 'adulto responsável' para decidir e resolver aquele tipo de coisa. Desde as questões burocráticas no hospital até os detalhes a respeito do velório. Porém, eu não conseguia sentir nada além de um imenso vazio dentro de mim. Sequer tinha conseguido chorar.
Na minha cabeça, era como se minha mãe fosse voltar para casa a qualquer momento. Mesmo vê-la dentro do caixão não tornou a dimensão daquilo mais fácil de ser entendida. Ela estava tão bonita, tão serena... como se estivesse apenas dormindo. Mas o peito dela não se movia indicando uma respiração.
Ela não iria acordar. Não iria voltar. Eu a tinha perdido para sempre.
Mentira... Não era possível... Eu não conseguia acreditar.
Então, chegou o dia do enterro. De forma mecânica, consegui tomar um banho e vestir uma roupa qualquer. Por acaso, era uma camiseta preta, provavelmente porque aquela era a cor que mais predominava no meu guarda-roupa.
Havia bastante gente no enterro. Aparentemente, todos que trabalhavam na clínica compareceram. Mas eu não prestava atenção aos rostos, tampouco às palavras ditas por um padre responsável pela breve cerimônia que antecedeu o momento em que começaram a baixar o caixão.
E foi naquele momento que tudo pareceu se tornar real. Lágrimas começaram a cair de forma incessante pelo meu rosto.
Quando o caixão terminou de descer e todas as pessoas começaram a se afastar, eu permaneci ali de pé, imóvel.
Marco César: Vamos, Maiara? — consegui ouvir a voz do meu pai, também sentindo o toque dele em meu braço. — Vamos para casa, filha.
Casa...
Como poderia existir um lar me esperando, se minha mãe não iria mais voltar?
Não consegui me mover. Nem mesmo meus lábios para responder qualquer coisa ao meu pai. Foi então que outra pessoa fez isso por mim.
Eduardo: Dê mais um tempo a ela, pai. Eu fico aqui com ela. Pode esperar no carro, que nós logo vamos.
Meu pai assentiu e se afastou, deixando-me ali a sós com Eduardo. E, que coisa... ele ainda o chamava de 'pai'.
Eduardo: Sei o tanto que isso é difícil, Maiara. Mas, vai por mim, quanto mais tempo você passa absorvendo a imagem de um caixão, mais isso te atormenta pelo decorrer da sua vida. Tente se focar apenas nas lembranças boas da sua mãe.
Maiara: O que você sabe sobre isso? — rebati, séria, com os olhos ainda fixos no túmulo diante de mim.
Eduardo: Bem, eu perdi o meu pai biológico aos cinco anos.
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O fruto do nosso amor
Fiksi PenggemarEles se apaixonaram na adolescência. Mas um reencontro, anos depois, revelou que o médico milionário era pai. Fernando e Maiara se conheceram no ensino médio. Ele era o garoto milionário da cidade, o popular que já estava cansado de toda a bajulaç...