Capítulo 43

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• Fernando •

Uma das coisas que aprendi como cirurgião era a importância de conseguir manter a calma mesmo em situações extremas. E foi o que me esforcei para colocar em prática naquele momento. Por isso, ergui lentamente as duas mãos, mostrando àquele homem que eu estava desarmado e, sem movimentos bruscos, me levantei, virando-me devagar para ficar de frente para ele.

Eu não o conhecia. Era um homem moreno, de olhos claros, que tinha uma altura bem parecida com a minha. Apesar de saber que precisava manter a calma diante de um sujeito armado, algo me dizia que, se sabia quem eu era e se estava trabalhando para a minha mãe, era bem provável que aquele cara tivesse recebido instruções para não me matar.

Não que eu confiasse nos sentimentos maternos dela, mas sim nos de posse. Eu era o brinquedinho perfeito que ela gostava de exibir para a sociedade. Por isso, considerei ligeiramente seguro fazer algum tipo de provocação:

Fernando: Quanto a minha mãe está te pagando para fazer esse trabalho sujo?

XX: Acredite, bastante. Mas acho que viria até de graça.

Fernando: Gosta tanto assim de Filomena Zorzanello?

XX: Não tenho qualquer grande afeição por ela. Então, esteja certo de uma coisa: ela me deu ordens para não matar você, mas não disse nada a respeito de te machucar. E eu não vou ter qualquer pena de dar um tiro no filhinho dela, caso precise. Então colabore, que tudo terminará bem para você.

Ele fez um movimento com a arma, apontando para a mata, em um sinal para que eu seguisse para lá. Comecei a caminhar, bem devagar, enquanto ele me seguia, apontando o revólver para mim. Não podia me afastar muito dali. Mas precisava ganhar tempo até a polícia chegar. Por isso parei alguns passos adiante, ainda dentro dos limites do quintal da casa.

Fernando: Sei que disse que entraria nessa de graça, mas não nega que a grana é boa, não é? Posso te pagar mais para você me ajudar.

XX: Eu só aceitaria se seu plano incluísse foder com a vida da Maiara. Inclui?

Então, aquele cara tinha mesmo alguma ligação com Maiara. Não era à toa que na escola me disseram que Bettina o tinha reconhecido como um tio. Mas ele não era o irmão nem o cunhado de Maiara que, até onde eu sabia, eram os únicos tios da minha filha. A não ser que fosse alguma outra pessoa que ela chamasse dessa forma. E tive uma dica a respeito de quem ele era, quando declarou:

XX: Não é à toa que Maiara me trocou por você. Uma porra de um playboyzinho milionário. Sempre achei que ela fosse diferente, mas a verdade é que as mulheres são todas iguais.

Fernando: Então você é o... João? — comentei, torcendo para ter me lembrado corretamente do nome do ex de Maiara.

Logo que tudo aquilo terminasse, eu precisava comentar com ela sobre o quanto ela tinha um péssimo hábito de se envolver com caras extremamente idiotas. Primeiro, tinha sido aquele Luiz, depois, o João.

Bem... Eu tinha sido um idiota também, então talvez fosse melhor guardar o comentário para mim.

João: Ela falou de mim?

Fernando: Na verdade, quase nada. Quem mencionou seu nome para mim foi a Nina.

João: Pirralha insuportável. A pior coisa do tempo que gastei tentando fazer Maiara me aceitar como seu namorado foi ter que bajular e fingir que eu gostava daquela peste.

Fernando: Dobre a porra da língua para falar da minha filha.

Esquecendo-me totalmente do meu mantra de calma, avancei um passo em direção àquele homem. E ele realmente não hesitou em fazer o que ameaçou que faria.

Ele atirou. A bala atingiu a minha coxa, fazendo com que eu soltasse um grito de dor, ao mesmo tempo que caía com um dos joelhos no chão, levando a mão ao local atingido.

João: Eu falei, doutorzinho... Fica na sua. Se aquela vadia colaborar, a situação lá dentro logo acaba e cada um segue o seu caminho.

Nesse momento, mesmo completamente atordoado em meio à dor lancinante, consegui ouvir os sons de passos vindos da parte da frente do terreno. João também ouviu aquilo, tanto que se mostrou em alerta e sobressaltou quando ouvimos um conjunto de vozes que parecia invadir o chalé.

João: É a polícia? — João sussurrou, em choque.

E, mesmo com toda aquela dor, eu não poderia deixar de aproveitar a oportunidade daquela breve distração dele. Ignorei o tiro em minha perna e me levantei, avançando sobre João na tentativa de tirar a sua arma.

Ele tentou reagir, mas consegui fazer com que o revólver escapasse de sua mão, caindo em algum lugar em meio ao gramado alto do quintal. Eu o agarrei pelo colarinho da camisa e dei um forte soco em seu rosto, que o fez cambalear.

Sem dar tempo para ele se recuperar, eu o soquei novamente mais duas vezes e, com isso, ele acabou indo ao chão. Com dificuldade por causa da dor, corri até onde o revólver tinha caído e procurei por alguns segundos, até encontrá-lo. João tentava se levantar, mas deteve-se quando apontei a arma para ele.

Fernando: Aqui atrás! — gritei, sabendo que provavelmente tinha algum policial ainda do lado de fora da casa.

Ouvi os passos de um homem se aproximando, mas, antes que chegasse para assumir a situação, fiz questão de dar mais um soco naquele filho da puta caído à minha frente.

Policial: Doutor Zorzanello? — o policial se aproximou, me reconhecendo. Provavelmente eu já devia tê-lo atendido em alguma ocasião. — Está ferido! Vou chamar uma ambulância, e... ei, para onde vai?

Eu simplesmente entreguei a arma de João na mão dele e corri para a parte da frente da casa, o mais rápido que podia, devido à dor e ao sangramento intenso na perna.

Porque, se eu conhecia bem a minha mãe, sabia que ela não se renderia tão fácil assim.

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