Minha cara amada,
já não sei mais qual o dia de hoje, aliás há um bom tempo não sei mais o que é e o que já não é. Sigo lhe escrevendo com o intuito ou com uma sútil ilusão de que esse ato refresca-me minhas memórias. Tenho você às vezes como o rascunho de um sonho lúcido, outras como um borrão turvo quase apagado. Você se lembra das inúmeras vezes que pairávamos sob o luar das noites de verão para contarmos as incontáveis estrelas que vagavam no céu?
Eu me lembro de tantas coisas... sobre você acredito que quase tudo o que nunca deveria me esquecer. Do seu olhar inquieto, da sua fala de destino, do seu caminhar lento, vagaroso, do seu bailar íntimo, da sua voz sopro, da sua facilidade em sonhar, do seu toque deleite, de sua fé esperançosa e o principal, a sua capacidade de amar.
Tinha dias minha querida que jurava ter acabado de acordar de um sonho, pois saber da tua existência era o mesmo que alucinar uma utopia, de tão inimaginável era para mim você.
Estou em minha sexta xícara de café, daquelas bem pequeninas que só fazem aumentar a vontade e nunca sacia-lá e abrindo agora o meu segundo maço de cigarro do dia. Consigo sentir de longe o seu olhar de repreensão e ouvir a sua famosa frase, "Cada cigarro que você coloca em sua boca é um dia a menos que terá ao meu lado.", todas as vezes que você entoava aquela sentença algo em mim doía, mas logo a dor passava e aquela vontade, a minha infinita vontade jamais se saciava. O que eu não esperava era que seria você a primeira à partir.
Juro para mim seria muito mais fácil se tivesse sido eu o primeiro a ir. Egoísta, sim eu sei, mas querida a dor que sinto é a pior sentença que poderia me dar, pior do que a própria morte. Se fosse o contrário eu tenho a mais absoluta certeza de que você estaria irradiante como
sempre foi, você sempre soube lidar com as situações difíceis.
Já eu? Isso mesmo querida, ria, você está certa eu nunca soube lidar com o sofrimento, acho que esse foi o maior motivo de eu ter vivido toda a minha vida anestesiado, amortecido, embriagado. Eu sempre tentei fugir da minha realidade, da nossa realidade, da dor. E você sabia, você sempre tão sábia. Essa era a última lição que tinha para mim. E eu sei querida, eu sei que continuas à contar as estrelas até o dia da minha chegada.Com amor do seu eterno amado.
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As Luas de Júpiter
PoesíaAs Luas de Júpiter é uma obra autoral com mesclas cronistas e características da poesia. Construída sob uma narrativa abjeto, um experimento literário de dar corpo e identidade para a subjetividade de um lugar, um sentir, uma inspiração que nominei...