Capítulo I - Ligados por Sangue / Parte 3: Aquele com Sangue em Suas Mãos

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Olhando minhas mãos, pensava: "Em alguns lugares não há espaço para arrependimento. O que está feito, está feito." O corpo estava lá, preso a cadeira, imóvel, sem vida, e não havia nada que eu pudesse fazer para voltar atrás. Os fins justificam os meios, algum grande homem chegou a essa conclusão em algum momento de sua vida; era melhor pensar assim.

Com a seringa em mãos, voltei para o quarto ao lado.

Doentio... Que tipo de pessoa sou eu?! Tinha de ser feito! Não era raro vozes discutirem em minha cabeça, confundindo-me, enlouquecendo-me... Você é o único que pode vingá-la. O único. Esta é a única maneira. Só você sabe. Só nós sabemos.

Tornei-me um maldito assassino; qualquer que fosse a fronteira, eu a havia ultrapassado. O ponto de não retorno ficara para trás no momento em que despi aquele homem e o amarrei à cadeira. O cheiro daquele quarto...

"É a única maneira", uma voz dentro de mim dizia. Talvez fosse.

O corpo exalava uma aura estranha, sinistra. Bastaria estar próximo dele para que seu corpo fosse tomado por medo, asco e ter a certeza de que o mal prevalecia.

Sentei-me junto à mesa ao lado de minha cama, o único ponto de sobriedade em meio a um caótico quarto mal iluminado, mal arejado, com roupas, remédios e cigarros por todo o cimento escuro do chão. O cheiro fétido do pequeno cômodo ao lado começava a invadir o local.

Saquei a seringa e comecei a escrever:

"Você não estará mais sozinho.

Minhas palavras o acompanharão, não importa o caminho.

Mais presente em sua mente que qualquer pessoa que você ame.

No fim você se lembrará das palavras...

No fim estaremos ligados por sangue."

Sorri, sentindo o sangue correr mais quente. Muito levava àquele momento. A insegurança pela morte se esvaiu confrontada com a certeza do que tinha de ser feito. "Tem de ser feito", a voz dizia.

Olhei em direção ao umbral que me separava de minha vítima. O presente parecia um pouco surreal e confuso no momento, mas era apenas o começo e começos são assim; com o desenrolar da história, tudo iria se esclarecer. Há apenas um desfecho, apenas uma verdade.

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