Toco os últimos acordes da música, e quando a última nota é tocada, e seu som ecoa pelo salão, meu peito contraí, como se meu coração estivesse se acostumando com a ideia de sair da bolha onde entro sempre que toco, e encarar a realidade outra vez, onde a música acabou, e não me resta nada além dos tendões dos meus dedos vibrando.
Coloco uma mecha que se desprendeu no meu coque para trás da orelha, e sinto minhas bochechas ruborizarem ao levar meu olhar até Lauren. Sei que toco bem, que canto bem, mas saber se ela gostou é o que eu mais quero agora. Meu coração já está disparado quando percebo que seus olhos estão fixos em mim, brilhando com o lacrimejo e com sentimentos que não consigo decifrar, e há um rastro molhado escorrendo pela sua bochecha.
Penso em perguntar se ela se ofendeu, dizer que não foi minha intenção, que só achei que a música que mais me toca a tocaria também da mesma forma, porque a vendo de fora como eu, cada estrofe dessa canção parece ter sido criada exatamente para ela. Mas Lauren não me dá tempo de fazer nada, porque sua mão vem para minha bochecha, e ela me beija.
Não é nada apressado como ontem, não tem mãos bobas, e preciso me lembrar que não posso gostar mais desse beijo, que não posso sentir meu peito se aquecer dessa forma com essa paz. Lauren me beija com a calma da música, e seu gosto é tão bom quanto, mas hoje, sinto algo salgado se misturar, invadir nossas bocas e espalhar pelas línguas. Não foi uma lágrima minha.
Quando nos afastamos, eu sinto falta do seu encaixe em mim, mas permanecemos com as testas coladas, e Lauren retira a mão do meu rosto para levar até o seu próprio, onde limpa algo que sei muito bem o que é.
— Meu Deus, estou me sentindo patética. Me desculpe – ela pede, criando distância entre nossos rostos. Suas bochechas estão vermelhas, e seus cílios molhados, mas Lauren já secou as duas únicas lágrimas que escorreram. Ela está mostrando emoções, e embora seja algo ruim, é a coisa mais linda.
Ver humanos sendo humanos é bonito.
— Eu não quis te fazer ter essa reação – me explico, tocando sua coxa. – Eu só achei que era algo que você precisava ouvir, e é minha música favorita.
— Você tocou Vienna pra mim – ela abaixa o olhar para as mãos, e solta um som nasal que se iguala com uma risada, mas é totalmente melancólico. – Billy Joel era o cantor favorito da minha mãe.
Eu pisco, surpresa, sentindo a maior culpa da minha vida cair sobre meus ombros.
— Ai, meu Deus, eu não sabia, mil perdões – peço, beirando o desespero. – De verdade, me desculpa mesmo.
Uma outra lágrima escorre pela sua bochecha, e é limpa tão rápido quanto as outras. Lauren sorri, meio triste, e leva os olhos avermelhados até o meu.
— Ela cantou essa música pra mim uma vez, quando eu perdi um concurso de ballet pela primeira vez, aos sete anos. Fiquei tão frustrada que não queria dançar nunca mais, disse que foi injusto e todas as porcarias que criança diz quando fica com raiva. Chorei, não queria comer, não queria fazer nada. O ballet sempre foi minha vida, e desde que comecei a participar de competições, aquela era minha primeira derrota, então o mundo meio que acabou pra mim. Eu obviamente voltei a competir depois, mas nunca mais ouvi essa música, porque o acidente aconteceu um ano depois e toda vez que eu perdia o primeiro lugar, ainda criança, tinha medo de coloca-la para tocar e começar a odiar algo que ela amava. Mas sua voz... – Lauren se perde no meu rosto, o olhar vagando por cada detalhe. – Como ninguém conhece você?
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Fallen Angel
FanfictionCamila, uma recém-chegada à pequena cidade de New Richland, sem opções, aceita o trabalho de assistente pessoal da mulher conhecida nacionalmente como a bailarina mais prestigiada da atualidade, e a única sobrevivente de um acidente que matou toda s...