39 - todo dia a mesma noite

1.7K 77 30
                                    

🚨⚠️Neste capítulo, tem uma cena muito forte que retrata um
episódio de bulimia, com detalhes descritos, e pode ser um
gatilho. Se você é sensível com esse tipo de assunto indico pular.🚨⚠️

Pov's Malu


Acordo com um gosto de ferrugem na boca e eu sabia muito bem oque isso significava.

Olho para meu lado e vejo Richard dormir tranquilamente, parecendo um anjo.

Viro para o lado do criado-mudo e pego meu celular.

Era 2:49 da madrugada.

Me levanto e vou até o banheiro.

Paro na frente do espelho e me encaro.

Fecho os olhos com força e balanço a cabeça, exclamando 'não, não, não' no fundo da minha cabeça.

O sangue na minha garganta acumula um gosto asqueroso de ferrugem na minha língua e eu tento pensar nos golpes de autodefesa que meu antigo psicólogo me ensinou.

Meus braços soltos parecem não ter utilidade alguma devido à consistência gelatinosa que está os consumindo junto com o pânico, meus episódios começam no começo de 2016, eu tinha 15 anos ainda na época.

Minhas mãos se fecham ao lado dos meus quadris, as palavras do meu passado retumbando como se estivessem num gravador que cospe as palavras duramente, e o ritmo da minha respiração aumenta.

Imploro mentalmente para que isso não volte a acontecer. Não, não de novo.

Não depois de 3 anos, período em que meu cérebro e meu próprio corpo me deram uma folga, um descanso das incontáveis madrugadas passadas no chão do banheiro até que não sobrasse mais nada no meu estômago a não ser a própria sensação dilacerante e amarga.

Mas a sensação ruim vem. E lá no fundo, algo diz que eu devo fazer isso para não ficar com o estômago pesado.

Não posso perder tudo o que lutei para conquistar até aqui, não posso sequer arriscar.

Depois que entro no banheiro e fecho a porta. É como se meu inferno estivesse recomeçando.

Minutos depois, com um gosto ruim na boca e a cabeça turbulenta, limpo o suor acumulado no meu pescoço e subo a mão para meus cabelos, puxando-os para trás. Tento não acumular meus pensamentos bagunçados com as repreensões pelo que acabei de fazer.

A pior coisa é saber que não posso controlar isso, não posso me obrigar a parar de vomitar, não posso dizer "chega, meu corpo não aguenta mais isso", embora minha parte consciente da gravidade da situação grite "pare! Você está se destruindo!". É uma guerra, e eu me sinto derrotada.

Levanto-me e me apoio na pia para escovar os dentes, encarando meu reflexo pálido no espelho.

Tudo de novo.

Eu me sinto culpada toda vez que passo por uma compulsão e, em seguida, um episódio.

Sinto-me quase tão nojento quanto o suor que sempre fica sobre minha pele como uma segunda camada.

As pontas dos meus dedos amareladas, as unhas fracas, os cabelos no ralo do banheiro e minha garganta sangrando só reforçam essa culpa, além de me dizerem que, além de eu estar enfraquecendo meu interior, minha saúde, também estou fazendo o mesmo com a minha aparência.

Por muito tempo eu me convenci que isso não mudaria em nada nos acontecimentos e nos meus sentimentos.

Depois que eu voltei pro Brasil, infelizmente eu perdi pessoas importantes na minha vida.

Destino Reencontrado - Richard Ríos Onde histórias criam vida. Descubra agora