Capítulo 45

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¤Joelma
Acordo num hospital, um pouco tonta, a cabeça gira em 360°, a pior sensação do mundo. Olho para o meu braço e estou tomando soro na veia. Rafael se aproxima de mim, acariciando o meu rosto.¤
-Rafael: Como a senhora está?
-Joelma: Tonta... o que houve?
-Rafael: A senhora desmaiou. Mas, não se preocupa, já estamos aqui no hospital e a médica vai fazer alguns exames na senhora.
-Joelma: Tá bom.
-Médica: Ela acordou? [Entra no quarto]
-Rafael: Sim, ela... ela acordou.
-Médica: Você falou sério quando disse que ela caiu de um penhasco?
-Rafael: Sim, já tem uns três meses isso e...
-Médica: E hoje que você me traz ela ao hospital?
-Rafael: É uma história complicada, doutora.
-Médica: Nada justifica a irresponsabilidade neste caso.
-Rafael: Ela foi sequestrada depois do acidente, é um caso completamente complicado.
-Médica: Ah... nossa, eu sinto muito. Enfim, eu já marquei uma ressonancia magnetica para ela. Será depois de amanhã, pela tarde, ok? Só peço que ela tenha um bom repouso até lá, por favor.
-Rafael: Pode deixar.
-Médica: Vou só passar uma receita para ela... um remédio para ela não sentir essas tonturas.
-Rafael: Obrigado, doutora.
-Médica: Nada. [Sai da sala]
-Joelma: Já vamos pra casa?
-Rafael: Mais tarde, precisamos esperar o soro acabar.
-Joelma: Hum. É a segunda vez que desmaio.
-Rafael: O quê?
-Joelma: Já desmaiei uma vez na casa de Miguel, a Dani disse que era estresse.
-Rafael: A Dani? Que Dani?
-Joelma: A vizinha, ela era minha amiga... bom, eu pensava que era.
-Rafael: Ah, sim... com certeza ela estava acobertando o crime que o amigo dela cometeu.
-Joelma: Sim, com certeza.
-Rafael: Mas, será o que a senhora realmente tem?
-Joelma: Não sei, só espero que não seja nada grave.
-Dani: Bem, aqui está a sua receita... [Entra no quarto] Joelma?
-Rafael: Você?
-Dani: É... eu. [Fica sem jeito]
-Joelma: Oi, Dani. Você trabalha aqui?
-Dani: Ah, sim... eu sou enfermeira aqui, a médica pediu que eu trouxesse sua receita. Aqui está. [Entrega a receita para Rafael]
-Rafael: Obrigado.
-Dani: Jô... como você está?
-Joelma: Depois d'eu ter sigo sequestrada, vivido uma vida mentirosa, ter convivido com pessoas que mentiram pra mim da pior forma possível e ter descoberto toda a verdade alguns meses depois? Quer saber como estou? Ah, tô ótima.
-Dani: Eu... eu sinto muito.
-Joelma: Ah, obrigada. O seu sentimento me ajuda bastante.
-Dani: Por favor, Joelma, nunca foi a minha intenção magoar você, jamais! Eu... eu só quis ajudar um amigo.
-Joelma: É, ajudar um amigo a me enganar.
-Dani: Ok, não vou mais tocar nesse assunto com você, só vim deixar a receita mesmo. Espero que não seja nada grave.
-Joelma: O que você acha que é? A última vez você disse que era estresse... tem um palpite agora?
-Dani: Ainda acho a mesma coisa... mas, o bom agora é que você terá certeza logo.
-Joelma: Hum, isso sim. Mas me diga uma coisa; como está o seu amigo? Já assumiu a sua irmã Dayana?
-Dani: Não, e com certeza não irá, porque ele gosta é de você, e sente a sua falta. Espero que você engula seu orgulho e volte atrás, ok? Porque não é só ele que sente a sua falta, os meninos também sentem... principalmente a Isabel.
¤Joelma
Quando Dani fala isso, o meu coração dispara... que saudade dos meninos... principalmente da minha menina. Antes que eu possa dizer qualquer coisa, minha "amiga" sai da sala.¤
-Rafael: Mãe... tá tudo bem?
-Joelma: Vai ficar... vai sim. [Respira fundo] Tem que ficar.
¤Joelma
Assim que chego em casa, me deito na cama e passo longos minutos pensando nas crianças... eu não consigo deixar pra trás o que vivi.
No dia da ressonancia magnetica, eu acordo cedo e resolvo fazer um bolo. É uma quarta-feira.¤
-Rafael: Bom dia. [Aparece na cozinha] O que está fazendo?
-Joelma: Um bolo, eu adoro fazer bolo.
-Rafael: É, fiquei surpreso quando cheguei naquele dia naquela casa e vi a senhora fazendo bolo.
-Joelma: Pelo visto, eu não cozinhava antes, não é mesmo? [Sorri] Mas, eu aprendi. A Clarita me ensinou e eu adorei aprender.
-Rafael: Ah, a Clarita...
-Joelma: Na verdade, o Miguel também... mas deixa isso pra lá.
-Leonardo: Bom dia. [Entra na cozinha] Bolo?
-Joelma: Sim, eu aprendi a fazer.
-Leonardo: Ah, legal. Certeza que a Joelma de verdade vai adorar saber disso... com certeza. [Dá um leve sorriso]
-Joelma: O que quer dizer com isso?
-Leonardo: Que você engordou alguns quilos, mas pelo visto já sei o motivo. Quando a sua memória voltar, será uma das coisas que você mais vai lamentar.
-Rafael: Pai...
-Joelma: Ué? Acha que estou gorda? E qual é o problema nisso?
-Leonardo: Na verdade, respondendo a primeira pergunta, eu acho muita coisa. Você está acima do peso, com o rosto e o cabelo oleosos... ah, não posso esquecer de mencionar; você tem cheiro de pobre, parece que isso impregnou em você, e nem todos os perfumes franceses poderão resolver esse problema.
-Rafael: Como o senhor ousa falar assim com a mamãe? [Encara Leonardo]
-Joelma: Não se preocupa, Rafa, eu me defendo. [Segura o braço de Rafael] Leonardo, eu lamento que você seja tão amargurado ao ponto de falar isso para mim, mas sinceramente, não me importo. Quando fui para aquela casa, fui bem recebida. O Miguel errou em me enganar, mas ele me ensinou muita coisa, ele e as crianças, elas me chamavam de mãe e...
-Leonardo: Foda-se isso tudo!
¤Joelma
Leonardo bate na minha mão, derrubando toda a massa, que bati, no chão. Levo um susto tão grande, sinto medo... então Rafael se mete na minha frente.¤
-Rafael: O senhor tá louco?
-Leonardo: Não, não estou! Só estou cansado de ter que ouvir o tempo todo a mesma história idiota de uma camponesa ridícula que esqueceu que é rica.
-Rafael: Melhor o senhor dosar as suas palavras, porque senão, eu vou esquecer que sou o seu filho, e tenho certeza que não vai gostar disso.
-Leonardo: Isso é uma ameaça?
-Rafael: Entenda como quiser! Não é porque a mamãe está sem memória que irei deixar o senhor falar de qualquer jeito com ela. O que houve, pai? Só tem voz pra ela agora? Porque eu bem sei o frouxo que é em relação a ela.
-Leonardo: Você é insolente! [Vai pra cima de Rafael]
-Joelma: E vai fazer o quê? Bater no meu filho? [Empurra Leonardo] Melhor tomar cuidado, Leonardo, tô sem memória, mas sei que sou a dona disso tudo, pra eu te mandar embora daqui não custa muito, acredite!
¤Joelma
Leonardo não diz nada, apenas sai da cozinha e sobe a escada. Eu respiro fundo, tentando me acalmar, então abaixo para limpar a sujeira que ele fez.¤
-Rafael: Não precisa, mãe, eu faço isso.
-Joelma: Filho...
-Rafael: Melhor a senhora subir, precisa descansar para o exame de mais tarde. Deixa, eu limpo. Depois deixo o seu café da manhã no quarto.
-Joelma: Tá bom. Obrigada por me defender.
-Rafael: Agradeço pelo mesmo.
¤Rafael
Mamãe beija a minha testa e sai da cozinha, subindo a escada. Dou um leve sorriso, pois apesar da situação que acabamos de passar, é a primeira vez que vejo a minha mãe em defesa de mim como uma leoa.¤
-Rafael: Espero que você não mude, mãe...

*************

¤Miguel
Numa manhã de quarta-feira, acordo cedo e arrumo os meus filhos para irem para a escola. Depois do café da manhã, fico na porta, despachando eles.¤
-Miguel: Vamos, meus amores, senão vão atrasar.
-Clarita: Tá bom, pai, já estamos indo. [Beija o rosto de Miguel] Te amo, tchau.
-Miguel: Tchau, meu amor.
-Enzo: Tchau, pai.
-Miguel: Tchau, Enzo.
-Gabriel: Tchau, papai. Até meio-dia.
-Miguel: Até, Biel.
-Isabel: Papai... [Se aproxima de Miguel]
-Miguel: Oi, meu amor.
-Isabel: A mamãe não vai mais voltar? Sinto falta dela.
¤Miguel
Eu sabia que logo a pergunta seria feita, mas apesar de ter me preparado, não sei lidar com isso, nem sei dar uma boa resposta. Clarita olha para mim e nem mesmo ela sabe me ajudar.¤
-Miguel: Filha... a Joelma... ela...
-Enzo: Ela arrumou outra família, ela não gosta mais da gente, ela não vai mais voltar.
-Clarita: Enzo!
-Enzo: Desculpa, mas é a verdade.
-Isabel: Não, não é. Ela disse uma vez que me amava e que nunca iria me abandonar. Já faz muitos dias que ela se foi... [Faz cinco na mão] assim de dias.
-Miguel: Filha... olha, eu sei que ela disse isso, que nunca iria te abandonar e que já faz tempo que ela se foi... [Pega Isabel no colo] mas, vamos esperar mais um pouquinho, tá bom? Vai dar tudo certo.
-Isabel: E eu faço o que com a saudade?
-Clarita: Guarda ela e quando você ver a mamãe de novo, a abraça bem forte.
-Isabel: Tá bom. [Sorri] Vou buscar a minha bolsa, eu esqueci.
¤Miguel
Coloco Isabel no chão e ela corre para o quarto, então é hora de falar com Enzo.¤
-Miguel: Não fala assim com a sua irmã!
-Enzo: Então a mamãe vai voltar?
-Miguel: Eu não sei, filho... mas a Isabel ainda não se acostumou.
-Gabriel: Ninguém aqui, pai... ninguém! Tudo mudou, e a ausência dela é o que mais machuca.
-Miguel: Eu sei disso, e acreditem, também não estou feliz com a falta dela.
¤Miguel
Mando os meus filhos para a escola e vou para a oficina pela primeira vez depois que saí da cadeira. Porém, por mais que eu tente me concentrar no trabalho, penso em Joelma o tempo todo, e dessa vez é diferente, pois não posso correr pra casa e encontrá-la com a minha roupa, batendo massa de bolo e ouvindo música.... dessa vez, sei que ela não estará lá e respiro fundo para não chorar, tenho que me manter forte.
Estou no meu escritório, resolvendo alguns orçamentos, é quando o meu funcionário bate na porta, dizendo que tem alguém querendo falar comigo.¤
-Miguel: Pode deixar entrar.
-Leonardo: Com licença...  podemos conversar? [Entra no escritório] Como você está, Miguel?
¤Miguel
Me sinto um imbecil quando vejo Leonardo na minha oficina. O que esse traste quer? Porque da última vez, me pediu para fazer um trabalho no carro da esposa dele, porém, dessa vez sei que não é isso.¤
-Miguel: O que você quer aqui?
-Leonardo: Calma, eu só vim conversar.
-Miguel: Acho que não temos nada para conversar.
-Leonardo: Não precisa ser agressivo, pois não vim brigar. Você sabe muito bem que...
-Miguel: Não quero saber de nada! E nem sei. Vá embora da minha oficina!
-Leonardo: Ok, então vamos direto ao ponto, quanto você quer para ir embora daqui? Tipo; se mudar, ir viver em outro lugar... você e seus mil filhos. Hein?! Quanto é que você quer para ficar bem longe da minha esposa?
-Miguel: O quê?

Joelma - Sem Memória Onde histórias criam vida. Descubra agora