Capítulo 70 - Parte 5

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Ricardo

Eu estava com os nervos a flor da pele desde segunda-feira, depois de saber que o primeiro dia de audiências do meu caso seria já na quarta-feira desta semana. Desde ontem, segunda, que eu tinha dormido mal, com medo de que no final das contas, os responsáveis ficassem impunes, mesmo com tio Bené afirmando que de uma forma ou de outra eles teriam a sua punição. Maurício ficou me perguntando a todo momento se eu estava bem, durante todo o trajeto até a faculdade, depois que meu namorado desceu do carro, como sempre, para pegar o ônibus que deixa ele na entrada da faculdade em que ele estuda.

— Cara, você tem certeza que tá legal? – Maurício me questionou ao ver que eu permanecia calado desde que Márcio tinha descido do carro.

— Vou ficar, é só a tensão antes desse "bendito julgamento" amanhã... – Respondi, quase colocando os dedos na boca pra roer as unhas.

— Tô vendo... Já tá quase comendo os dedos... Você tava mais tranquilo quando o teu namorado tava no carro. Só ele consegue te deixar calmo, pelo visto...

— Mas o Márcio tem as coisas dele pra resolver também. Tá chegando perto do período das provas e ele ainda tem o emprego dele e o grupo de capoeira que ele faz parte. Não posso ficar alugando ele com os meus problemas o tempo todo.

— Não sei como ele não fica esgotado. Só as vezes que a Camila e minha mãe me obrigaram a ir com elas pra capoeira eu voltei mais moído que carne moída pra escondidinho...

Tive que rir com o comentário do Maurício. Ele conseguiu desviar o foco do julgamento pra preguiça dele com atividades físicas.

— Por isso que a Camila te chama de "Molengão". – Falei rindo.

— Olha só, você também não é dos amantes de exercício, porque senão tava fazendo capoeira com o Márcio. A Camila me falou que nunca te viu jogando capoeira quando ela tava lá. Só te via na plateia... E olha que desde que ela começou, ela não perdeu um treino sequer, ela e minha mãe...

— É que ver meu namorado jogando capoeira é muito melhor, afinal eu posso ver o meu amor fazendo uma das coisas que ele mais gosta.

— Desculpa de preguiçoso isso aí... Ah, já que passou o baixo-astral, me conta qual foi a surpresa que o Márcio fez pra você, no sábado. Você não falou nada sobre isso ontem quando a gente tava indo pra aula. – Maurício perguntou, também rindo.

Fiz ar de mistério pro Maurício, que ficou rindo e perguntando se eu podia contar ou se era "segredo de alcova". Ri mais ainda e comentei que se Camila escutasse ele falando assim ia dizer que ele tinha que largar o dicionário e pegar os halteres. Contei então que Márcio tinha me levado pra fazer trilha até uma cachoeira, que parecia que tinha sido reservada pra nós, pois apesar do dia ensolarado, não tinha mais ninguém no local.

— Quer dizer que rolou uma "folia no matagal" entre vocês dois na cachoeira? Cara, me conta tudo, incluindo os "detalhes mais picantes"...

— Caraca, tu tá me saindo um fofoqueiro pior que o Andrei... E "folia no matagal"? O que é isso?

— Música ué, vai dizer que você não conhece?

— Eu não!

— Do Eduardo Dusek, cantada pelo Ney Matogrosso... Fez parte até de trilha sonora de novela.

— É? Não sabia... Cara, esqueci que você curte muita MPB... Mas pode deixar que eu... Não vou contar nenhum detalhe picante de folia no matagal nenhuma... – Falei rindo da cara de frustrado que Maurício fez. — Muito cara de pau, você! Onde já se viu...

Anjo CapoeiristaOnde histórias criam vida. Descubra agora