33 Capítulo - O Que Você Faria?

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Avenida Epitácio Pessoa em Ipanema, nº 1110, Rio de Janeiro.

Eu li o endereço, reli e li novamente. Minhas mãos estavam tremulas finalmente eu tinha chegado nesse endereço. As linhas azuis do papel sumiram e eu só conseguia enxergar cada palavra que tinha escrito nele. Amassei o pequeno papel colocando em seguida em meu bolso e respirei profundamente.

Bati palmas em frente do portão feito de alumínio de quase três metros. O muro era tão alto que eu não sabia o que eu iria encontrar atrás dele. Eu só sabia que era o "recanto da criança" uma casa governamental aonde recebe crianças que são abandonadas pelos pais ou que vivem em situações precárias. Não era nada certo que aqui eu teria alguma informação da minha filha, mas o hospital há oito anos tinha um convenio com essas casas que estão espalhadas por todo Rio de Janeiro e talvez minha filha passou por uma dessas casas.

Realmente eu tinha ganho uma fada madrinha a Jessica que se lembrou da existência dessas casas de apoio e ficou eufórica ao me dizer, ela estava tão ansiosa quanto eu para achar a minha Estrela.

Comecei a bater palmas sem parar e ninguém vinha ao meu encontro. Meu coração já estava começando a ficar pequeno e minha garganta estava ficando seca. Aos poucos a velocidade das palmas iam perdendo o seu efeito, mas logo uma força maior chegava ao meu consciente e as palmas retornavam cada vez mais forte.

As pessoas passavam por mim e ficavam me encarando, talvez minha expressão não estivesse uma das melhores, eu estava tensa, assustada e principalmente com medo.

Comecei a gritar chamando por alguém que talvez não estivesse ali, chamei pela minha filha.

— Estrela, Estrela..

Minha voz estava tremula e só os anjos sabiam o tamanho da minha esperança. Como eu desejei e acreditei que minha filha fosse abrir esse portão, me abraçando e sussurrando no meu ouvido dizendo que agora estava tudo bem. Fechei os meus olhos imaginado essa linda cena e um sorriso involuntário se fez em meus lábios.

— Em que posso ajudar? — Uma voz grossa me fez acordar dos meus pensamentos. Um homem fardado e sério estava parado em minha frente e de repente fiquei muda. — Você é? — Novamente ele perguntou.

Depois de longos segundos respirei fundo e falei.

— Eu queria falar com a responsável do recanto.

— Pode entrar. — Ele me deu espaço e passei por ele entrando na casa.

O grande pátio estava cheio de crianças de todas as idades, alguns brincavam entre si, umas sozinhas, outras choravam cortando o meu coração pela metade. Eram tantas crianças e eu me perguntava se a minha filha estava perdida entre elas, eu forçava tentando criar um rostinho para ela, mas apenas o corpo era feito, seu rosto continuava borrado e preto.

— Você deve ser a Carla.. Carla.. Carla

Escutei uma voz de longe chamando pelo o meu nome, fechei meus olhos com força para sair do meu mundo particular e virei-me ficando frente a frente com uma senhora.

— Desculpas, estava entretida. — Sorrir de lado mostrando os meus dentes. — Aqui tem mais crianças do que eu imaginei.

Falei enquanto olhava em volta.

— Infelizmente. — A Senhora me respondeu simpática. — Sou a Lourdes, vamos entrar.

Esperei ela passar por mim e lhe seguir até uma pequena sala com vários armários de metal cheios de papeis, uns amarelados e outros novos. A Lourdes se acomodou e logo em seguida fiz o mesmo.

— Estava esperando por você. — Ela sorriu. — A Jéssica fez questão que eu lhe atendesse, até meu emprego ela colocou em jogo.

Sorrir assustada balançando a minha cabeça negativamente.

— Desculpe-me por ela.

— Já estou costumada com o jeito da Jéssica. — Seu tom de voz foi doce. — Mas ela não me explicou o motivo no qual você está aqui.

— Bom.. — Me mexi incomodada na cadeira. — Sou a Carla Lima, tenho 24 anos, sou psicóloga, mas há anos atrás fui estuprada pelo meu padrasto e consequentemente engravidei, mas assim que minha filha nasceu eu abandonei.

— Acredite, tem mais casos como o seu do que você imagina. — Seu tom de voz mudou. — O que tiver ao meu alcance irei fazer de tudo para lhe ajudar.

Sorrir agradecida.

— A primeira e última vez que vi minha filha foi no hospital, que os pais da Jéssica são os donos e na época que aconteceu tudo isso, o hospital tinha esse convenio com o recanto e casos como o meu era encaminhado pra cá. — Falei rápido quase sem respirar devido a minha ansiosidade, talvez atropelando as palavras.

— Carla, fico muito feliz que mesmo anos depois você está em busca da sua filha. — Ela sorriu. — E se sua filha passou por um dos nossos recantos ela não está sobe a nossa guarda, com certeza uma nova família já adotou. Você já parou pra pensar nisso?

— Não.

Um nó foi se formando na minha garganta e meus olhos arderam. Prendi a minha respiração e tentei focar toda a minha atenção apenas no chão abaixo de mim e no ar quente.

Como eu nunca parei para pensar nisso.

E se a minha filha estivesse com a sua nova família.

O que você faria?


Chora MeninaOnde histórias criam vida. Descubra agora