— Pra aonde você vai em?
Era doloroso vê a Clara colocando as suas roupas em uma bolsa de costas. Eu sempre a protegi coloquei em baixo das minhas assas, lhe dei o meu amor mais puro e sincero, fui mãe quando necessário e agora ela estava prestes a sair de casa, da nossa casa.
— Pensei que você ia continuar fingindo que nada está acontecendo. — Ela falou enquanto dobrava uma das suas blusas que estava espalhadas em cima da cama.
Seus olhos em nenhum momento permaneceram em mim. Ela continuava focada no que fazia como se aquilo fosse o combustível para lhe manter viva.
— Se eu te fiz alguma coisa me diz para que eu possa concertar. — Meu tom de voz estava baixo e tremulo.
— Quem sempre te causou mal foi eu. — Finalmente ela olhou em meus olhos. — É tão nítido isso.
— Shiuuu. Não fala bobagem! — Exclamei.
— Eu tenho que sair daqui. Eu vou morar com o Jotta. — A Clara sorriu. — Não precisa se preocupar comigo. Eu vou ficar bem. Ele vai cuidar de mim, assim como você faz.
Eu tenho que sair daqui.
Essas palavras foram como flechas que atingiram e partiram o meu coração ao meio. Chega ser cômico eu sabia que isso estava prestes a acontecer, mas quando não queremos enxergar o óbvio criamos ilusões para substituir o que de fato queremos enxergar e no final de tudo as flechas é o que nos acorda e somos obrigados a viver a realidade.
Abaixei a minha cabeça e vi uma lágrima minha se chocar com o chão. Rapidamente eu limpei e respirei fundo para não desabar ali mesmo.
— Vocês são tão imaturos, você não está pronta para assumir uma casa. — Balancei a cabeça negativamente.
A Clara me interrompeu.
— Não torna isso mais doloroso. — Ela respirou fundo. — Eu estou saindo para o nosso bem, eu não mereço nem um pingo do seu amor, muito menos essa lágrima que acabou de cair dos seus olhos.
Em movimentos rápidos ela foi colocando tudo que era necessário na sua bolsa e eu continuei ali parada, sem mover absolutamente nada. Meus músculos estavam contraídos, me impedindo de tomar qualquer atitude.
— Não é só difícil pra você, Carla. — Ela continuou. — Você merecia que todos estivessem ao seu lado e principalmente eu, a sua irmã. — Enfatizou. — Mas que louco, você está em busca da sua filha e ela é a minha irmã, desculpas Ca, eu não sei lidar com isso. Lidar com o fato que o MEU pai. — Novamente ela foi enfática. — Literalmente fudeu com a sua vida e sabe de quem é a culpa? MINHA.
A Clara estava nervosa e seu piscar dos olhos sem parar só me provava isso. E quando ela agia assim significava que ela iria explodir a qualquer momento.
— Eu sabia que ele ia fazer isso com você, desde quando você se tornou uma mocinha aos olhos dele. — Seus olhos encheram de lagrimas. — Ninguém enxergava, só eu. Ele te olhava com desejo, com maldade e era tão nítido e vocês eram cegas e continuavam ao redor dele e eu não fiz nada para impedi-lo. Ele me avisou o que aconteceria com você, me avisou o dia, a hora e disse que iria brincar de casinha no seu quarto com você e ele também me chamou, mas eu só me salvei. — Ela passava sua mão em seus cabelos desesperadamente. — Se eu fizesse alguma coisa, a sua vida não era essa, não iria existir passado, não iria existir o medo e não iria existir a sua filha. Eu te causo mal esse tempo todo e sabe como você me retribuiu?
— Clara, para com isso.
— Você me retribuiu com amor, AMOR. — Ela gritou. — Eu não sei lidar com isso. Você me ama tanto, mas eu transformei a sua vida num inferno. Cada atitude minha, tudo o que eu faço, você só me retribuiu com amor. É constrangedor. O seu amor por mim é constrangedor, eu não mereço, mas você continua ali me amando.
Sua voz estava tremula, vê-la assim deixava meu coração em pedaços, ela chorava como se todo seu sofrimento saísse pelas suas lágrimas, como se tudo fosse melhorar, como se tudo isso fosse acabar. As lágrimas vinham com força, como se fosse impossível prendê-las. Ela soluçava. E eu continuava ali imóvel, como se algo mais forte tomasse conta de todos os meus sentidos.
Eu não sentia nenhuma parte do meu corpo, eu forçava para mexer meus pés, mas era uma missão impossível, eu só conseguia sentir meu coração que nesse momento estava a mil por minuto.
Ela era agiu, rápida. Em segundos ela colocou sua mochila nas costas e passou por mim. Eu senti o ar quente do seu corpo e fechei meus olhos com força e prendi toda a minha respiração.
— Me perdoa. Eu só posso sair dessa casa sem esse peso que eu carreguei a minha vida toda.
— Eu.. — Novamente ela me interrompeu.
— Me perdoa pelo tanto que eu não fui, perdão por não ter evitado que nada de ruim te acontecesse. — Aos poucos ela ia se acalmando. — Perdão pelas incontáveis vezes em que não reparei naquilo que o seu silêncio, desesperadamente, tentava me pedir. Perdão por cada palavra miserável que te machucou, perdão por não está ao seu lado no momento que você mais precisa. Perdão por ser sempre tão cruel com você. Perdão por..
— Eu já te perdoei antes de tudo. — Soltei todo ar que estava preso em mim, como um balão murchando.
— Perdão por ter demorado tanto para te pedir perdão e escutar de vez o meu coração.
Virei-me para ela e corri para lhe abraçar. Nosso abraço era tão forte que tinha o poder de extrair qualquer sentimento e ressentimento. Era mágico. Era sincero, cada toque e cada palavra nossa. O calor do nosso abraço fazia com que o nosso sangue borbulhasse por dentro, trazendo sensações e lembranças boas. Como se tivesse o poder de apagar tudo de ruim que aconteceu entre a gente.
O fato é que eu estava segurando o choro esse tempo todo. Pela primeira vez em minha vida eu posso afirmar com toda a certeza eu fui forte. E sabe o que me deixa forte? O amor.
Encostei meu queixo em seu ombro e dei de cara com um espelho e sorrir para mim mesmo. Eu tinha achado a fórmula, agora eu poderia andar e desvendar tudo sozinha.
O amor de irmã que não guarda mágoa, que é possível perdoar qualquer causa.
E amor de mãe que é o mais puro e verdadeiro capaz de atravessar um oceano em busca de viver esse amor.
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Amanhã é um dia especial encerra mais um ciclo, mas a melhor parte é que um novo se inicia. Agradeço a todas vocês que me acompanham no ano de 2015 e que nunca me deixaram só. Desejo a vocês muitas BENÇÃOS e LUZ. Amo vocês.
Esse especial é um presente de fim de ano para vocês. Até ano que vem rs.
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Chora Menina
RomantizmEla uma menina cheia de sonhos que teve sua adolescência interrompida por um abuso sexual. Ele um menino comum. Ela cresceu e se tornou uma mulher infeliz. Ele cresceu e se tornou um homem comum, com pensamento comum. Ela luta dia após dia para esqu...