MORTE - Parte II

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Meu corpo permanece inerte. Consigo vê-lo aberto. Carne exposta e até órgãos. A dor não tem explicação, é simplesmente a maior dor que já senti na vida, e queima. Ele vai de um lado a outro da cama, me observando, satisfeito com sua obra, mas se realmente estou no inferno, ele é apenas meu medo materializado, não o Trevor Bayne, o verdadeiro deve estar lá, na verdadeira Cleveland agora, talvez tenha encontrado Matt, até a Sra. Thompson ou Andy. Talvez esteja fazendo novas vítimas. O que eu fiz da minha vida Deus? Eu nunca acreditei nisso, em vida após a morte, inferno e céu, trevas e luz. Agora estou pagando a penitência devida.

- Aaaaaaahhhhhhhh - Grito com uma intensidade inacreditável ao sentir Trevor perfurar minha carne com seu facão.

Ela penetra o mais fundo que pode e sinto-a romper algum órgão. Ele a puxa de volta e não sei ao certo o que está em sua ponta.

- Que incrível Ana! É a sua vesícula biliar!

Ele aproxima meu órgão de seu rosto e o analisa com atenção com um sorriso enorme estampado em seu rosto. E depois, com um movimento rápido do facão, a descarta no chão.

- Vamos ver o que mais você tem? Sabe eu sempre quis ser médico, conhecer o corpo humano profundamente.

Seu sorriso é macabro e grito novamente - apesar de saber que ninguém irá me salvar - ao sentir o facão me penetrar de novo. Ele o sobe, o sinto na boca do estômago, a dor é tão intensa que não consigo sequer chorar, meu cérebro lateja, queria desmaiar, mas isso não acontece. Ele me olha como se tivesse encontrado algo interessante, sorri e enfia uma mão - a mão boa - sem piedade, e ao puxar um novo órgão me contorço e grito como se não houvesse amanhã.

- Um estômago, Ana, isso é mágico. - Ele admira meu órgão com prazer - Me diga, ainda está com fome Ana?

Ele gargalha e eu grito. Novamente tudo se desmaterializa e estou em uma maca, num hospital. Médicos em volta de mim.

- Oxigênio! - Grita um doutor entre a máscara que protege sua boca.

- Sim doutor. - Diz uma assistente.

Eles colocam um inalador em mim, respiro com dificuldade.

- Mantenham-na acordada, se ela dormir pode entrar em coma a qualquer momento.

- Sim doutor. - Diz a outra assistente.

O que está acontecendo? É uma retrospectiva ou tem haver com a minha tentativa de suicídio? Onde estou? Em quando estou? Sou eu? É um sonho? Eu não morri? 

Reviro os olhos, estou quase apagando. O que está acontecendo comigo? Ainda estou viva? São meus últimos minutos? Ouço os grilhões se arrastando novamente num som distante. Não, ainda faz parte do meu inferno. O médico retira a máscara e é uma versão jovem e limpa de Trevor Bayne, meu pior pesadelo.

- Já te contaram Ana? - Ele caminha pela sala e conforme passa pela frente das enfermeiras, elas se transformam e agora a velha e a garota zumbi estão diante de mim com aparências horrendas. - O inferno é um lugar diferente para cada pessoa, assim como o céu. Você tem medo de se machucar, então o inferno te machuca, você odeia trabalhar, então o inferno te coloca para trabalhar sem descanso. Já você querida Ana, tem medo de uma junção. Teme à elas - Ele aponta para as duas - Teme a mim, teme à escuridão e à solidão. E olha no que você transformou esse lugar - Ele abre os braços contente - Em um parque de diversões para mim! Isso mesmo! Eu posso te cortar e depois te cortar novamente, posso colocá-las para te assombrar, te deixar no escuro, é uma infinidade de opções e eu te agradeço por isso.

Estou presa à maca, todos me observam com atenção. A luz acima do meu rosto brilha de forma intensa iluminando toda a sala e de repente estou de frente para a mesa do doutor, sentada em uma cadeira, apenas aguardando.

- Desculpe a demora. - Ele entra displicentemente.

- Tudo bem. - Digo incerta. - Ahn... O que... Tem para me dizer? - Não sei como agir, estou perdida no tempo e espaço.

- Srta. Ana, sinto muito mas... - Ele faz uma pausa dramática e retira seu óculos de grau - Seus pais, seus pais não resistiram, eles faleceram.

- O quê? - Estou revivendo meu pesadelo, a vida sem eles, meu maior castigo por minha ingratidão.

- Eu, ahn... Sinto muito.

- Eu posso vê-los? Onde eles estão? - Olho em volta procurando-os. Não sei o que estou fazendo.

- Srta. Ana, seus pais faleceram há três anos. Você sofreu um trauma causado por uma forte pancada na cabeça e esteve em coma todo esse tempo. Eu lamento.

- Quer dizer que não poderei sequer enterrar meus pais? - As palavras saem de forma automática.

- Lamento, mas não. Eles já foram sepultados. - Diz em tom condescendente.

Me falta o ar, o chão, o mundo. Sinto apenas um vazio. Não consigo me lembrar do acidente, não consigo me lembrar de como aconteceu, apenas lembro que discutíamos por algo, provavelmente pela minha rebeldia incansável.

- Eu quero vê-los, por favor doutor, onde eles estão sepultados? - Imploro.

- Isso não é da sua conta senhorita! - Ele diz, enquanto sua voz e rosto mudam e se tornam Trevor, ele é meu pior pesadelo.

- Por favor, me deixe em paz. - Digo me levantando da cadeira e indo de costas em direção à porta.

- Paz... - Ele leva o dedo ao queixo refletindo sobre a palavra. - Acho que não será possível. - Ele se levanta da cadeira e eu encosto na porta, tento abri-la, não tem maçaneta.

- Eu imploro, por favor! - As lágrimas rolam.

- Isso! Eu gosto quando você implora - Ele sorri de forma doentia - Suas palavras não têm nenhum poder aqui Ana.

Estou inconsolável, o que eu faço? Jamais me livrarei disso. As lágrimas banham meu rosto e fico aqui, encostada na porta, totalmente indefesa às investidas dele. Ele caminha até mim.

- Acha mesmo que tudo foi simples assim? - Do que ele está falando? - Que a morte dos seus pais foi algo inevitável? - O quê? - Lembre-se Ana, nada é por acaso e com seus queridos pais não foi diferente. - Ele sorri para meu desespero, seu nariz encostado no meu. Me surpreende que você esteja triste, afinal, não era você queria se ver livre deles? - Sim, mas isso foi antes, na minha fase rebelde, eu jamais disse aquilo seriamente. - Você é uma garota morta sua vadia!

Sim, eu sou e agora eu sei disso. Meus pais foram assassinados e ele voltou para me buscar, era tudo um aviso. Eu iria morrer de qualquer forma, apenas adiantei o inevitável. Ele veio me buscar para não deixar pontas soltas. Sou uma garota morta agora.

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