Tenho tantas coisas para decidir. O que fazer da minha vida? Eu só tenho quinze anos, mas tenho que pensar como uma adulta, não sou mais uma criança, preciso ter atitude.
Caminho pelo meu quarto, acho que vou acabar fazendo um buraco no chão. Quase não comi hoje, tanto em que pensar. Me sento na cama e fico olhando pela janela, crianças brincando, pessoas caminhando, vizinhança hipócrita, de merda. Ninguém ajudou o Sr. Luke, ninguém ajudou ninguém, ninguém me ajudou. Nem eu mesma! Fiquei calada, escondi de todos, menos do único amigo de verdade que tenho. Eu realmente preciso de mais amigos como ele. Sou despertada de meus devaneios por uma figura estranha. Um homem. Ele está lá embaixo, no meio da rua, mas parece olhar para mim, parece me ver mesmo de tão longe. Aparenta ter uns quarenta anos, pele branca, cabelos grisalhos, olhos esverdeados, alto e esguio de paletó e chapéu, sinceramente, em que época ele pensa que vive para se vestir assim? Ele se perdeu nos anos cinquenta, eu acho. Começo a rir. E ele continua a me encarar. Me levanto, quero me aproximar da janela e encará-lo, ele não vai me intimidar, ninguém mais vai. Acabo tropeçando no tapete próximo à cama. Merda! E quando olho pela janela, ele não está mais lá. Quem era ele?
*****
Pesquisando... Pesquisando... Pesquisando...
Estou há horas na biblioteca, não vou desistir até encontrar algo. Uma luz. Preciso descobrir tudo, quero descobrir tudo, o Sr. Luke é bom de mais para me contar algo.
Procuro nos computadores, todas as turmas, todos os anos e finalmente, encontro um anuário que me dá algo em que pensar. Puxa, nunca imaginei que o colégio fosse tão velho assim. Fazem muitos anos, acho que o Sr. Luke deve ter mais de setenta anos, uns cem, eu diria.Procuro as fotos e encontro... Sophia. "Sophia Mikles Luke - Líder do Grêmio Estudantil", está escrito. Ela era linda, mas não se parece comigo, negra, pura melanina, olhos claros, cabelos cacheados num afro perfeito e seu sorriso, seu sorriso é hipnotizador. Ela era perfeita.
Sinto uma pontada na boca do estômago, como puderam fazer isso com ela? Como puderam fazer isso comigo?
Olho no relógio de parede, preciso voltar para casa ou meus pais descobrirão que não fui à escola hoje. Eu volto aqui depois, vou procurar mais informações.Saio da biblioteca e esbarro em alguém. É ele! O cara que estava me observando, ele é bem alto e bonito.
- Me desculpe senhorita - Diz levantando o chapéu em reverência.
- Tudo bem, só olhe por onde anda da próxima vez! - Digo ríspida.
- Tudo bem - Ele dá de ombros abrindo a passagem para mim e sigo meu caminho. Que cara estranho!
*****
- Mãe? - Estamos deitadas no sofá, eu com a cabeça apoiada em seu colo enquanto ela faz um carinho em meus cabelos que me dá sono.
- Sim querida?
- Acha que sou uma pessoa má? - Pergunto do nada.
- Claro que não minha filha - Ela responde de forma doce - Por que diz isso?
- Estava conversando com um amigo e ele me disse que quando fazemos algo mau, nossa alma começa a se dividir até restarem apenas trevas.
- Humm... - Ela analisa as palavras - Coisa estranha de se dizer - Dá de ombros - Eu sou adepta à ideia de que, se fazemos algo ruim, cabe à nós nos arrepender-mos e recomeçar-mos. Posso saber quem é esse amigo que lhe disse algo assim?
- O Sr. Luke, ele não apoia atitudes más e sim, que cada um encontra seu destino de uma maneira ou de...
- Desculpe querida, quem? - Ela me interrompe e para o carinho gostoso em minha cabeça.
- Quem o que, mãe? - Me levanto e me coloco sentada ao seu lado, a conversa estava tão boa.
- Quem lhe disse isso? Quem é o seu amigo? - Ela parece desorientada, mais do que o normal.
- O Sr. Luke, mãe. - Digo sutilmente.
- O Sr. Luke? Da lanchonete? Dos Milk Shakes?
- Sim, sim e sim - Respondo impaciente, qual é a dela?
- Tudo bem... - Ela tapa nariz e boca com as mãos, como se estivesse fazendo uma prece e depois as retira voltando a falar - Filha, desde quando está... Ahnn... Conversando com esse senhor?
- Já tem um tempo, é meu único amigo no momento, uma das pessoas mais sábias que conheço. Mãe, o que foi? - Minha paciência está se esgotando.
- Meu amor, por favor, não a quero conversando com esse homem novamente, tudo bem?
- Não - Respondo confusa me levantando do sofá - Você não pode fazer isso. Ele é a única pessoa em quem confio, a única que me escuta sem me julgar, que me dá bons conselhos.
- Que tipo de conselhos Ana? - Ela se levanta e coloca seus olhos na direção dos meus.
- Voltar para a escola, respeitar vocês, não fazer o mal, não condenar a minha alma.
- Filha... - Ela tenta tocar meu rosto e eu me afasto - Vamos esperar seu pai chegar e conversamos, tudo bem?
- O que meu pai tem a ver com isso mãe? O que você está me escondendo?
- Conversamos depois Ana - Diz em tom de advertência e sai da sala me deixando sozinha e aflita.
O que está acontecendo? O que eles estão escondendo de mim? Preciso espairecer.
Saio de casa, desço as escadas da entrada e paro no meio fio da calçada. Olho em várias direções até avistar uma pequena garotinha, a neta da Sra. Thompson, está sentada na grama, sozinha. Me aproximo devagar enquanto ela está arrancando a grama.- Olá, tudo bem?
- Você é a vizinha, não é? - Responde minha pergunta com outra pergunta, sem me olhar, faço que sim com a cabeça e me sento ao seu lado.
- Me chamo Ana e você?
- Andy. - Ela não me olha, continua a arrancar a grama.
- O que está fazendo Andy?
- Uma cova?
- Uma cova? - Espero ter entendido errado - Para quê?
- Meu hamster, ele morreu e vou enterrá-lo aqui.
- Eu sinto muito. - Toco em seu ombro.
- Não sinta, eu o matei. - Diz secamente e retiro a mão de seu ombro.
- E por que fez isso Andy? - Estou perplexa e finalmente tenho seu olhar voltado à mim.
- Porque os maus devem pagar.
Ela diz isso sem sombras de dúvidas em seu olhar, sem remorso ou culpa e lá no fundo, eu concordo com ela, penso da mesma forma. Sorrio gentilmente e me levanto. Sei o que devo fazer. Eles irão pagar. Custe o que custar.
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DARKNESS - Livro I
Mystery / ThrillerNão reclame da sua vida, perto desta, ela parecerá o céu.. Será possível fugir da escuridão? "Todos temos trevas em nós". Copyright Lylah Hartzler Carrillo, 2017 © All rights reserved