Caçador Herdeiro (5) - Fogo Traiçoeiro | COMPLETO

16. Confronto na fábrica velha - Onde está a Sophia?

As paredes tremiam com tamanho barulho que emanava das caixas de som espalhadas pelo cômodo. Shin socava um saco de pancadas ao som de AC/DC, agitado, agressivo, com um sorriso de maldade no rosto. Cíntia, por outro lado, tinha os ouvidos tapados por protetores de algodão, enquanto lixava suas garras afiadas na maior tranquilidade. Não estava transformada completamente, apenas suas unhas enormes estavam sobrepostas. A mulher tinha uma expressão pacata, não se importando com a barulheira que predominava sobre o ambiente, ao contrário de Marcos.

Suando devido às abdominais exaustivas, o místico do rosto queimado tinha dentes trincados enquanto se exercitava, não muito feliz com o rock que bradava sobre o cômodo, que era constituído de algumas mesas, cadeiras e uma televisão de tela plana, além da porta e de algumas janelas de vidro. Os longos cabelos de Marcos estavam encharcados por conta do suor, assim como toda sua camisa regata branca, grudada sobre seus fortes músculos.

Marcos odiava Shin, ao ponto de querer socá-lo até cansar, mas precisava se conter. Por mais que fosse irritante e folgado, Shin era filho de Shaong Kabeiyama, um dos superiores da Eclipse do Caos – o que significava que ele era seu superior também. Marcos só não conseguia entender por que precisava trabalhar justamente com o garoto mais mimado da facção. Um garoto mimado que gostava de provocar a todos, inclusive seus comparsas. Cíntia era a única que parecia não se importar com tais atitudes infantis.

Marcos sentia inveja dela, pois não conseguia manter a mesma tranquilidade por muito tempo, embora soubesse o quanto a mística era traiçoeira. Marcos presumiu que Cíntia já era acostumada, por ser um dos membros mais antigos da Eclipse.

Decidiu cessar os pensamentos e continuar as abdominais. Fazia sobre o chão frio do pátio. Odiava o conforto que a Eclipse fornecia. Ex soldado do exército, sofreu com a vivência na mata atlântica e descobriu que é preciso estar preparado para qualquer coisa, uma vez que nada é previsível. Para Marcos, as pessoas que são mal-acostumadas são as primeiras a ceder em momentos críticos, o que significa que, para ser um sobrevivente, é necessário ser flexível a qualquer situação.

Então parou, após ouvir algo estranho além da música alta das caixas de som. Shin e Cíntia, aparentemente, não perceberam, mas Marcos ficou em alerta.

- Vocês ouviram isso? – gritou através da pauleira, não obtendo tanto sucesso. – VOCÊS OUVIRAM ISSO? – gritou mais forte.

Shin o olhou com indiferença, sem parar de golpear o saco de pancadas.

Marcos se levantou e bufou, irritado. Cíntia observou sua caminhada até o aparelho de som próximo à televisão, Marcos com uma feição de ira e com os punhos flamejando. No momento em que ele espatifou o aparelho numa explosão e o som cessou, mudando o ambiente drasticamente para um silêncio absoluto, Shin gritou:

- O que você está fazendo, otário?!

Cíntia tirou os protetores de algodão e apurou os ouvidos. Marcos fez o mesmo, deixando um Shin ainda mais irritado.

- O que há com vocês? Não estou ouvindo nada!

- Exatamente – Cíntia disse baixo. – Os vampiros estão em silêncio. Eles nunca ficam em silêncio.

Finalmente, Shin entendeu, mas já era tarde.

Num baque retumbante, a porta foi ao chão e três pessoas adentraram repentinamente na sala, uma garota jogando as mãos contra o solo e gritando:

- Espelho cristalino!

E placas de vidro subiram do chão até o teto num quadrado perfeito, envolvendo ambos os trios em uma prisão transparente.