39. Ele voltou

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O teto descia de maneira lenta, o que não deixava as coisas mais tranquilas. As únicas saídas possíveis estavam bloqueadas. Billy, meu cão ultradimensional, não poderia nos ajudar com seu poder. E, considerando que o concreto estava a menos de dois metros da nossa cabeça, eu poderia resumir tudo numa pequena frase: estávamos ferrados.

Então parou.

— Parou? — estranhou Natsuno, olhando para mim como se eu soubesse de tudo.

— Parece que sim — falei olhando incrédulo para cima. O teto agora começava a subir.

— Que merda foi essa? — quis saber Yago, tão confuso quanto o restante de nós. Foi Raylla quem respondeu:

— Acho que foi ela. — Olhamos para onde a garota apontava. Kelan estava postada diante da porta aberta do fim do corredor.

— Kelan! — Yago correu para abraçá-la, mas parou quando percebeu que Kelan estava estranha. Muito estranha.

Ela tinha olhos vazios, de alguém que sequer sabe onde está. Assim como todos, Kelan não tinha uma aparência muito boa. Cabelos desgrenhados, pele oleosa, olhos fundos, roupa esfarrapada. A questão era que a garota parecia ter acabado de sair de um túnel de horror, daqueles que têm em quase todos os parques temáticos.

— Você está horrível — disse Natsuno, que ficou surpreso ao receber apenas silêncio como resposta.

— O que houve com você? — perguntou Yago, que ainda a analisava. — E onde estão os outros?

Uma lágrima desceu pelo rosto da garota. Eu só a havia visto chorando uma vez: quando Jake foi embora de Honorário. Portanto, muita preocupação invadiu o meu peito.

Kelan deu meia volta e entrou no cômodo pelo qual viera. Yago me lançou um olhar significativo e a seguiu. Natsuno, Raylla e eu fizemos o mesmo, mais preocupados com a forma de agir da garota do que propriamente aliviados pela armadilha mortal cancelada.

Imergimos numa sala de jantar clássica de mansões de gente rica, com uma mesa retangular no centro repleta de cadeiras e com um lustre acima cuja luz preenchia todo o aposento.

— Desde quando vampiros precisam de mesa pra comer? — ironizou Natsuno, enquanto eu observava Kelan se sentando numa cadeira que já estava fora do lugar, como se ela já estivesse ali antes. Yago sentou-se ao seu lado, sem tirar os olhos da prima, e Raylla se acomodou do outro lado para abraçar a amiga.

Observei melhor o ambiente. Era curioso como o castelo de um vampiro assassino poderia ser tão bem organizado. Primeiro a vasta biblioteca repleta de livros e suja apenas pelos destroços do teto caído, resultado do ataque de Orgulho. Depois, uma sala de jantar impecável, com pratos lustrosos, taças de vidro e talheres ajeitados sobre a mesa. Uma lareira de tijolos crepitava numa das pontas do cômodo, enquanto na outra ponta havia um conjunto de portas que eu presumia levar ao saguão principal do castelo.

Voltei a mim mesmo quando mais pancadas puderam ser ouvidas nos andares superiores. Decidi que não poderíamos perder mais tempo. Perguntei:

— Kelan, o que houve com você? Aliás, com todos após termos nos separado. Vocês fugiram do Orgulho, certo?

Kelan anuiu lentamente com a cabeça, trêmula. Ela fixou seus olhos cor-de-mel em mim e disse:

— Ele voltou.

Eu não sabia a quem ela se referia, mas senti um calafrio pelo corpo todo pelo tom sério de voz. Kelan não era de sentir medo tão fácil.

— Maninho, ela não tá bem — sussurrou Natsuno.

Caçador Herdeiro (5) - Fogo Traiçoeiro | COMPLETOOnde histórias criam vida. Descubra agora