Capítulo IV

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        A pequena bala me atingiu, metade para fora.
 — Esse poder requer anos de prática e poucas Almas o possuem. — falei, tirando o objeto — O poder de transformar o seu sangue em um escudo.

        A ferida fechou-se imediatamente. Observei suas reações e ri.
 — Isso é... incrível. — espantou-se Evie — Como podem pensar em destruir as Almas? Vocês são incríveis, um pouco de luz nesse mundo sombrio.
 — Pessoas como vocês são o que nos mantém vivas para lutar. Muito bem, vamos continuar.

        Eu estava prestes a continuar falando, quando o sinal do almoço tocou. Bufei.
 — Vejo vocês daqui a duas horas.

        Almocei rapidamente.
Adeus, Nix. A voz dela martelava em minha cabeça, coisa que não acontecia há tempos. Seja quem eu nunca consegui ser.

        Eu não queria que os outros me vissem chorando. Uma general chorando? Vamos todos morrer. Retirei-me do refeitório e fui caminhar.

        As árvores do bosque eram tão altas, pareciam querer tocar o céu. Subir em árvores nunca foi difícil para mim. Quando se pode voar, seus limites deixam de ser o chão.

        Lá de cima, as pessoas caminhando pareciam formigas, seres insignificantes. Será que a Mãe Terra nos enxergava assim? Uma raça em extinção, que não faria a menor diferença se desaparecesse?

        Sentei em um de seus galhos, olhando para o céu. Sem nenhuma nuvem, o sol brilhava em meu rosto, mas não me aquecia. Suspirei e deixei as lágrimas caírem. Seja quem eu nunca consegui ser.

 — Como eu vou conseguir ser quem você não conseguiu, Lune?

        Naquela altura, o vento era tão gelado que não me deixava pensar direito, então mergulhei em lembranças.

 — Duvido você me alcançar! — grita Lune, com seus 10 anos, correndo pelo campo.
 — Não é justo! — grito, rindo — Você tem as pernas mais longas!

        Crianças vêem o mundo com uma pureza e uma inocência inexplicáveis.
 — Tá bom! — cede ela — Vem, vamos tocar as estrelas.

        Lune segura em minha mão e saímos voando. Conforme o chão vai ficando mais longe, mais segura eu me sinto ao lado dela. Sempre ao lado dela.

        Não conseguimos tocar as estrelas, mas é alto o bastante para vê-las maiores.
 — Qual o seu maior sonho? — pergunto.
 — Meu maior sonho? Hum... — ela bate no queixo com o dedo, pensando — Comer todo o chocolate do mundo!
 — Não, sua boba! — gargalho — Seu sonho de verdade!
 — Não sei. Tenho a eternidade para pensar nisso. E o seu?
 — Acho que... Ir para outros mundos.

        Lune chega mais perto e cochicha em meu ouvido, rindo:
 — Não conte isso para a Mãe Terra, ela vai ficar brava.
        Gargalho novamente e ela completa:
 — Amo você, Nix.
 — Também amo você, Lune.

        Depois que vi minha irmã mais velha morrer, tudo ficou mais difícil de aguentar.

A Última AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora