Capítulo XXXIV

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        Seus olhos castanhos hipnotizantes. São eles que  me fazem acordar.

        Evie!, tento gritar e o sol refletido na água chama minha atenção para a superfície. Quando o ar atinge meus pulmões, não paro nem por um segundo. Os músculos de meu corpo reclamam e doem a cada braçada que dou para chegar em terra firme, mas escuto um barulho alto e olho para o céu. Uma metralhadora atingiu o tanque de combustível de um K-60 e o mesmo agora cai pegando fogo. Quando me toco que o avião está caindo em minha direção, mergulho e tento fazer a água me levar para longe o mais rápido possível. 

        Não dá tempo. 

        O K-60 explode e se quebra em muitos pedaços quando atinge o mar e um pedaço passa pela minha barriga. Seria só mais um corte se não fosse tão fundo. 

        Preciso me curar, preciso me curar. Me encolho na tentativa fadada de fechar o ferimento, mas o ar começa a ir embora novamente. Tudo está turvo, mas consigo sentir mãos em meus ombros me puxando para cima. 

        Consigo respirar? O que está acontecendo? Tusso e ponho a mão em minha barriga. 

 — Não encoste.— diz. 

        Abro os olhos e vejo Aurora. Suas íris não estão mais da cor do crepúsculo. Estão da cor do sangue dos soldados. Ela põe as mãos em minha barriga e a luz dourada invade o ar. 

 — Olhe para mim, Nix. Você sempre encontra forças para se curar, você precisa. Não pode definhar se pode se curar. 

        Assinto e a abraço.

 — A Eura se foi, Aurora... Ela e todas as outras.

 — Eu sei, menina. Eu sei. Hora de se levantar e seguir em frente.



        Quando tudo começou, tudo que eu sentia pela Evie era atração e a atração se tornou paixão. Mas agora, já que me vejo correndo entre os soldados procurando a dona dos cabelos azuis, posso dizer que a paixão se tornou algo diferente. 

        Luar está correndo ao meu lado e não sei mais dizer se ela tem algum plano em mente. Não, Luar não é dos planos. Ela funciona no improviso. Foi assim que chegou até mim naquele dia. 

        Dez quilômetros. Dez quilômetros. O número de Solines aumenta a cada metro que nos aproximamos da torre.

        Não aguento mais ver fogo. O cheiro da fumaça faz minha cabeça doer, mas o que não faz? A luz das chamas ofusca o brilho das estrelas, então só é possível ver a lua. A lua cor de sangue. Aurora olha para o céu e vê a posição do astro.

 — Espere. Hora de fazer o sol nascer. 

 — Enlouqueceu? — grito— Estamos quase chegando na torre!

 —  Você não entende, Nix. A noite não deve ficar do que o seu tempo no céu. A noite enlouquece, você sabe disso. Lembra da Alma do Tempo que tentou prender a escuridão mais tempo do que o permitido? 

 — Deixe isso com outra Alma do Dia! Falta tão pouco! 

 — Será que você não percebe ou se nega ver a verdade? Fomos massacradas. Nós perdemos, Nix. Eu não sei se existe alguma Alma do Dia se pé. Não sei se foram mortas ou reencarnadas, eu não sei. Então me dê cobertura ou vou fazer isso sem a sua ajuda.

        Bufo.

 — Ande logo, Aurora.  

        Ela sorri e agradece com a cabeça. Quando se ajoelha e estende as mãos, um pingo de luz surge no horizonte. 

        O sol não surge por completo. Fica com um pedacinho atrás da montanha como se estivesse com medo de iluminar a guerra. 

        Quando uma bala atinge o coração da minha Alma do Dia, seus olhos voltam a ter a cor do crepúsculo, um crepúsculo de um dia de paz.

        Aurora fez o sol nascer pela última vez.

A Última AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora