Capítulo XXVI

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     Rajadas de fogo queimam soldados aos montes e gelo os congelam. Sons os ensurdecem, ventos os jogam aos ares e a escuridão os cega.
     Desse lado do campo, a maresia nos atinge e Almas em forma de animais são mais comuns. Minhas mãos doem por causa do arco e flecha e o número de Almas mortas aumenta a cada momento.
     Atiro em um Soline.
     Você é mais humana.
– Não, não sou.
     Eu sou um monstro, um ser que mata e não sente dor. Um ser místico assassino.
– Bomba! – grita Melody e uma bomba cai em nossa direção.
     Um escudo negro surge ao céu, junto à um claro e um de gelo, além de um feito de ferro. Eu, Aurora, Skadi e Twila. Quatro Almas, quatro poderes. Quatro chances a mais de sobrevivência.
     Minhas pernas doem quando a bomba nos atinge.
   
     Estou esmagada, sei disso e tenho medo de ver o estrago. Talvez eu não seja forte o suficiente. Quase não consigo me mexer, só ouço o barulho das espadas. O pedaço de metal acima de mim esfria; o que vai acontecer?
     Sinto uma pancada e o pedaço se parte em dois, congelado. O ar invade meus pulmões.
– Levanta! – grita Twila – Estão caindo mais!
     Corro atrás delas, os explosivos caindo cada vez mais perto. Eu entraria com elas em um abrigo, mas uma Alma do Gelo me pega antes.

     Neve e gelo cobrem meu campo de visão. O céu azul e o sol, que antes eram minhas âncoras, agora estão completamente apagados. Cada respiração é uma faca cortando meus pulmões, tudo é frio demais. Crio bolas de fogo. Leves e ferventes, elas derretem o pouco de gelo que começou a se formar em meus dedos. Não sinto meus pés.
     Gelo sobre pelas minhas pernas, adormecendo cada pedaço. As bolas de fogo ficam mais fortes.
     Respiração pesada, tudo está lento e o fogo se extingue. Fecho os olhos, só quero dormir.
     Só quero dormir.

     Você pode ser a escuridão que vai guiar a luz.
     Quando abro os olhos, sou gelo puro. Não consigo respirar. Fecho os olhos com força e deles escorrem pura escuridão. Preta, brilhante, ardente. Chamas feitas de sombra criam vida em minhas mãos derretendo o gelo e me permitindo respirar.
     Agora o frio me atinge por dentro. Sangue e órgãos congelados, a batalha entre o fogo e o gelo dentro de meu próprio corpo.
     Estrelas. Lembre-se da luz das estrelas. Quando meu peito brilha, a Alma do Gelo finalmente para. Vejo novamente o céu azul e estendo uma mão para a inimiga. Seus olhos, antes prateados, agora são totalmente negros. Cega, completamente cega.
     Aponto a arma e aperto o gatilho. Mais uma aura dançando pelos ares.
     Onde estão ao outras?
     Twila e Lissa estão viradas uma de costas para a outra com Almas Solines em volta.
     Almas contra Almas.
     O ódio pelos Solines me consome por dentro e meus raios, antes roxos, agora são pretos assim como meus olhos. Eles atravessam o chão pegando de surpresa duas Almas inimigas, Vento e Natureza.
– Já foram duas, faltam três.
     Som, Noite e Vida.
     A Alma da Vida levanta as mãos e cadáveres ficam de pé. Não estão mortos, mas não estão vivos. Eles vão até Lissa.
     Olho para a Alma da Noite. As lágrimas negras escorrem sem parar, deixando manchas em suas bochechas. Seus olhos. Conheço esses olhos.
– Étoil.
     A estrela, a luz, os olhos brilhantes como o céu.
– Me desculpe.
     Minhas mãos ficam totalmente pretas e brilhantes; a noite em meu corpo. A escuridão se espalha, já não tenho mais controle sobre nada. Sou uma marionete em suas mãos, uma arma. Entro em desespero; o que vou fazer?
     Twila arranca a cabeça de Étoil em um movimento brusco, me libertando. Caio apoiando as mãos no chão e a aura negra some.
     A Alma da Vida inimiga já se foi e Lissa agora segura o pescoço da Alma do Som por trás. Ela começa a gritar e põe as mãos nos ouvidos. Corro até elas e atiro na cabeça da Soline.
     Distinguo um grito entre milhares.
– Twila!
     Uma espada está enfiada em seu peito e seus grandes olhos verdes, da cor das folhas no verão, perdem a cor. Dou três tiros no peito da Soline e Lissa segura o corpo de Twila enquanto cai.
     A Alma dos Animais grita, um grito de dor agonizante que me quebra por dentro. Ajoelho ao seu lado, um escudo negro crescendo ao nosso redor. Lissa chora, suas lágrimas caindo no rosto da que se desintegra.
     Twila está morta.

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