Levo três tiros nas costas.
Escuto o barulho, mas não sinto dor nem sangro. Estou alterada, poucas coisas ainda me importam, estou caminhando em direção ao meio da ponte entre a sanidade e a loucura.
Os gritos de um batalhão inteiro sendo massacrado martelam em meus ouvidos, meus olhos quase nem piscam. Meu batalhão. Os jovens que eu treinei. Mortos, dizimados, destruídos.
Correr é um movimento automático, armar flechas já é um costume. Apertar o gatilho é uma coisa simples. Luto contra mim mesma, minha vontade é cair e deixar tudo rolar sem mim.
Arranco as três balas, o escudo formado pelo meu sangue me salva mais uma vez. Tremo a todo instante.
Por que a esperança cisma em permanecer em mim? Talvez eu seja mais humana do que pensei.
Ou talvez não.
— Quantos quilômetros até a torre? — pergunta Selene, assim que entramos em uma base. Não me importa mais o número.
— Sessenta e dois.— respondo.
— Podíamos voar até lá.— propôs Lissa.
— Seríamos abatidas.— corto, ríspida.
— Foi só um palpite.
Esfrego os olhos.
— Desculpe, é só... Eu sinto como se estivesse enlouquecendo. Estou com medo, não paro de tremer. É normal se acostumar com o barulho das balas? As noites de silêncio que tínhamos antes parecem outra vida, um sonho. Só que batemos a cabeça e acordamos.— faço uma pausa— E-eu estou caindo na escuridão. Tenho medo de não conseguir voltar.
Melody põe sua mão em cima da minha.
— Você sente como se estivesse enlouquecendo.— repete— Nix, eu estou louca. Cada dia estou mais perto da ilha da insanidade e convivo com isso há mais de três mil anos. Sei que pode parecer o fim do mundo,— ela põe a mão em meu rosto— mas estamos fadadas à eternidade. Ter a sanidade rachada é comum, seus poderes de cura resolvem parte disso com o tempo. —Melody se vira para a frente—Se acostume com a ideia de viver com a perturbação te rondando.
Bebo mais um gole de café.
Sessenta e dois quilômetros. Meus pés doem a cada passo que dou pela floresta, o atalho mais seguro. Pode ser que não seja, não existe nada muito seguro nos dias atuais.
— Onde está Evie?— pergunto a mim mesma.
— Evie?— questiona Selene— A de cabelo azul?
Concordo.
— Não a vejo desde o início da batalha...
— Ah.— ela põe a mão em meu ombro, depois de um minuto pensando— Já entendi.
Olho para o chão.
Onde está a minha Evie?
— Ela estava pronta para o campo de batalha, Nix. Não acho que tenha caído.
— Tento me convencer disso o tempo todo.
— Mesmo se alguma coisa acontecer com ela, — a Alma da Vida faz uma pausa— você vai ficar bem. Você sempre fica.
A eternidade. A eternidade cura tudo. Curou a Catalina, curou a Violeta e ainda está curando a Lune.
— A vida vem embalada na morte. A cura acompanha a eternidade.
Um zunido, uma flecha, uma parada. Uma dor. Um último suspiro.
Uma morte.
— Selene!
Um corpo jogado ao chão.
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Última Alma
Ficción GeneralA Mãe Terra as criou. As Almas. Seres criados à sua ideia de divinos, seres criados para proteger os humanos. Seres místicos, poderosos e... Perfeitos. Nix é a exceção. Mesmo criadas para proteger os humanos, muitos não as enxergavam como prote...