Capítulo XIV

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 — Selene, me ajude. — falei, após me afastar de Luar — Pode ficar com meu grupo, apenas por hoje? Eu preciso... ajudá-la.
        A Alma da Vida sorriu para mim.
 — Claro. Cuide da sua irmã.
        Dito isso, ela andou até o meu galpão, chamou meu grupo e pediu para que a seguissem. Conforme os alunos iam saindo, Evie olhou para mim. Você está bem?, ela gesticulou. Fiz um sinal de positivo com a mão, com certa hesitação. A garota continuou caminhando. Virei-me para Luar.
 — Consegue caminhar?
 — Claro que consigo.
 — Muito bem... — estendi a mão e ela se levantou.
 — Obrigada.
        A gentileza deve ter estado fora de sua visão por muito tempo.
 — Venha. Vou levá-la para a enfermaria.


        Luar sentou-se na maca.
 — Como se sente?
 — Como me sinto?
        Peguei uma agulha para tirar seu sangue enquanto ela pensava.
 — Me sinto... — furei seu braço — sinto como se já estivesse morta.
        A encarei, a tristeza sendo bordada em meu rosto pálido. Como não dissemos nada, virei-me com o frasco.
 — Não vai adiantar. Acredite, eu já tentei. A radiação está entranhada em minhas veias, grudada nos meus órgãos.
        A observei novamente, de costas para a mesa.
 — Ela não me deixa viver, não deixa usar meus poderes como bem entendo.
 — Luar, eu...
 — O chumbo não me deixa pensar, me deixa muito confusa. Foi difícil pensar na hipótese de fugir. O mercúrio... Eu não entendo o que ele faz, eu só o sinto. Pesado, fervente, queimando meus órgãos, minhas memórias e minha liberdade.
        Queimando minha liberdade.
        Eu não consegui falar nada. Eu não era capaz de ter alguma reação. Estava tão destruída por dentro que tudo que pensei em dizer não tomou forma. Eram apenas sentimentos impossíveis de se tornarem palavras.
 — Sou uma prisioneira em meu próprio corpo.
        No mais profundo silêncio, eu só sentia as lágrimas escorrendo pelas minhas bochechas, esperanças escorrendo pelo ralo.
 — Não chore por uma dor que você não sente.
        Arregalei os olhos, perplexa.
 — O quê...?
 — Não derrame lágrimas por uma dor que não é sua.
 — Como você pode dizer isso? Acha que eu não fico triste com o que você passa?
 — Você não me conhece para ficar triste por mim.
 — Conheço o que fazem conosco. Mas eu não fazia ideia de que era assim tão... desesperador.
        Luar se levantou, caminhou até mim e disse, séria, a poucos centímetros do meu rosto.
 — Escuta. Você não chora por uma dor que não é sua. Você não pode chorar.
        Franzi o cenho, ainda assustada. Ela colocou as mãos em meu rosto e secou as lágrimas, com a mesma seriedade de antes.
 — Você é uma Alma. Você não pode sentir.
        Com isso, ela me empurrou para fora do quarto e chamou uma enfermeira.

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