· Capítulo 20 ·

6.7K 597 57
                                    

O problema da paciência é que, uma vez que ela escorre e não resta mas nem uma gota para respingar, não se consegue nunca absorver o líquido de volta a tempo, por mais forte que se possa ser.

Eu estava tão esgotada desse precioso líquido, que apenas passei pelo buraco e chequei o quarto, percebendo com alívio que o Alfa não estava alí.

A torneira estava aberta e o único barulho além do vento era a água (eu havia me esquecido de fechar a torneira depois de perceber que o registro não mais funcionava).

Depois de conter a água, voltei para a porta. O Sentinela permanecia alí, as mãos no bolso. O que eu faria? Nem se quer podia empurrar o guarda-roupas, pois ele havia sumido e todas as roupas estavam jogadas na cama.

Então eu suspirei com uma derrota fingida e disse: — preciso ir no banheiro.

Herobrine deu de ombros, saindo da frente. Quando passei ele me olhou e disse, sério: — lembre-se de traze-lo de volta.

Também dei de ombros e arrastei os pés até a porta no final do corredor, insensível a sua tentativa medíocre de piada.  Uma vez dentro, quase não acreditei em ver uma chave alí. Até a porta do banheiro possuía uma chave.

Tranquei a porta e escorreguei no canto da parede, me obrigando a dormir e ser abraçada pela inconsciência do quanto aquilo acabaria me ridicularizando mais tarde.

Quando acordei Gustaf estava de cócoras em minha frente, segurando o meu cabelo acima da cabeça. Eu estava tão cansada que nem tive forças para reagir.

Sem paciência, eu estava vazia, e toda a minha reação era substituída pela mais profunda agonia.

— O que eu faço com você? — sussurrou.

Fechei meu olhos.

— Me mate.

— Pare de falar asneiras — ele disse, me levantando e pondo em seus braços.

Quando entramos no quarto e ele me pôs encima da cama, tão cuidadoso quanto uma Dona de Casa com suas porcelanas, me senti infeliz e medíocre.

Ainda estava de noite.

O peso do corpo fez o colchão afundar, e o peso do lençol sobre nós, encobrindo o braço de Gustaf que me puxava e abraçava, me deixou com uma vontade irritante de chorar.

Eu nada fiz, e com os olhos bem apertados, me permitir por um breve momento fingir que nada daquilo era real.

— Boa noite — ele disse, com os lábios em meu ouvido.

Eu nem sabia exatamente o motivo, mas tive que espremer meus lábios tremidos para me manter calada. Talvez eu fosse mesmo estúpida, e além disso, dramática.

Com os raios de sol a inconsciência me jogou com agressividade na realidade, e por mais que fosse doce a ilusão de que tudo não passara de um sonho, tive que me conformar com o azedume do que era real.

Gustaf não estava mais no quarto, e a porta/janela estava aberta. Era bom não ter que encara-lo, o que colaborava ainda mais com a fantasia de que nada havia acontecido.

Apenas uma recordação débil inventada por minha própria cabeça inconsciente e confusa.

Tomei um banho e me obriguei a chamar a humana, que me ajudou com simpatia a ajustar o vestido mesmo que eu estivesse mais antipática que o casual.

— Está tudo bem? — seus esforço para me tratar com casualidade era óbvio. Nem mesmo queria estar alí.

Não tinha motivos além da obrigação.

idOnde histórias criam vida. Descubra agora