Epílogo

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Ela acreditava em anjo e, porque acreditava, eles existiam. Clarice Lispector


Nada.

Ele não sentia absolutamente nada. Era como se algo... Algo doloroso tivesse arrancado o coração dele, pois ele estava oco. As pessoas falavam em volta dele, ele sabia que falavam, mas não conseguia distinguir nada. Tudo parecia abafado e as vozes eram apenas um zumbido silencioso e infame. As pessoas pareciam se mover devagar, com um certo delay, eu não sei dizer ao certo. Mas ele estava em transe.

As imagens do acidente passando pela sua cabeça. Ele estava ajoelhado no mesmo lugar que cinco minutos atrás, olhando pra TV. Mas porra, parecia que tinham passado anos. O rosto masculino e bonito estava branco e petrificado. Como se ele realmente estivesse morto... Um cadáver. Sem coração e morto.

Havia com certeza perdido parte dos seus sentidos, pois não ouvia, não conseguia falar ou sentir cheiro de nada. Seu ser parecia ter sido atacado por um fantasma. Tudo era escuro e cruel. Algo no seu intimo lhe dizia: "eu avisei, panaca." Por que, convenhamos, desde que as coisas começaram a dar certo pra eles, Alfonso sentia que um sino tocava na sua cabeça, avisando que o karma não era tão fácil assim de quebrar.

Então de repente, do nada, as vozes voltaram. O barulho retornou com força brutal e Ben Daniels estava na frente dele, também ajoelhado, segurando seus ombros e sacudindo-os com força.

Ben: ALFONSO! – ele dizia, gritando, desesperado... Os olhos dele... Estavam vermelhos ― ALFONSO!!!

Alfonso finalmente direcionou o olhar ao amigo, ao irmão que tanto lhe ajudou... Mas não conseguiu dizer nada.

Ben: Precisamos fazer alguma coisa. – rosnou com o celular na mão. Cara sim, os olhos de Ben Daniels estavam vermelhos, ele estava chorando???

Alfonso: A-aq-eu-le... – pelo amor de Deus, ele não conseguia falar ― Era o avião que ela es-ta-va? – perguntou, a voz saindo entrecortada e baixa, baixa demais. Os olhos azuis opacos de Daniels oscilaram. Alfonso viu a pupila mudar drasticamente de opaca pra cinza. Coagulado. Cheio de água. Lágrimas.

Ben: Precisamos...

Alfonso: ME RESPONDE. – ele grasnou, pegando o amigo pelo colarinho. A bipolaridade o acordando finalmente e o tornando sedento.

Ben: Sim. – respondeu, com a voz triste – Ela estava lá e você sabe.

Alfonso fitou a TV novamente e depois fitou o chão. O que foi... Quando foi que... O celular de Daniels tocou, era Maite. Eles começaram a falar em espanhol freneticamente, Alfonso não se importou com o rumo da conversa.

Anahí.

Anahí.

Anahí.

O nome ecoava na cabeça dele, o nome era como uma faca cruel rasgando todas as células dele. Porra, Anahí. Seu amor, sua vida.

Alfonso: Eu vou até lá – disse, se levantando. Finalmente. O rosto branco feito papel, mas o olhar em brasas, em fúria. As pessoas olhavam-no com pesar. Ele não queria pena. Ele iria salvá-la. Como sempre. ― Carona para o aeroporto?? Alguém?

John Cho: Eu te levo. – o cara meio asiático disse, tocando o ombro de Alfonso. Sem saber se era o certo, mas pela cara de Alfonso alguém iria morrer se ele não fizesse isto.

Ben: Alfonso... – começou colocando o celular no bolso. O rosto de Ben parecia completamente contorcido. Como se sentisse dor, de verdade. Dor por ela. Por ele. Por ter falhado. – Preciso correr. A bolsa da Maite estourou.

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