A droga

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Os cabelos dele eram grossos, lisos e longos, em um tom de loiro dourado e com uma franja grande e mal cortada descendo no lado esquerdo de seu rosto, cobrindo o seu olho defeituoso, que já não mais via. Seu globo ocular esquerdo era vermelho, com as veias saltadas. A íris era coberta por uma camada gelatinosa, aparentando catarata, com um corte transversal já cicatrizado. Já seu outro olho, o direito, estava intacto, num azul profundo como as mais belas águas cristalinas, quase revelando sua alma. Seu rosto fino possuía um queixo mais proeminente, deixando-o mais másculo, seu nariz muito bem-feito era empinado e afilado e a sua boca rosada e fina o deixava ainda mais belo. Fazia sua barba todos os dias, e uma marca suave ficava onde ela nascia. Seus ombros eram largos, seus braços, tão fortes quanto os de trabalhadores braçais, alongavam-se revelando mãos delicadas, com dedos longos e pequenas cicatrizes. O peitoral era bem definido, sua barriga trabalhada em músculo... mas as suas pernas eram uma visão contrária de tudo isso. Finas, frágeis e sem vida.

Deidara se isolou após seu acidente. Seu pai, um homem bondoso e compreensível, construiu uma casa de madeira para o filho de 27 anos no fundo de sua propriedade, longe da criação de gado que tinha. Uma serviçal da família ia todos os dias cuidar dos afazeres da casa de Deidara, ela era uma idosa fiel à família, dava o seu melhor, mas nada parecia ser o suficiente para afastar a depressão de seu menino — como a serviçal o chamava.

Ele estava na lateral de sua pequena casa, que tinha apenas três cômodos largos, adaptados à cadeira de rodas feita de madeira. Na cozinha o forno a lenha estava aceso, esquentando água para o chá de valeriana, que sempre o ajudava a dormir.

O quarto possuía uma cama larga e baixa, com um colchão duro preenchido com feno, o guarda-roupa estava com uma das portas abertas, esquecida por ele. Suas coisas eram bem organizadas, o banheiro, com sua enorme ofurô de madeira, estava limpo e com um cheiro agradável de ervas terapêuticas. Havia lamparinas acesas em todos os cômodos, inclusive na mesa, do lado de fora da casa, onde ele trabalhava.

Suas mãos se moviam com a habilidade de um artista. E é exatamente isso o que ele era. Deidara moldava figuras em gesso desde muito pequeno e, apaixonado pela arte, começou a se interessar também pelos explosivos caseiros que seu vizinho fazia, que eram vendidos aos híbridos gigantes para suas minerações. Ele achou que seria uma ideia genial juntar tais artes; a explosão e a escultura.

Ele foi motivo de piada por um bom tempo, no entanto. Todos acharam que suas ideias fracassariam, até Orochimaru — um dos conselheiros híbridos — interessar-se pela ideia dele. Deidara se aperfeiçoou, elevando os explosivos caseiros a níveis impressionantes, e seu pai ficou extremamente feliz com o sucesso dele, que mesmo sem ter tido a mãe por perto para criá-lo, era tão perseverante quanto ela. Só que a vida podia ser muito cruel às vezes.

Ao testar uma nova fórmula, Deidara acabou descobrindo do pior jeito que seus cálculos estavam errados, e os novos produtos que usou liberaram uma explosão muito maior do que tinha imaginado. Foi aí que ele perdeu a visão de um olho, ganhou várias pequenas cicatrizes e perdeu o movimento das pernas. Um homem apaixonado pela arte, pelo mundo, pelas pessoas, que agora vivia em uma amargura terrível. Sua noiva o abandonou, seus amigos o esqueceram e nada parecia ser capaz de fazê-lo feliz de novo, a não ser sua arte; que era tudo o que ele tinha.

Ele tentava não pensar no mal que havia caído sobre ele, jogando-se de cabeça em suas ideias, deixando sua paixão dominá-lo. Ele se sentia o homem mais triste e solitário da face da Terra, mas decidiu que, pela sua arte, não desistiria de viver. Seus dias eram dolorosos, física e mentalmente, mas ele não pereceria, lutaria até o seu derradeiro fim para honrar sua mãe, que morreu para que ele vivesse ao dar à luz.

Galhos estalaram na mata fechada, ele olhou para trás. Aquele local era perigoso, apesar de bonito. Muitas cobras eram avistadas, e ele sabia que deveria tomar cuidado. O matagal se moveu, e Deidara pegou a lamparina de cima da mesa, ergueu-a no alto de sua cabeça e virou sua cadeira de rodas com dificuldade para olhar. Seus dedos estavam cobertos de gesso, sua respiração começava a se acelerar, assim como seu coração. Não poderia ser uma cobra, era algo maior que isso. Um ladrão, talvez.

A era dos TalamaursOnde histórias criam vida. Descubra agora