Despertar

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Ninguém sabia realmente quando foi que eles nasceram, de onde vieram ou quem eram. Havia quem dizia que eles foram Eva e Adão, os primeiros a pisarem na terra, e que os homens eram seus frágeis descendentes. Assim como também existia quem acreditasse que eles surgiram do homem, que eram a personificação da evolução tão idealizada, porém ainda mais perfeitos, tão esplêndidos que transcenderam o que a humanidade acreditava ser possível.

Os registros encontrados sobre os talamaurs eram antigos e vagos demais. A verdade é que eles só sabiam que existiam, e isso era o que realmente importava. Alguns deles foram capazes de ver os primórdios da terra, quando toda civilização ainda estava se formando, quando tudo ainda era grotesco e a comunicação, limitada e dificultosa.

O mais velho talamaur vivo era Toneri, do clã Otsutsuki, que tinha 1475 anos, e seguido dele vinha Hiashi, do clã Hyuuga, que possuía apenas cinquenta anos a menos. Eles resistiram ao tempo, guerras e complicações que o mundo os ofertou, tendo assim a possibilidade de verem a humanidade evoluir, para logo depois se quebrar, repetindo esse ciclo por diversas vezes de formas diferentes, até o momento que perceberam que a civilização como todos conheciam estava prestes a ruir de uma só vez.

Os talamaurs eram portadores de várias habilidades. Cada clã detinha um talento diferente, sendo que todos possuíam um em comum: o instinto animal. Eles eram capazes de sincronizar seus corpos com a própria natureza, como se conseguissem se tornar um só com ela, sentindo a vibração emitida pelo solo, o soprar do vento, as propriedades da água... Eles se conectavam de tal forma com Gaia — o espírito da terra — que se sentiam a própria extensão dela. Por esse motivo, quando os tremores começaram, eles sabiam que não era algo normal e, assim como os animais irracionais viventes, foram para um lugar seguro.

Os Otsutsuki e os Hyuuga eram inimigos desde que se era sabido, sendo que cada um desses clãs possuía mais cinco clãs menores aliados. Existia um tratado de paz que unia esses rivais, que dizia que, em tempos de hibernação, todos deviam se unir em uma trégua que só cessaria após os dois lados estarem completamente restabelecidos. Cada hibernação, natural ou forçada, tinha um tempo limite de cem anos. E esse tempo enfim chegou.

Apesar do tratado, todos estavam com medo, principalmente o Clã Hyuuga, que tinha motivos de sobra para não acreditar com total plenitude em seus inimigos. Os Hyuuga e seus aliados acreditavam que os Talamaurs eram um castigo, uma punição que os tornavam demônios, vampiros que vagavam sobre a terra, sendo assim aceitavam e respeitavam o quanto podiam o tempo limite de sua alimentação, que era de seis meses. Ao contrário deles, os Otsutsuki se autoproclamavam raça superior, acreditando que os seres humanos deveriam estar prostrados aos seus pés, sucumbindo aos desejos da própria personificação divina — como eles se intitulavam.

Os rivais começaram a acordar e estavam realmente dando o melhor que podiam para cumprir seus devidos papéis no tratado. Ao findar da hibernação, eles tinham somente três meses para se alimentarem, caso contrário entrariam em uma hibernação forçada, pois seus próprios corpos se sentiriam fracos demais para continuar.

A montanha estava congelada, e os mais velhos, que eram os primeiros a despertarem, não entenderam a mudança climática, mas aceitaram. O lugar era imenso; uma caverna artificial escondida no monte Auyantepui — montanha do diabo —, situada na Venezuela. O chão, paredes e teto eram tão rústicos, que se a caverna fosse descoberta por um homem, ele jamais imaginaria que aquele lugar foi, na verdade, projetado. A escuridão era densa, e o frio, cortante. Via-se estalactites cobertas de gelo, algumas gotejando por causa do calor do fogo que vinha das poucas tochas feitas com enxofre e cal que estavam em candelabros medievais fixados nas paredes. Ao fundo da imensa caverna rudimentar, uma Talamaur de 460 anos ainda hibernava na escuridão de sua caixa de madeira de faveira.

A era dos TalamaursOnde histórias criam vida. Descubra agora