CAPÍTULO DOIS

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    Akemi nem sempre foi uma fedelha de rua. Ela tinha sido criada por sua mãe e tia, desde o nascimento até seus sete anos de idade. Porém, após a morte da mãe, ela foi deixada por sua tia em um orfanato em Bay Terrace, o casarão mofado não servia mais que mingau pegajoso de aveia. Antes que sua vida se tornasse mais insignificante ficando ali, Akemi fugiu. 

   Nara e Yumi foram mulheres fortes e independentes, assim como rígidas e disciplinadas. Disciplina tinha sido algo que Akemi sempre teve como base desde o nascimento, mesmo que ela agisse como se não tivesse qualquer base educacional. 

   As duas mulheres tinham deixado o Japão quando Akemi ainda era uma recém nascida. Mesmo que ela não tivesse crescido no país em si, foi criada a partir dos costumes e da cultura do Japão, assim como o idioma, que durante muito tempo foi sua primeira língua. 

   Ainda assim era uma surpresa que ela compreendesse o idioma tão claramente depois de anos como se nunca tivesse deixado de usá-lo. E era uma surpresa ainda maior ser encontrada por um rapaz que sabia seu nome e tinha pleno conhecimento sobre onde ela se escondia. Naturalmente ter um stalker não podia ser considerado algo bom, principalmente quando seu stalker é um hogosha.

   Segundo o que Akemi cresceu ouvindo de sua família, os hogosha trabalhavam para o Instituto Youkai, uma organização de grande poder que mantinha o conhecimento e o controle sobre o mundo sobrenatural e o humano. Para Akemi era mais como uma seita. Todos os hogosha eram hanyous ㅡ meio-youkais ㅡ, híbridos gerados a partir da relação entre um humano com um youkai. Os youkais eram uma classe de criaturas espirituais que incluia diversos seres, desde aqueles que conseguiam mudar de forma e objetos com espíritos, a deuses; suas aparências variam de translúcida a humana com características de animais, ou o inverso. Esses agentes capturavam crianças hanyous assim que nasciam e os levavam para sabe se lá onde. Aqueles que se recusassem a ir com eles morriam, assim como os pais que se recusassem a entregar seus filhos.

   Era dessa forma que o equilíbrio era mantido, aparentemente. 

   Nara havia gerado Akemi, uma meio-youkai, por esse motivo ela deixou seu país com sua irmã, sempre sobrevivendo às escondidas onde nenhum hogosha pudesse encontrá-las. Juntas, as duas mulheres fizeram da Akemi uma fugitiva nata. Bem, era isso o que ela acreditava até ser encontrada.

   Naquele momento ela se sentia péssima por ter jogado todo o trabalho das duas mulheres no lixo. Ela havia se descuidado. Seu erro foi ter permanecido durante muito tempo no mesmo lugar.

   Droga. Droga. Droga.

   Desejando desesperadamente que todos os acontecimentos fossem apenas parte de um sonho ruim, Akemi se obrigou a abrir os olhos. Suas pálpebras estavam pesadas. Seu corpo parecia ter sobrevivido a um pisoteamento de centenas de mamutes. 

   Viu no alto nada além de um belo acabamento em um tom que parecia ser creme. Franziu a testa ao perceber que encarava com admiração o contraste entre uma parte iluminada e as sombras de um lado mal iluminado do teto.

   Com seu corpo dolorido e exaurido até a última gota, foi um sacrilégio conseguir se sentar. Sua cabeça latejou com o esforço. Conseguindo se sentar, viu que estava em um quarto, não um simples quarto, mas sim um extremamente luxuoso. 

   O cômodo era por completo em um tom amarelado, creme. A parede direita era inteiramente de vidro com cortinas cinzas presas por um dente de aço na parede, sua vista era de uma cidade noturna iluminada. Próximo ao vidro havia um banco comprido de couro marrom. Os lençóis da cama baixa eram uma mistura de seda e camurça. O cômodo, mesmo a noite, era claro e arejado, e havia um aroma fresco de flor de lótus no ar. 

IY- Ao Cair Da NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora