Noite na Fogueira

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[JACK]

Dessa vez fui eu que me atrasei — por causa de uma pequena luta por privacidade no banheiro, que perdi. Quando desci a escada Mikayla já abria a porta do hall, sem se incomodar em me esperar. Corri atrás dela e segurei seu braço antes que pudesse sair. Ela se surpreendeu com o toque e virou-se para mim. Nessa noite, metade do seu cabelo estava preso em uma presilha e a parte solta caía delicadamente sobre seus ombros; modelando seu corpo, outro vestido, só que este, mais fino e longo, azul estampado com manchas coloridas; as solas descansavam sobre um chinelo de madeira. Abri a boca para falar, mas não encontrei palavras. No breve momento de hesitação, ela puxou seu braço e saiu pela porta, fazendo questão de expor seu aborrecimento.

Cory e Daniel nos esperavam do lado de fora e nos escoltaram até a parte posterior do castelo, onde a enorme fogueira já estava acesa na planície. Todos os outros habitantes estavam sentados em troncos de árvores ao redor das chamas, esperando o jantar que as empregadas coziam em um grande caldeirão. Mikayla se sentou em um dos troncos e eu, ao seu lado, mas ela não olhou para mim. As pessoas conversavam alto, riam e cantavam. No entanto, quando nos aproximamos, muitas ficaram quietas e guiaram os olhares curiosos para nós para nos examinar. Ninguém se sentou no mesmo tronco que a gente. Agora eu entendia por que as empregadas haviam escolhido as melhores roupas para essa noite. Precisávamos ser bem vistos.

Os olhares da tribo não eram nada sutis nem discretos, o que deixou a mim e a Mikayla desconfortáveis. E não demorou muito para serem seguidos de fofocas, das quais algumas eu consegui entender:

— Aquele garoto, ele trabalhou na área de pesca hoje...

— Minha mãe disse que ela está trabalhando no castelo com as empregadas...

— Um gato! Bem que eu queria ficar sozinha com ele em uma praia...

— ...primeiro dia e ela já quebrou um copo!

A última frase Mikayla ouviu. Ela suspirou e apoiou a testa em uma das mãos, escondendo o rosto de mim.

— Como todo mundo já sabe? — murmurou ela retoricamente.

— Não ligue para elas. Você sabe que a culpa foi minha.

— Já notou que tudo que estão falando de você são elogios, e tudo que estão falando de mim são críticas?

— Ninguém te conhece ainda, com o tempo todos vão...

— Pare de tentar me tranquilizar, Jack — replicou secamente. Um grupo de meninas pré-adolescentes relativamente próximo ouviu Mikayla dizer meu nome e surgiu um novo assunto para cochicharem. Eu as ignorei.

— Se você quiser cessar esses comentários deveria pelo menos sorrir um pouco. Forme uma imagem em sua cabeça: uma garota emburrada que deixou o copo cair à direita e um garoto galante que conquistou a todos na pescaria à esquerda. Com quem você simpatizaria?

Ela levantou a cabeça e vi em seu rosto que reconhecia que eu estava certo, mas não estava com

a mínima vontade de fingir sua animação. Nesse momento, Tawã passou por trás dos guardas e se sentou ao lado de Mikayla no tronco. Ela ficou surpresa, mas tentou não demonstrar isso — assim como o restante da tribo. A presença de Tawã em jantares públicos como esse não parecia comum, pois todos tiveram a mesma reação que ela, porém com um pouco mais de animação. Algumas crianças correram até ele para contar sobre seus dias e ele brincou com elas. Parecia que sua companhia era agradável — mas não para mim.

Depois de um tempo, as crianças foram brincar perto das árvores e nos deixaram a sós de novo, então, Tawã passou a mão pelo ombro de Mikayla e abriu um sorriso para ela.

Naufrágio nas Ilhas de RochasOnde histórias criam vida. Descubra agora