Tem que haver uma saída

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[MIKAYLA]

Fazia muito tempo que eu estava lá, deitada no leito da enfermaria. Devia ser bem tarde, quase a ilha toda já estava dormindo e as mulheres que me cercavam tinham olheiras profundas e escuras. Beth e Dori pareciam exaustas e loucas para irem para a cama, mas ficaram para ajudar a cuidar de mim. Eu estava tão cansada que teria cochilado se as fisgadas na minha barriga não me incomodassem. A enfermeira retirava os pontos que Jack fizera no corte e doía um pouco. Olhei para o punhado de lençóis pardos pendurados no fundo da enfermaria, onde a luz do lampião atrás deles formava a sombra do ofurô.

Cerca de uma hora antes eu chegara à enfermaria por intermédio de Hugo e Holly. Lembro-me da expressão no rosto da enfermeira ao me ver; ela largara o livro que estava lendo e correra até mim, disparando várias perguntas assustadas para cima dos guardas. Hugo e Holly não falaram nada a respeito do que acontecera em Lupi, apenas disseram à enfermeira para me "dar um trato" e me deixaram sob seus cuidados.

Fui banhada em um grande ofurô de madeira para que a enfermeira limpasse meus machucados antes de tratá-los. Ver todos os hematomas e feridas no meu corpo só deixara a pobre senhora mais agitada e ela me lançou dúzias de perguntas. Não respondi nenhuma delas, desconversei e omiti o máximo que pude sem ser rude dizendo que foram apenas dias ruins. Mesmo assim ela não se calara. Parara de fazer perguntas, mas exclamava interjeições e sussurrava nome de santos enquanto tentava veementemente separar a sujeira da minha pele. Como fazia dias que eu não tomava banho, a água ficara preta. Os lençóis tinham sido pendurados em varais improvisados para esconder a minha nudez caso alguém entrasse. E foi justamente o que aconteceu.

Dori e Beth foram avisadas da minha chegada e compareceram à enfermaria minutos depois. Dori jogara meu vestido destruído fora e Beth me entregara um pijama limpinho e fresco para vestir. Claro que as duas agiram da mesma forma que a enfermeira, mesmo que tivessem me visto mais limpa, e me fizeram inúmeras perguntas também, mas como não respondi nenhuma, elas desistiram.

Agora eu estava na etapa final. A senhora me fizera alguns curativos, colocara um tipo de gel caseiro ardido nos roxos; só faltava dar um jeito na marca que Tawã me dera.

— Esse é de longe o pior de todos os seus machucados! — exclamou a enfermeira, puxando a última linha do corte. — Vejamos... A sua sorte, Mikayla, é que grande parte já cicatrizou. Acho que não vou precisar refazer os pontos.

— Graças a Deus — suspirei aliviada. Não queria passar por aquilo de novo.

— Mas ainda está bem feio — disse Dori.

— Ai, querida, como conseguiu sobreviver a esse ferimento? — assustou-se Beth, com a mão na boca. — Acha que está infeccionado? — perguntou à enfermeira.

— Está bem vermelho e feio ainda, é muito recente, mas acho que não chegou a infeccionar. Sente alguma dor diferente?

— Tive febre há alguns dias, mas fora isso, só sinto a dor da cicatriz — respondi.

— Muito bem, então. Vou limpar, tirar as casquinhas de sangue, e passar a pomada só por precaução. E aí eu faço o curativo.

Naufrágio nas Ilhas de RochasOnde histórias criam vida. Descubra agora