[MIKAYLA]
— O que está fazendo?
— Não está com sede?
— Morrendo.
Já estava no meio da tarde, eu acordara há pouco tempo e Jack estava enfiado no compartimento inferior do barco. Como o barco estava praticamente deitado na areia, eu não entendia como ele tinha conseguido entrar ali. Jack arremessou três galões de água pela porta do alçapão aberta, caíram pesadamente e marcaram a areia molhada. Andei até a orla para abrir um e beber.
— Perdemos todos os biscoitos e frutas — disse Jack, saindo do barco —, mas como os galões estavam lacrados ainda temos seis litros de água para sobreviver.
Era mais do que suficiente.
Adentramos a mata sombria sem perder tempo. Conseguíramos suprir toda a exaustão do outro dia e não fazia sentido esperar. Só levamos conosco dois galões de água — um para cada um — e deixamos o terceiro reservado na praia.
Apesar de as duas localizações serem relativamente próximas uma da outra no mapa, o lugar em que estávamos agora era muito diferente de Itatiba. A começar pela vegetação. Não era uma floresta de solo seco, com altas árvores e características tropicais. Na verdade, nós nem podíamos chamar isso de "mata".
A selva conseguia me assustar até de dia. O solo era úmido, lama por toda parte, se assemelhando a um pântano; as copas das árvores eram tão coladas umas nas outras que pouquíssima luz passava; os troncos, sempre cobertos por musgo e galhos enrolados em cipós; havia barulhos de cigarras e outros ruídos, embora não conseguíssemos ver nenhum animal. Tudo ali dentro era meio... sinistro. Duvidei que pudéssemos encontrar comida nesse lugar, duvidei até que alguma coisa pudesse viver ali, mas encontramos uma coisa.
Quando Jack viu uma fruta roxa — estranhíssima — no alto de uma árvore, se apressou logo em pegá-la. Ele já ia dar aquela dentada se eu não chegasse antes.
— Não! Pode ser venenosa — adverti, batendo na fruta e arrancando-a da mão dele. Jack me lançou um olhar lamentoso.
— Estou morrendo de fome — disse, com o rosto franzido e pressionando a mão na barriga.
— E vai acabar morrendo mais rápido se comer o que não conhece — repliquei, mas fiquei com pena de vê-lo assim. — Eu também estou com fome, faminta, mas vamos andar mais um pouco.
Tristemente, ele concordou, e voltamos a caminhar por esse terreno gosmento.
Não entrarei em detalhes sobre o resto da nossa expedição, porque não aconteceu nada interessante. Só encontramos comida depois de quase uma hora, uma mangueira. Depois disso, mais nada. O que quero contar aconteceu alguns minutos depois de aquietarmos nossos estômagos, quando nunca podíamos imaginar que estávamos sendo observados.
Eu estava andando atrás de Jack e cutucando o arranhão do meu braço — porque eu arrancara as bandagens pelo caminho e agora formava uma fina casca de sangue seco —, sem muitas esperanças de encontrar outra coisa útil.
— Esta ilha me dá arrepios — eu disse.
— Qual é, Mikayla. Está com medo? — Jack sorriu para mim, começando a se divertir.
— Ah, não. Eu já conheço esse sorrisinho irritante — apontei o dedo pra ele. — Se você tentar me assustar como fez em Itatiba eu juro que...
Foi então que eu ouvi um galho se partir. Parei na mesma hora. Com certo medo, olhei em volta, começando a pensar que não estávamos sozinhos, depois fechei a cara e virei-me para Jack.
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Naufrágio nas Ilhas de Rochas
Romance"Mikayla e Jack são jovens de quinze anos, com vidas completamente distintas e separadas, que embarcam - literalmente - na maior aventura de suas vidas. Com a colisão do cruzeiro de viagem em que estavam, seus destinos são unidos, e ambos terão de l...