Naufrágio nas Ilhas de Rochas

Show de Horrores

[MIKAYLA]

Saí do banheiro limpa, vestindo o roupão por cima da minha roupa para esconder o que havia por baixo.

Havia tentado limpar todos os cortes o máximo que conseguira no banho. Doera, e muito, pois havia muitos caquinhos de vidro cravados na minha pele, tivera que tirar todos e tratar de todos os meus machucados. Tawã não me levaria à enfermaria, pois causaria suspeitas. Então eu tivera que ser a minha própria enfermeira e fazer o trabalho bem feito para que ninguém visse as feridas no dia seguinte no casamento. O sangue sumira, algumas feridas se regeneraram, mas outras deixariam cicatrizes quando partissem. Não havia nada que eu pudesse fazer quanto a isso. Tawã deveria ter pensado melhor antes de me atirar às janelas.

Eu tinha acabado de sair de um banho de banheira sofrido, mas ainda me sentia maltrapilha por dentro, por mais que eu tivesse retirado toda a camada de sujeira e tratado da minha pele. Eu sabia por quê. Vivia em constante conflito comigo mesma e com o mundo ao meu redor. Minha alma não podia ser lavada.

Apoiei-me sobre a borda do corrimão na frente do banheiro com os antebraços pressionados na madeira e olhei para o andar de baixo. Rosa acabava de sair do corredor do escritório de Tawã, acompanhada de dois guardas que eu não sabia o nome. Meu coração pulou quando a vi. Lancei-lhe um olhar curioso, me matando para descobrir o que acontecera dentro daquele escritório. Rosa ergueu o olhar e encontrou o meu. Com os olhos bem abertos e sérios, ela assentiu para mim, e mexeu os lábios rapidamente quando nenhum dos guardas prestava atenção. "Tudo bem" leu-se em seus lábios, e seguiu caminho pelo hall até as portas frontais. Não soube o que pensar disso.

Será que Rosa havia conseguido se virar? Será que fora poupada de alguma punição? Ou ameaçada para não dizer nada a ninguém? E se ela tivesse mentido para me salvar? E se tivesse contado a verdade?

Assisti a ela desaparecer pela fresta da porta com os guardas enquanto mil pensamentos — a maioria ruim — colidiam em minha cabeça. Tawã apareceu no final do corredor por onde Rosa viera e parou, esperando-a sair, com as duas mãos enterradas nos bolsos e uma expressão sem emoção. Por sorte, ele aparecera um pouco depois de Rosa já ter abaixado a cabeça, e perdera nossa comunicação silenciosa. Assim que a porta bateu, ele olhou para mim com o canto do olho, sem mudar sua expressão, mas com um olhar faminto, como se fosse me devorar, e se preparou para subir a escada. Senti-me enjoada.

Sabia o que estava prestes a acontecer, sabia o que ele tinha em mente quando dissera que eu pagaria no lugar de Jack, sabia que era por isso que eu fora obrigada a vestir essa roupa. Sabia o que aquele olhar significava.

Desviei os olhos e corri para o corredor dos quartos.

— Pode sair, Mikayla. Estou esperando.

Ouvir isso só me deu mais vontade de vomitar. Tentei outra vez, apoiando-me na bacia e enfiando um dedo na goela. Tossi algumas vezes mas nada saiu. Não havia o que vomitar, eu não comia nada desde a hora do almoço.

— Algum problema? — perguntou Tawã.

Apoiei-me na porta, tentando me sustentar já que meus pés pareciam ter perdido essa capacidade. Virei-me de costas e encontrei meu reflexo no espelho em cima da pia. Não sabia se conseguiria. Não, eu não conseguiria sair. Meu corpo todo tremia.

Eu estava na suíte de Tawã, presa em seu banheiro enquanto ele me esperava no quarto. Meu coração batia freneticamente com o que eu teria que fazer, minhas mãos suavam frio.

Eu sabia que Tawã me obrigaria àquilo uma hora ou outra, não tinha nada a ver com a minha postura em proteger Jack de alguns minutos atrás, tampouco com meu chilique na cabana de Rosa. Não era uma punição. Era só uma desculpa mascarada para eu satisfazer seus desejos. Porém, mesmo esperando uma atitude sádica dessas a qualquer momento, era impossível se preparar para algo tão cruel e humilhante.