PARTE 4 - FINAL
[MIKAYLA]
Os dias foram se passando calmamente na ilha Itatiba. Os callumines trabalhavam, suas crianças brincavam, o sol nascia e se punha como em qualquer semana normal. Tudo parecia normal.
Menos para mim.
A ilha toda sabia do meu "noivado" com Tawã — como eu já esperava — e esse se tornara o principal assunto. Ninguém tinha pudor em falar de como eu era sortuda, ou em como eles estavam animados para terem um rei e uma rainha, sobre como havíamos nos apaixonado; coisas idiotas. Estavam tão curiosos sobre nossa vida amorosa que ninguém nem ligou para a origem dos meus machucados ou a ausência de Jack. Sempre que eu passava pelo mercado, os callumines se focavam em mim e fofocavam sobre a minha vida. Que vida? A palavra perdera o significado para mim.
Todas as manhãs Tawã me proibia de sair da cama, dizendo que eu precisava descansar. Recebia as refeições no quarto e ficava de repouso forçado até o meio da tarde, que era quando ele me levava para a enfermaria para me examinarem e acompanharem minha recuperação. Depois, eu voltava para a cama e ficava mais de repouso. Tawã me prendia no castelo. Fizera-me sua prisioneira.
Após minha conversa com Jack, suas palavras ficaram se agitando na minha cabeça, lembrando-me sempre de: "fingir-me fraca e machucada"; "inventar desculpas convincentes"; "adiar o casamento o máximo possível". Mas não precisei fingir durante esses dias. Talvez estivesse claro para Tawã que eu estava acabada demais para me casar, então ele nem tocou no assunto do casamento.
Mesmo assim, não deixei de fazer uma lista mental das pessoas em quem eu poderia confiar para nos ajudar a fugir. Eliminei qualquer empregada logo de cara, pois seria arriscado demais confiar em pessoas tão fiéis ao príncipe. Pensei nos guardas. Eles tinham acesso a qualquer parte da ilha a qualquer hora. Seria uma peça muito útil no jogo. Mas também eram muito subordinados a Tawã e eu não tinha certeza se me ajudariam. Hugo e Holly com certeza não, me delatariam na hora; mas quem sabe eu conseguiria convencer Cory ou Daniel? Minhas opções ainda estavam em processo de escolha.
Enquanto isso outro amanhecer iluminava o céu para uma nova manhã normal.
Sonhei com um barco, tempestades, e com Jack. Caímos na água e começamos a nos afogar, fomos puxados cada vez mais para a escuridão. Tentei gritar. Vi seu corpo inerte na água antes de sentir as últimas bolhas de ar saindo pela minha boca.
Acordei de repente, respirando uniformemente. Meu coração batia rápido. Não foi meu primeiro pesadelo desde as noites nas celas privadas do subsolo. Durante todas as noites desde que voltáramos à Itatiba eu sonhara com a ilha Lupi, com a guerra, com as mortes, com as chamas, com a oca. Às vezes, era até mais de um pesadelo por noite. Eu nunca conseguia dormir direito. Contudo, foi meu primeiro pesadelo com Jack, com a morte dele. E a sensação com que eu despertara dessa vez foi pior do que todas as outras. Muito pior.
Apertei as pálpebras com força para fazer as imagens do pesadelo sumirem até manchas cor-de-rosa surgirem no lugar delas. Então voltei a abrir os olhos. Minha visão ficou embaçada. Meio sonolenta, esfreguei as pálpebras. Quando minha visão se focalizou, vi os lençóis pardos da minha cama e os raios de sol através das portas de vidro.
E começa mais um dia tedioso, pensei comigo mesma, depois cantarolei em pensamento: Tédio com um "T" bem grande pra você.
Soltei um gemido e lentamente virei de costas na cama para me espreguiçar. Meu grito de susto veio logo em seguida.
Tawã se encontrava sentado na beirada da cama, com uma expressão tipicamente serena e bonita, me observando. Sentei-me tão rápido que minha cicatriz na barriga causou uma dor aguda. Apertei o curativo com a mesma força que apertei os lábios para não demonstrar dor enquanto encarava Tawã de volta.
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Naufrágio nas Ilhas de Rochas
Romance"Mikayla e Jack são jovens de quinze anos, com vidas completamente distintas e separadas, que embarcam - literalmente - na maior aventura de suas vidas. Com a colisão do cruzeiro de viagem em que estavam, seus destinos são unidos, e ambos terão de l...