Noiva

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[MIKAYLA]

Escova, cabelo, penteado. Mãos, pés, unhas. Unhas roídas das mãos, unhas longas nos pés. Bacia, água quente, lixa. Não, esse não ficou bom. Escova, cabelo, outra tentativa. Pés, unhas, pronto. Ainda não é isso que eu quero. Escova, cabelo, fios repuxados. Dor. Mãos, unhas,... Não tem solução! Estão muito pequenas. Coque caindo. Xingamento! Preciso de grampos. Correria. Unhas prontas, me deixem em paz, grampos em mãos. Rápido, ainda preciso me arrumar! Espetadas, espetadas, espetadas. Por que seu cabelo tem que ser tão cacheado? Espetadas, espetadas, espetadas. Dor. Tudo bem, estamos quase lá. Cabelo preso, penteado pronto. Maquiagem!

Estojos por todo canto, pó voando, bagunça e sujeira. Quero preto. Não, noiva precisa ser sutil e delicada. Quero uma cor escura e forte. (Para assustar o noivo, quem sabe.) Pó de arroz. Pof, pof, pof! Não, é muito! Tossidas, olhos lacrimejando, partículas suspensas no ar. Pálpebras, cílios, bochechas. Boca, batom e gloss. Não se preocupe, você está linda. Tá, pode crer. Que bom que finalmente acabou.

Sai Jessica, é a vez de Rosa. Tumulto. Mais pares de pés, passos descontrolados, muita ansiedade e histeria para um cômodo só. Muita gente para um cômodo só!

Pausa para um lanchinho? Mais pães de diversos tamanhos e gostos, suco de todas as frutas.

Tumulto. O vestido chegou. Risinhos, gritinhos, pulinhos — tudo com inho! Véu, sapatos, flores. Joias! Você pode montar o seu buquê. Tudo bem. E então, o que vai ser? Saiam, todas fora agora! Tem gente demais aqui, a noiva precisa de espaço! E como eu preciso de espaço! Resmungos, carinhas tristes, desapontamento. Lamento. Multidão para fora, aglomeração, esperem, não todas de uma vez! Finalmente, fora. Espaço, ah, espaço, posso voltar a respirar, redução drástica de vozes. Silêncio abençoado. Obrigada. De nada, querida, vamos vesti-lo?

Alguns minutos depois, eu estava em meu vestido branco rendado de frente para o grande espelho do salão, com uma leve e bonita maquiagem feita por Jessica (que dera duro para esconder a ferida do corte na minha testa) e também o coque baixo que tanto lhe dera trabalho, mas que ficara lindo no final. Alguns cachinhos escapavam do cabelo preso, criando uma imagem mais delicada e angelical ao redor do meu rosto. Eu me olhei por vários segundos no espelho, inconscientemente tentando gravar essa imagem para sempre. Sabia o que significava estar nesse vestido, mas não havia como negar que estava linda. Eu me sentia linda, pela primeira vez em muito tempo. Achei que se eu aproveitasse essa sensação e fingisse estar feliz para mim mesma, as coisas se sairiam melhores.

Rosa voltou ao cômodo segurando o véu. Ela usava um vestido verde da cor da mata confeccionado por ela própria e prendera metade do seu cabelo no alto com uma flor branca, deixando a outra parte solta. Com um gesto gracioso, enfiou os grampos no topo do meu coque. O véu não era tão longo, chegava ao meio das minhas costas onde meu cabelo alcançaria se estivesse solto e molhado. Rosa olhava para o espelho enquanto ajeitava o véu ao meu redor, com um certo brilho nos olhos. Estávamos sozinhas agora. As últimas mulheres e ajudantes haviam saído para se arrumarem depois de eu ir me trocar a pedido de Rosa. Desde então, eu estava com a estranha sensação de que ela queria falar comigo em particular, sobre os assuntos pelos quais eu não queria tocar.

Finalmente, para confirmar minha intuição, ela me segurou pelos ombros e me girou para olhá-la de frente.

— Você está bem? Não vai entrar em pânico ou algo do tipo? — ela disse, mas brincando. Eu lhe lancei um olhar melancólico e abri um pequeno sorriso, achando graça.

— Não. Quer dizer, eu poderia estar melhor, mas não vou pirar desta vez. A última já foi o bastante — completei, deixando escapar um pequeno suspiro.

Eu estava bem. Muito melhor do que nos outros dias porque eu sabia que haveria uma chance de sair da ilha hoje. Por mais que a ideia de tudo ruir no último segundo me amedrontasse, havia esperança, eu lutaria pela minha liberdade e a de Jack. Não ficaria parada assistindo a tudo acontecer dessa vez. Era isso que me motivava e não me deixava perder as estribeiras de novo. Esperança. De que tudo desse certo ou que tivéssemos nos esforçado ao máximo para que desse certo, dado o nosso melhor, sem arrependimentos. É claro que eu ainda resguardava insegurança, uma parte significativa de mim não estava confiante, mas não dependia só de mim. Eu fizera uma promessa, a mim mesma e a Jack. E eu estava inteiramente disposta a cumpri-la.

Naufrágio nas Ilhas de RochasOnde histórias criam vida. Descubra agora