Capítulo 70

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If we’re ever parted I will keep the tie that binds us And I’ll never let it break ‘Cause I love you

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If we’re ever parted I will keep the tie that binds us And I’ll never let it break ‘Cause I love you.
— Johnny Cash e June Carter Cash, “’Cause I Love You”

Deixar Shivani partir, depois de toda dor que eu causei a ela, foi o fundo do poço para mim.

As pessoas dizem que pelo menos o fundo do poço é o limite e nada mais de ruim pode acontecer, mas sempre pode. Paredes desmoronam e você é soterrado. Shivani se foi. Só causei mal ao maior amor que tive na vida. Tem um lado meu que quer se entregar, enquanto o outro me mostra alguém que não pode simplesmente ir embora: Krystian.

Meu primo volta a morar no apartamento, mas quase não fala comigo. Ele me culpa por tudo o que aconteceu e está coberto de razão. Eu tenho dois caminhos à minha frente: me deixar levar por tudo o que perdi ou tentar sair do lugar imundo e desolador em que me encontro.

Quando chego em casa, ele está lá. Sentado no sofá, jogando videogame. Parece o mesmo Krystian de sempre até olhar para mim. Ele não sabe o que fazer, está preso entre a raiva e o compromisso que tem comigo como alguém que ainda me ama.

Eu me sento ao seu lado e pego o controle. Krystian me olha espantado. Nunca jogamos juntos. Ele reinicia o jogo e tenta agir normalmente, enquanto faz um gol atrás do outro.

— Você foi com ela ao aeroporto? —pergunto, entre um movimento e outro.

— Aham.

— Não te pediram pra voltar pra casa deles?

— Pediram.

— Preciso que você vá.

— Tá me expulsando? — Ele pausa o jogo e me encara.

— Não. É que vou passar um tempo fora.

— Vai ficar nessa vida até morrer?

— Não. — Respiro fundo antes de contar a ele minha decisão. — Vou me internar.

Krystian abre a boca e não consegue pronunciar um único som. Chocado, solta o controle sobre o sofá. Seus olhos começam a lacrimejar, e, antes que eu dê maiores explicações, ele me abraça chorando.

No dia seguinte, chego ao escritório de Fernando Morris Paliwal acompanhado de Krystian, que parece criança novamente. Sua fé em mim me surpreende mais uma vez. Ele acha que é simples me salvar. Acho que faz parte do amor cego.

— Eu conversei com ele, Bailey. — Krystian se refere ao avô de Shivani.

— Ele concordou em falar com você. Vai dar certo, cara. Só tenta não estragar tudo — ele pede sem jeito, como se agora eu fosse um cara frágil e pudesse desabar a qualquer momento.

Incomodado, entro no escritório e fecho a porta atrás de mim. Se Fernando já é um homem intimidante, vê-lo atrás de sua mesa, com seu terno e sua pose de matador, potencializa ainda mais sua postura de mafioso.

— Sente-se — ele aponta a cadeira à sua frente. — A Shivani partiu há menos de vinte e quatro horas. Espero que não esteja aqui para me pedir o contato dela.

— Não estou.

— Ótimo. — Ele se ajeita na cadeira.

— Parei de usar drogas quando tudo aconteceu. — Minha voz sai tremida, assim como estão minhas mãos. Estou prestes a ter uma puta crise de abstinência, e não tenho Shivani para me ajudar.

— É compreensível, mas sei que já parou outras vezes.

— Duas vezes.

— E o que muda agora? Por que seria definitivo desta vez? — Seus dedos batem na mesa, parecendo ansioso.

— Eu falhei com a Shivani, mas nunca deixei de amar sua neta. Nunca vou deixar. Ela queria que eu me curasse, então vou me curar.— Estou decidido e falo com firmeza.

— Por ela?

— Não. Quero honrar o que nós tivemos, mas já tentei por ela e não consegui me segurar na primeira crise.
Preciso tentar por mim.

— Sozinho? — Tenho a impressão de que ele me faz perguntas cuja resposta já sabe, mas quer ouvir de mim.

— Não dá pra ser sozinho.

— E o que pretende?

— O Pepe me disse que você arrumou uma clínica e que ia me internar na marra. — Cada palavra é um peso. Não tem nada pior para mim do que pedir ajuda.

— Sim.

— Será que eu ainda posso ir, sem ser na marra?

— Pelo tempo que for necessário?

— Pelo tempo que for necessário.

O avô disfarça um sorriso, se levanta e dá a volta na mesa, ficando de frente para mim. Então coloca as mãos em meus ombros.

— Tem algo em você, garoto... Não sei o que é, mas você desperta um instinto protetor nas pessoas. Acho que você sabe, tendo em vista o estrago que deixou pelo caminho. Quando soube o que havia acontecido à sua mãe, eu disse à minha neta que a vida bate em você. Bate mesmo, e bate duro, mas tem algo que você precisa saber: a vida nunca bate mais do que podemos aguentar, e você é mais forte do que imagina.

— Eu não sei se vou conseguir sair. Não quero enganar ninguém. Também não quero que a Shivani saiba que eu tô tentando. Ela pode criar expectativas, pode querer voltar, e quero ela longe de tudo isso.

— Concordamos nesse ponto. — Ele me solta e encosta na mesa, sem desviar a atenção de mim.

— E eu quero te pagar de volta. Não vou conseguir pagar tudo de uma vez, mas cada centavo que gastar comigo, vou devolver.

— Ok. — Não tem como não me lembrar dela.

— Você pode cuidar do Krystian também? Sei que tô pedindo muito e que não tenho esse direito, mas não sei a quem mais pedir. O Pepe tá fodido... — Ele franze a testa, me recriminando pelo palavrão. — O Pepe tá ferrado por minha causa — conserto, contrariado. Ele está me ajudando, e o mínimo que posso fazer é medir a porra das palavras.

— Posso resolver tudo.

— Você fala como se fosse simples.

— Não é, mas, quando se trata da família, você aprende a fazer o que é necessário.

— Eu sou da família?

— Uma parte meio torta e que eu não queria muito, mas é. — Ele balança a cabeça. — Mais alguma coisa?

— Sim, eu preciso ser internado hoje. O mais rápido possível. — A voz sai engasgada quando uma crise de dor me domina. Vai começar tudo de novo.

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“Se alguma vez nos separarmos/ Vou manter o laço que nos ata/ E nunca vou deixar que ele se desfaça/ Porque eu te amo”.

As Batidas Perdidas do CoraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora