Why can’t you shoulder the blame Coz both my shoulders are heavy From the weight of us both.
— Snow Patrol, “How to Be Dead”Fico offline porque não sei mais o que dizer. Foi um reflexo.
Lamar está parado, olhando para mim como se esperasse um surto a qualquer momento.
— Você tá bem? — ele pergunta se abaixando e virando minha cadeira para ele, para que possa olhar para mim.
— Na medida do possível.
— Qual é o problema? — Ele apoia os braços em meus joelhos.
— Eu queria odiar esse cara — aponto frustrada para o computador. — E você me tirou isso.
— Desculpa.
— Não é sua culpa. — Seguro sua mão, precisando me apoiar em algo. — Acho que nem dele, né?
— Acho que não. A barra dele é ainda mais pesada que a nossa.
— É...— respondo, enquanto me lembro do que aconteceu alguns minutos atrás.
Lamar entrou no meu quarto com cara de quem aprontou alguma coisa. Pensei que fosse me pedir para cobrir a dele enquanto saía sem minha mãe perceber, o que seria bem fácil, mas ele apenas me estendeu um papel com um e-mail anotado.
— O que é isso? — perguntei, lendo e relendo, sem reconhecer o nome.
— Esse cara vai te adicionar no MSN. Quero que você aceite.
— Por quê? É algum amigo seu? Eu tenho namorado, Lamar.
Não seria a primeira vez que ele tentava me arrumar outro.
Quando Noah insistiu que queria deixar o país, Lamar fez de tudo para ficarmos juntos.— Shiv, eu disse pra você dar pro cara? Só aceita.
— Por quê?
— Ah, é um cara que perdeu a irmã no dia que o nosso pai morreu. Perdeu a irmã, o primo e os tios em um acidente de carro. — Ele andava pelo quarto enquanto falava, sem olhar muito para mim.
— Nossa... Coitado... — Quando percebi, estava apertando o papel contra o peito.
— É. E o pai dele morreu faz alguns anos em um assalto.
— Meu Deus! — Apertei o papel com mais força, como se isso pudesse confortar quem quer que fosse o tal Bailey.
— É. — Meu irmão se sentou ao meu lado na cama.
— Tem mais alguma coisa que você queira me dizer sobre ele? Por que devo adicionar? Ainda não entendi — perguntei, quando o pedido para adicionar chegou e ouvi o barulho vindo da caixa de som.
— Mais uma coisinha de nada — ele aproximou os dedos, mas percebi por sua expressão que não poderia ser nada de mais.
— O quê?
— É o motoqueiro, primo do Krystian — ele falou bem rápido, como quem conta uma travessura de infância.
Minha primeira reação foi rasgar o papel em mil pedaços.
— Não vou adicionar esse cara! — afirmei, jogando os papéis para longe, mas já estava tocada. Lamar contou nessa ordem de propósito. Era uma armadilha.
— Você não vai adicionar.
Ele adicionou. Só aceita. Não custa. — Meu irmão colocou a mão no meu ombro. — Ele quer pedir desculpas, Shiv... Aceita, por favor. Por mim. É o tipo de idiotice que eu faria, você sabe. Bati o maior papo com o primo dele. Eles são maneiros. São boas pessoas que perderam quem amavam, como a gente.— Tá... — respondi, sem saída, e fui para o computador.
Aceitei e, por mais que eu ainda quisesse brigar com ele, não conseguia mais.
Passei a tarde inteira odiando esse cara. Passei a tarde inteira querendo que ele sofresse pelo menos um pouquinho do que estou sofrendo por perder meu pai, e aí descubro que ele provavelmente já sofre. Há muito mais tempo, e talvez de forma pior. E, quase que automaticamente, minha raiva se esvai. Por isso saí do MSN — porque com a raiva eu sei lidar, mas não sei o que fazer com a compaixão que sinto por Bailey.
Lamar me dá um beijo na testa e sai do quarto, me olhando da porta e dizendo antes de fechar:
— Valeu por falar com o cara,
Shiv. Fica bem, tá?— Estou bem — minto, porque sou tonta, já que Lamar me conhece como ninguém.
Fico sozinha e me deito na cama.
É assustador como podemos potencializar e pensar que a nossa dor é a maior do mundo. Ela pode realmente ser a maior para nós, mas não é a única. Em qualquer lugar, existem pessoas sofrendo por perder alguém agora.
Agora.
E agora...
A todo segundo alguém morre. A todo segundo alguém perde um ente querido. A todo segundo alguém se parte. A todo segundo. Ninguém é poupado, nem mesmo o motoqueiro irritante de quem você queria ter raiva, porque se revoltar é melhor que não sentir nada, e você está morrendo de medo de atingir o nível de sua mãe e simplesmente não enxergar mais nada ao redor.
Telefono para César. Preciso ouvir a voz dele. Preciso sentir algum conforto nele. Preciso que ele me faça acreditar que tudo vai ficar bem outra vez. Preciso de tantas coisas e, depois de quarenta e oito minutos de conversa, sinto que não consegui nenhuma delas.
Coloco os fones de ouvido e ligo o som, no volume mais alto que posso aguentar. Ouço uma única música repetidas vezes. Aquela que expressa tudo o que aperta meu peito desde que meu pai se foi e que hoje me afeta ainda mais.
I miss you
I miss you so bad
I don’t forget you
Oh! It’ s so sad.I hope you can hear me
I remember it clearly.The day you slipped away
Was the day I found
It won’t be the same.“Slipped Away”, da Avril Lavigne. Passo pelo menos uma hora ouvindo sem parar, tentando não pensar em nada e pensando em tudo.
E, nessa uma hora, aproximadamente seis mil cento e vinte pessoas morreram. Isso se não aconteceu um atentado terrorista. Tem uma pesquisa da ONU que comprova esses dados. São coisas assim que você se pergunta quando perde alguém.
Eu me encolho debaixo do edredom, me sentindo muito pequena, mas sei que não estou sozinha. Milhares de pessoas sentem exatamente o mesmo em muitos lugares por aí. Até mesmo ele... Talvez, para ele, seja ainda pior.
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“Por que você não pode aguentar a culpa?/ Pois meus ombros estão pesados/ Com o peso de nós dois.”
“Sinto sua falta/ Eu sinto tanto a sua falta/ Eu não esqueço você/ Ah! É tão triste.// Espero que você possa me ouvir/ Eu me lembro claramente.// O dia em que você partiu/ Foi o dia em que eu percebi/ Que nada mais será igual.”
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As Batidas Perdidas do Coração
Fiksi PenggemarShivani acaba de perder o pai. Com a mãe em depressão, ela se vê obrigada a assumir o controle da casa com o irmão mais novo. Bailey teve o pai assassinado há alguns anos e agora viu quatro pessoas de sua família, incluindo a única irmã, morrerem em...