Capítulo 6 - Damian

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Damian não seguiu Adra até a mãe dela ou a garota. Ele tinha sensibilidade o suficiente para saber que não seria nem um pouco bem vindo entre elas. 

Por isso, ele se afastou delas, procurando abrigo em meio aos demônios fardados da guarda, misturando-se a eles, apesar de não gostar de nenhum. Damian reconhecera alguns ao chegar à Ponte Téfra e sabia que todos tinham algo contra ele — fosse uma acusação de agressão ou apenas uma antiga rixa por algo que Damian falara. Particularmente, ele mesmo também não era um grande admirador da guarda, então não podia se importar menos com aquela animosidade.

A Ponte Téfra, uma das cinco pontes que davam passagem de um ponto a outro do rio Thanatos, era uma construção enorme de pedra cinza clara que reluzia no sol do final da tarde. A ponte tinha vários metros de largura e era ampla o suficiente para abrigar todo um séquito, o que acontecia com certa frequência.

A tradição de lançar as cinzas dos mortos no Thanatos remontava à época das Revoluções Humanas, aquelas que terminavam em massacres inteiros e lavavam as ruas de corpos e sangue. Naqueles anos, os cemitérios não aguentavam mais os corpos dos humanos, que apareciam aos borbotões, então os humanos começaram a cremar seus mortos e despejar no rio. 

Passaram-se alguns séculos antes que os demônios aderissem àquela tradição também, mas depois que isso aconteceu, a ponte foi construída, sempre para o conforto dos demônios, apesar de ser considerada um espaço público para aqueles que lamentavam seus mortos.

O lugar em si, apesar de seu propósito, era lindo. O rio Thanatos corria na direção do pôr do sol e nascia com o amanhecer, exatamente assim. Um caminho exato do início até o fim, fosse da vida ou do dia. 

— Damian — uma voz masculina chamou sua atenção e Damian se virou para encontrar Paris Kolasi, o segundo na Guarda Real e melhor amigo de Carino Anoixi.

E um dos vários guardas que Damian conhecia, claro.

— Olá, tio — Damian sorriu para ele, apertando a mão dele para cumprimentá-lo.

— Veio visitar seu guarda pessoal uma última vez? — perguntou Paris, forçando um sorriso que não chegou aos olhos negros que a genética os forçara a compartilhar.

— Meu guarda pessoal está bem longe de Agraés, tio — foi a resposta de Damian — Carino Anoixi era mais meu advogado do que qualquer outra coisa.

O rosto de Paris escureceu à menção indesejada da sombra que pairava sobre eles. O avô de Damian — Charis Kolasi — realmente não era o tipo de pessoa que merecia ser mencionado em uma conversa casual, mas Damian gostava de ser tão honesto quanto podia.

— Bem, já que admirava Carino tanto assim... — Paris deu de ombros, as mãos em punhos enfiadas dentro dos bolsos da calça social preta, embora ambos soubessem que era impossível ocultar os próprios sentimentos de Damian — imagino que possa ficar.

— Iria me expulsar caso decidisse que eu não podia? — perguntou Damian casualmente. Ele não tinha nenhum interesse em uma briga e sabia que o tio também não, mas sabia que não deveria parecer fraco em nenhuma circunstância, especialmente não em público.

— Eu não vou começar uma briga por nada nesse mundo agora. — Suspirou Paris ao projetar o queixo na direção de Adra e sua família. — Elas não precisam de nada disso e se os ânimos se levantarem mesmo que por pouco tempo poderemos ter um problema bem maior em mãos.

Damian franziu a testa, olhando em volta com maior atenção dessa vez. A Guarda Real podia ser identificada pelos uniformes — pretos com botões dourados — e suas expressões soturnas e revoltadas, como se algo os indignasse. Não era preciso ser um gênio para saber exatamente o quê os deixara desse modo.

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