46. Assim é fácil

36 6 0
                                    

Era sempre a mesma sensação, nunca mudava. Eu podia estar exatamente aqui, no lugar certo, e ela podia estar bem segura em meus braços, mas sempre me escapava. E era sempre a maldita sensação de impotência.

O filme foi pausado, provavelmente por Sarah, e o silêncio dominou o cômodo, que estava ficando cada vez menor. Ninguém disse nem uma única palavra quando Alice se colocou entre nós, poucos passos à minha frente. Robert a olhou por alguns segundos com o cenho franzido e, com um leve meneio de cabeça dela, enfim se virou para mim. Olhando-me de cima, com o queixo minimamente projetado para frente e um olhar de quem sempre se sente superior, eu diria. Então ele me estendeu a mão quando Ali deu um pequeno passo para o lado, abrindo espaço.

- Tudo bem, Judd?

Por mais incômodo que fosse – e por mais que eu quisesse simplesmente afastar sua mão com um forte tapa –, ignorei seu comportamento desagradável e apertei mão dele com firmeza e de forma breve, sem pestanejar.

- Tudo bem, e com você?

- Muito bem – assentiu lentamente e pigarreou. – Então... Deu tudo certo com o exame, não é? Agora você não precisa duvidar de mais nada.

- Não, eu...

- Robert, ele... – Ali me interrompeu sem querer, o que a fez hesitar um pouco e me olhar rapidamente, mas continuou com calma: – Ele não duvidava. Sabíamos que teríamos que fazer isso.

- Ah, certo... Desculpe – pediu entre um riso contido, sem humor, e arqueou as sobrancelhas. – É que fazer as meninas passarem por tal procedimento foi...

- Robert – Ali chamou em tom brando ao tocar o pulso dele.

- Bom, não tive intenção de insinuar algo errado. Por favor, esqueça o que eu disse. Missy está feliz, é o que importa – encerrou, atendendo ao pedido silencioso da noiva.

- Claro – concordei simplesmente, começando a me sentir completamente tenso.

- Bom... – apressada para encerrar aquilo, Ali se manifestou entre um suspiro ansioso. – Nós vamos deixar vocês terminarem de assistir ao filme.

- Qualquer coisa, estaremos na sala – Robert disse por fim e buscou pela mão da noiva.

Depois de um sorriso meio sem jeito direcionado para ninguém em especial, já que ela mal conseguia me encarar, Ali lançou um beijo no ar para a filha e então se deixou ser levada até que os dois deixassem o cômodo, apenas encostando a porta. Encarei Sarah sentindo meu maxilar travado em consequência do esforço máximo que exerci ao tentar me manter imóvel, impassível, e ela apenas deu de ombros sem saber o que dizer.

Filho da puta prepotente. Não importa se é a casa dele, ele me irrita e sabe disso.

- Tia, me dá meu copo? – ouvi Missy pedir e respirei profundamente.

Novamente, eu não podia me exaltar. Era a segunda vez naquele dia em que perdia a paciência, mas devia me manter calmo... Mesmo que quisesse muito esmurrar o rosto de alguém neste momento, devia me manter calmo!

Repeti essas últimas palavras para mim mesmo mais algumas vezes, lembrando que, ainda que fosse uma criança muito perspicaz, Missy não tinha como saber o que de fato havia acabado de acontecer em seu próprio quarto, estava completamente alheia e talvez só quisesse voltar a assistir ao seu filme. Por isso, e apenas com isso em mente, eu enfim consegui mover meus pés.

Sarah me entregou dois copos de refrigerante, um meu e outro de Missy, e eu me sentei na cama, ao lado da menina, com as costas apoiadas contra a cabeceira e as pernas esticadas sobre esta. Assim voltamos a assistir ao filme em silêncio. Missy devolveu o copo neste meio tempo, o qual eu coloquei junto ao meu no chão, e ela foi aos poucos se aninhando em meu peito.

Make It ChangeOnde histórias criam vida. Descubra agora