Capítulo 11

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Alis

   Cindy acende o terceiro trago. Ela tem a péssima mania de fumar em meu quarto, o que deixa os lençóis, paredes, pichos de pelúcia intoxicados pela erva.
   Mas, o que está me irritando não é isso, já que estou acostumada com ela, mas sim o fato dela não ligar para o que estamos fazendo.
— Você sabia que essa redação vai para as faculdades, não é?
— Sim, e?
— E que você nem tocou na sua. Só temos seis meses até o fim do semestre e você não parece nem um pouco preocupada. — Ela estala a língua no céu da boca e então leva o trago a boca.
    Um dia, Cindy verá o que essas drogas vão fazer com o corpo dela. Com a vida. Eu já tentei fazer com que ela deixasse de fumar, mas foi totalmente em vão. Nem mesmo a história da minha mãe a faz mudar de hábitos.
    Ela solta a fumaça da boca, formando a névoa esbranquiçada.
— Meu pai é amigo do reitor da Yale, não precisamos fazer essa seleção.
— Você não precisa fazer essa seleção, então.
— Não, Alis. Nós. Acha mesmo que eu vou sobreviver a faculdade sem minha melhor amiga? Dizem que é pior que a escola. Você pode fazer essa redação, só para não ficar com peso na consciência. Eu sei que você fica.
— E você não?
— Tudo é corruptível, Alis. Eu posso odiar, mas nem mesmo um milagre me colocaria em uma faculdade. Nem todos tem suas notas perfeitas. — Ela diz em tom zombeteiro. Cindy sempre tentou me colocar no "mau caminho", o que ela nunca conseguiu inclusive.
— Vamos mudar de assunto. — Respiro fundo, encarando o rascunho em minha frente. "O que você quer para seu futuro?"
   O que eu quero?
   Bem, minha cabeça está cheia de Logan no momento. Minhas vontades são reduzidas a seduzi-lo essa noite e dormir de conchinha com ele novamente.
   Ah, me sinto intoxicada por um doce sentimento.
— Eu não queria dormir nos dormitórios da faculdade. — Cindy junta as sobrancelhas.
— Eu já imaginava. Você é muito previsível, Alis.
— Eu? Previsível?
— Sim, em certos pontos. Eu sei que quer um apartamento para Lily poder ir te visitar. — Ela apaga o maço no potinho de vidro sob a cama. — A questão é, eu vou ou não ser sua colega de apartamento?
   Jogo um travesseiro nela. Cindy, devido a sua mãe ser totalmente distante, ela não sabe demostrar suas emoções e vontades. Então quando ela diz "Eu vou ou não ser sua colega de apartamento?" , ela esta pedindo para morar comigo. Digamos que família é a gente que escolhe e eu sou a irmã mais velha de Cindy.
— É claro, sua boba.
— Eu não estava preocupada. — Ela se levanta da cama. — Você não vive sem mim.

                                ~•~

— Lily, pode me passar as batatas? — Pergunto a Lily, que não me ouve.
    Desde que chegou do futebol, Lily está aérea, pedida. Se eu não fosse sua irmã, se eu não a conhecesse como a palma da minha mão, eu diria que algo aconteceu. Algo que a deixa atordoada.
— Lily, querida? — Ela levanta a cabeça do prato e me encara. Surpresa está em seus olhos. — As batatas.
   Ela pega o bowl e me entrega.
— Está tudo bem, Lily?
— Sim, eu só... Estou bem.
— Lily. — Minha voz é inquisitiva. Ela está escondendo algo. — Se você me disser, eu posso tentar te ajudar. Não confia em mim?
   Lily olha para mim como um cachorro abandonado. As lágrimas se aglomeram em sua linha d'água e suas bochechas ficam vermelhas.
— Eu confio, eu só tenho vergonha.
— Vergonha? Eu não vou rir, eu não vou fazer piada. Eu estou muito preocupada, querida. O que aconteceu? — Me viro na cadeira para ficar de frente para ela.
— É que... é que eu fiquei mocinha. Pronto, falei.
    A vontade de chorar é grande,mas me controlo. Lily, a minha irmãzinha, ficou mocinha. Isso me deixa tão emotiva que eu abraçaria ela agora e nunca mais soltaria. Mas, não posso, esse momento não é meu e sim dela.
— Você tem absorventes? Quer que eu peça para comprar?
— Alis!
— Eu sei que constrange, mas você precisa. — Ela afunda o rosto nas mãos. — Eu vou pedir, é só fingir que é para mim.
— Pede remédio, também? Já que não tem outra opção.
— Está com cólicas?
   Ela balança a cabeça em afirmação.

     Eu pedi na farmácia um pacote de absorventes com abas, o que eu costumava usar quando não usava ob e coletor. E remédio para ela.
     Lily contou que não sabia o que a dor significava até ela ir ao banheiro durante a aula de futebol. Minha mente deu voltas e reviravoltas imaginando que se ela tivesse se sujado teria sido um motivo de chacota para os meninos, e isso lhe traria memórias ruins da situação.
— Aqui. — Estendo o pacote para ela. — Você só precisa grudar a parte adesiva na calcinha. Toma cuidado aonde coloca, porque pode acabar vazando.
— Tá bom.

    Ela foi no banheiro e eu fui para a sala. Meu coração está apertado dentro do peito, não que seja uma coisa ruim, mas minha menina cresceu e isso é lindo. Eu amo tanto Lily que só de imaginar que agora ela é uma moça, adolescente, feita me dá vontade de chorar.
    A porta da entrada é aberta e Logan entra em casa. O terno azul marinho lhe cai bem como uma luva. E o cabelo dele, que precisa aparar, está batendo nas sobrancelhas. Pelo jeito, ele não teve um bom dia.
— Boa noite. — Ela saúda, deixando sua maleta no sofá. — Aconteceu alguma coisa? Você está com uma cara...
—Estou bem, depois eu te conto.
   Ele franze a sobrancelha em dúvida.
— Pai! — Lily fala, o incomodo palpável com o absorvente. Nossa, eu também demorei a me acostumar. Eu andava toda dura com medo de me sujar. — O senhor ja chegou?
— Eu sempre chego nesse horário, Lily. Está tudo bem filha?
— Está sim — Respondo por ela —, ela só fez muitos exercícios no futebol hoje.
— Haa, entendo.
   Mas o olhar de Logan dizia "Você vai me contar tudo mais tarde." Ele pega sua maleta e segue para a escadas.
— Deu certo?
— Não sei — Ela se senta ao meu lado. —, por que isso tinha que acontecer? Eu estava muito bem sem isso.
— Por que você cresceu e agora não é mais uma menina. Vou te levar pra comprar sutiãs e...
— Aí Alis! Para com isso! Que vergonha!
— Vergonha? Não tem nada de vergonha nisso, todo mundo, quer dizer, todas as mulheres passam por isso, é natural Alis.
— Natural... naturalmente terrível.
— Nisso eu tenho que concordar.
   Ela balança a cabeça em afirmação.
— Você vai contar pro meu pai? Ou vai ser a Germa?
— Eu pretendo contar, Germa não gosta de interferir em assuntos de família.
— Eu sei que tem que contar, por lque a minha condição é bem ruim — Eu seguro a risada. Ela usa a palavra condição como se realmente fosse a pior coisa que já lhe aconteceu. —, mas podia ser quando eu não estiver por perto?
— Eu não imagino de outra forma.
   Ela suspira.
— Obrigada, Alis. Eu não sei o que seria de mim sem você.
    Abraço a minha irmãzinha de cabelos de fogo. Minha irmãzinha, eterna e para sempre. Não importa o quanto cresça, Lily sempre vai ser a nossa menininha.

Nota da autora:
Oi, tudo bem? Eu disse dói capítulos por semana e para completar postei mais um!

O que estão achando? E o que acham que vai acontecer?

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